O Presidente da República deu esta manhã de quarta-feira início a nova ronda de audiências com os partidos com representação parlamentar. Em cima da mesa esteve a renovação do Estado de Emergência de 24 de dezembro até 7 de janeiro, mas também o seu prolongamento para lá desta data.
O primeiro partido a ser ouvido foi o Iniciativa Liberal (IL), a que se seguiu o Chega, o Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV), o Pessoas-Animais-Natureza (PAN), CDS e PCP. Já durante tarde, foi a vez de Bloco de Esquerda, PSD e PS.
Terminadas estas audiências, o chefe de Estado vai consultar o Governo sobre o "muito provável" decreto de renovação do Estado de Emergência a 24 de dezembro e até 7 de janeiro.
Quanto às reuniões no Infarmed, soube-se na sequência destes encontros, e pela voz do deputado do IL, que regressarão dia 5 de janeiro.
IL não confia no Governo e manifestou-se contra mais exceções
O deputado do Iniciativa Liberal (IL), João Cotrim Figueiredo alertou que "a próxima renovação vai calhar em cima" da campanha para as presidenciais, de 24 de janeiro, e nesse sentido defendeu que não deve ter "mais exceções" do que as previstas para o Natal e Ano Novo.
Contra as "tentações" de existirem "exceções" nesse período, Cotrim Figueiredo disse ter falado com o Presidente sobre a possibilidade de o decreto de janeiro prever especificamente o que se passará no período da campanha presidencial. "Não faria sentido ter mais exceções para uma campanha política do que para o Natal", afirmou, dizendo também que "não tem a mesma carga emocional e afetiva que tem a quadra festiva".
O deputado sustentou ainda que as medidas que têm sido tomadas "não são suficientemente justificadas" e, por outro lado, "os poderes conferidos pelos decreto são demasiado vastos". "E nós não temos confiança suficiente neste Governo para dispor de tantos poderes", declarou Cotrim Figueiredo, referindo que "episódios recentes infelizes" provam que a IL "tem razão". "Seja no caso do SEF, seja no caso da trapalhada que se tem arranjado à volta da TAP".
Chega pede "estabilidade e previsibilidade" nas medidas
À saída do encontro no Palácio de Belém, o presidente do Chega defendeu que é importante que os portugueses "saibam com o que podem contar" e "que se mantenha o mesmo nível de restrições que já estavam definidas". "Honestamente, o facto de o Governo ter alterado versões e restrições de forma tão rápida ao longo de várias semanas não nos dá a nós, Chega, confiança de que podemos ter um cenário de estabilidade e previsibilidade", criticou.
"Por isso, apelámos ao Presidente que sensibilize o Governo para que haja aqui previsibilidade e estabilidade, mas os sinais que nos vêm do Governo são contraditórios face àquilo que pode ser feito nos próximos dias", assinalou André Ventura.
O deputado único do Chega referiu ainda que irá manter o voto contra a renovação do Estado de Emergência, justificando que recusa passar "cheques em branco" e que "há questões de fundo" com as quais o partido discorda.
'Verdes' contra limitações a campanha presidencial, apesar de Emergência
Recuperando o tema do IL, também o Partido Ecologista 'Os Verdes' (PEV) recusou quaisquer limitações na atividade política durante um eventual Estado de Emergência em janeiro, que coincida com a campanha eleitoral para as presidenciais de 24 de janeiro.
"Não creio que haja qualquer intenção do Presidente da República ou do Governo em limitar direitos políticos", afirmou, ainda assim, o deputado e dirigente do PEV José Luís Ferreira, lembrando que a lei portuguesa não permite que "haja limitações da ativa partidária e politica" e que, nos últimos meses, apesar de o país estar em Estado de Emergência por várias vezes, a atividade política continuou, tanto no parlamento como nos partidos políticos. Dependerá, afirmou, das candidaturas saberem se têm ou não condições para fazer ações de campanha, "cumprindo as regras sanitárias que estão estipuladas".
Quanto ao voto, o PEV voltará a votar contra a renovação do Estado de Emergência, argumentando que o Governo não precisa deste instrumento para tomar medidas como o reforço do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Além disso, acrescentou, há "algumas medidas tomadas que só contribuirão para prejudicar a vida as pessoas e das empresas", como a mini, pequenas médias empresas, como restaurantes e o comércio local.
PAN pede bom senso para campanha presidencial
À saída de Belém, o porta-voz e deputado do PAN, André Silva, afirmou que o partido só definirá o seu sentido de voto depois de ver o decreto mas adiantou desde já concordar com o Governo quanto a "abrir as restrições" na quadra das festas, deixando um apelo à responsabilidade das pessoas para que "circunscrevam os contactos ao seu núcleo familiar mais restrito", mantendo uma atitude de "responsabilização pessoal".
Já sobre a uma eventual declaração do Estado de Emergência durante a campanha eleitoral para as presidenciais de 24 de janeiro de 2021, André Silva defendeu que deve existir um diálogo com a Direção-Geral da Saúde (DGS) mas sem impor regras. "A DGS não pode impor restrições aos direitos políticos. E apela-se a que os candidatos, dentro do quadro de direitos políticos, consigam desenvolver a sua atividade política sem restrições (...) mas tendo em conta as orientações gerais e de bom senso de saúde pública", acrescentou.
Além disso, referiu, os candidatos presidenciais poderão fazer ações de rua, desde que cumpram "as orientações" da DGS, "desde que se mantenha o distanciamento social".
Tal como os restantes partidos com representação parlamentar, o PAN também manifestou preocupações com o plano de vacinação de Covid-19 e alertou ser necessário prever postos de vacinação alternativos aos centros de saúde, de forma a responder a uma "sobrecarga" no sistema.
CDS admite campanha com restrições e sem arruadas
Uma arruada "não deve ser feita se não houver condições de saúde" para isso, afirmou o vice-presidente centrista Sílvio Cervan, que representou o CDS na audição com o Presidente da República. Sem querer fazer "futurologia" sobre a hipótese de a campanha eleitoral para as presidenciais se fazer em Estado de Emergência, Cervan disse, por duas vezes, que "a saúde dos portugueses é o primeiro dos valores".
Uma campanha inclui, por exemplo, as tradicionais arruadas, o contacto de candidatos nas ruas com a população, e nisso o dirigente centrista foi menos vago e disse claramente que não se devem fazer "se não houver condições de saúde pública para a fazer".
"A saúde está à frente de qualquer interesse mesquinho, partidário" (Sílvio Cervan)Depois, questionado sobre as condições em que o CDS aceitaria restrições, Sílvio Cervan não respondeu diretamente e sublinhou ser necessário esperar para saber quais são as condições epidemiológicas no país no início do ano, apesar de também dizer que "concorda com qualquer que seja a decisão", tendo em conta "os dados em cima da mesa" na altura.
PCP desdramatiza e aconselha campanha com segurança
"Há que exigir o máximo de proteção sanitária, criando as condições para que os portugueses, além do medo de morrer, não tenham também o medo de viver". A afirmação foi proferida pelo secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, no final da audição com o Presidente da República, e a que fechou a ronda da manhã.
À saída do Palácio de Belém, Jerónimo afirmou que eventuais restrições na campanha são "uma questão que não se coloca" e não foi colocada nem por Marcelo nem por ele próprio. Além disso, acrescentou, mais importante do que fazer essa discussão é saber "como se sai desta situação" de epidemia e crise social e económica, disse e formulou um desejo: "Que o ano de 2021 seja melhor para todos nós."
E tal como os restantes partidos, em relação à campanha eleitoral, o líder dos comunistas afirmou ser necessário cumprir os "princípios básicos para a proteção" durante as festas de Natal e Ano Novo e, embora compreendendo "a exigência do momento" com a epidemia, isso não deve impedir os festejos, lidando "com as cautelas, prevenção e proteção necessárias".
"Deixemos os portugueses desfrutar este momento", pediu Jerónimo, admitindo novo voto contra o prolongamento da EmergênciaUma das preocupações que manifestou foi quanto à necessidade do "reforço do SNS", em meios, e fez um apelo aos portugueses para que se vacinem, logo que for possível, face às garantias de eficácia dadas "pela ciência".
Após este encontro, as audições no Palácio de Belém foram interrompidas por algumas horas devido a compromissos de agenda do chefe de Estado. Pelas 17h30 serão retomadas Bloco de Esquerda, Partido Social Democrata (PSD) e Partido Socialista (PS).
BE alerta para um janeiro "particularmente difícil" e pede uso da requisição civil
A coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins disse ter transmitido a Marcelo Rebelo de Sousa que considera que janeiro vai ser "um mês particularmente difícil" e em que o Serviço Nacional de Saúde vai "sofrer uma pressão extraordinária".
"Por isso, nós viemos hoje dizer ao Presidente da República que, aquilo que sempre defendemos, é agora particularmente urgente: precisamos de toda a capacidade instalada da saúde em Portugal sob o comando do SNS", defendeu Catarina Martins, salientando que a possibilidade de requisição civil de meios de saúde aos privados tem estado prevista "em anteriores decretos presidenciais", apesar de o Governo nunca a ter, até agora, utilizado.
"É muito importante que o decreto continue a prever essa possibilidade e o Governo deve depois utilizá-la. Se isso foi sempre importante, e julgo que foi um erro o Governo não o ter feito na preparação da segunda fase, será mais importante a partir de agora, se a uma eventual terceira vaga de covid-19 se juntar um plano de vacinação que é exigente e todos os cuidados de saúde não covid", apelou.
Catarina Martins não quis adiantar como votará o BE esta quinta-feira a provável renovação do Estado de Emergência, dizendo querer ver primeiro o texto do decreto presidencial.
PSD pede mais locais de vacinação e "coragem" se for preciso apertar medidas
Após o encontro com o chefe de Estado, o líder do PSD, Rui Rio, mostrou-se favorável à renovação deste Estado de exceção e defendeu que a vacinação deve acontecer também nos privados. "Quanto à vacinação, parece-me que era prudente que fosse feita em mais lugares para lá, exclusivamente, do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Nós temos de nos lembrar que, por exemplo, em janeiro, só podem vacinar 50% da própria capacidade instalada, porque depois, em fevereiro, têm de se vacinar outra vez, na segunda dose, aqueles que se vacinaram antes, em janeiro", explicou o líder social-democrata.
Rui Rio reconheceu ainda que "é difícil dizer às pessoas que não há Natal", mas salientou que se houver um agravamento de casos do novo coronavírus após a quadra natalícia, o Executivo deve ter a "coragem" de impor regras mais rigorosas para o Ano Novo.
"Está anunciado pelo Governo um aligeiramento das medidas nesta época. Cabe a todos nós portugueses ter o comportamento mais adequado e mais prudente às circunstâncias, mas espero que, se se verificar um agravamento da situação pela força do Natal, haja pela parte do Governo a coragem para depois, na Passagem de Ano, haver medidas mais rigorosas", frisou, acrescentando que "se faltar essa coragem" será "o primeiro a dá-la, no sentido da defesa do interesse nacional".
PS quer estabilidade das medidas, mas admite ponderação sobre Ano Novo
À saída da audiência com o Presidente da República, José Luís Carneiro foi questionado sobre as palavras do líder do PSD, que pouco antes tinha apelado à "coragem" política do Governo. "Todos os dias deve ser feita uma avaliação e as decisões devem ser em função dessa avaliação. Entendemos que é uma ideia que deve ser ponderada, que deve ser avaliada", respondeu o dirigente do PS.
Ainda assim, o secretário-geral adjunto socialista salientou que seria importante haver capacidade para "manter a estabilidade das medidas adotadas", apelando, para que tal seja possível, à responsabilidade dos comportamentos individuais e coletivos.
"Queríamos transmitir em nome do PS o nosso apoio à renovação do Estado de Emergência: é necessário continuarmos com uma conduta individual e cívica com grande sentido de responsabilidade"
Questionado sobre a defesa feita pelo BE de uma requisição civil, por parte do Governo, de meios privados na saúde, José Luís Carneiro rejeitou essa via, apontando como alternativa o diálogo entre os vários setores. "São termos que o PS nunca utilizou, devem convergir esforços para que os recursos disponíveis sejam colocados ao serviço dos portugueses. Pelo que temos visto, todas as instituições públicas, privadas e sociais têm estado irmanadas ao serviço do país", disse, apelando a que se mantenha o sentido de "equilíbrio" e "ponderação".
Sobre a possibilidade de o Estado de Emergência vir a afetar a campanha para as eleições presidenciais de janeiro, o dirigente socialista salientou que "mesmo nos momentos mais críticos da pandemia, a democracia manteve-se viva".
"As eleições presidenciais são um momento muito relevante da nossa vida democrática, é muito relevante que os cidadãos possam informar-se e esclarecer-se", defendeu, admitindo que a CNE e as autoridades de saúde possam emitir "recomendações universais de cariz abstrato" para essa campanha.
Se o IL abriu a ronda a Belém pelas 11h, o PS fechou-a já noite dentro, cerca das 21h.
No passado dia 4 deste mês, quando decretou o sexto e atual Estado de Emergência - que vigora até 23 de dezembro - o chefe de Estado explicou, numa declaração ao país, que a renovação se deveu ao facto de permitir ao Governo aplicar medidas de contenção mais restritivas, e aproveitou para deixar uma mensagem em tom de advertência sobre o Natal, dizendo esperar que a "exceção" às restrições nesta quadra "seja bem entendida e bem vivida" e que não provoque "um descontrolo mais tarde, com custo elevadíssimo".
O chefe de Estado pediu ainda aos portugueses que mantenham "total rigor, total exigência" e procurem conciliar "um tempo de família com uma sensata maturidade cívica" para que evitar "novos confinamentos totais, ainda que localizados". Apelos que, desde então têm sido reforçados por vários governantes, nomeadamente o próprio primeiro-ministro e a ministra da Saúde.
[Notícia atualizada às 21h22]