Ana Gomes e Ventura entre "o boneco de poderes ocultos", MRPP e Pedroso

Os candidatos presidenciais Ana Gomes e André Ventura estiveram, esta sexta-feira, frente a frente na TVI.

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Melissa Lopes
08/01/2021 21:17 ‧ 08/01/2021 por Melissa Lopes

Política

presidenciais 2021

A ex-eurodeputada do PS e o líder do Chega André Ventura esgrimiram, esta sexta-feira, argumentos e trocas de acusações e suspeições num frente a frente tenso na antena da TVI, no qual também o passado marcou presença.

Ana Gomes - que nunca verbalizou o nome de André Ventura ao longo dos 30 minutos de debate, acusou o líder do Chega de ser "boneco" instrumento de poderes ocultos, enquanto o líder do Chega relacionou a diplomata com os ex-militantes socialistas José Sócrates e Paulo Pedroso. Acusando o toque, a diplomata disse: "Este senhor tem truques para tentar arrastar para a lama quem vem aqui debater com ele para tentar ficar parecido com ele. Não é o meu caso".

Ventura puxou para debate, por diversas vezes, a passagem de Ana Gomes pelo MRPP, partido "responsável por destruir negócios e perseguir famílias".

Na resposta, a socialista - que fez referência a uma cicatriz na cara de uma vergastada da PIDE - frisou ter "honra" em ter combatido a ditadura. "Este senhor recentemente disse que era pela ditadura das pessoas de bem. Pessoas de bem não são por ditadura nenhuma", atirou. E Ventura reafirmou a sua posição.

Ao longo do duelo, Ana Gomes procurou ainda associar André Ventura a projetos que têm como objetivo destruir a democracia e instaurar a ditadura, afirmando em contraponto que, se for eleita Presidente da República, será uma firme defensora da atual Constituição da República e um garante da unidade e da independência nacional.

Confira abaixo o desenrolar do debate:

Como diplomata, preparou-se e está preparada para "falar com o Diabo"?

Ana Gomes: "Sim, como diplomata, uma pessoa tem de estar preparada para falar com tudo. E eu, ao longo da minha vida, em Timor, na Indonésia, na Etiópia, em Bruxelas, tive de falar com muitos diabos e soube sempre o que era preciso para lidar com eles. Os diálogos com que quero lidar no nosso país são aqueles que querem impor ditaduras, quando eu sou pertenço a uma geração que trabalhou, que sofreu, para termos democracia e liberdade. Candidato-me à Presidência da República porque quero defender a Constituição da República. Quero defendê-la, cumpri-la, fazê-la cumprir, ser garante da unidade e da independência nacional".

Porque é que é tão importante ficar à frente de Ana Gomes?

André Ventura: "Acho que a Ana Gomes representa a Esquerda toda. Basta ver que os outros candidatos andam a fazer fretes à candidata que está à minha frente, porque sabem que vai ficar à frente deles. O nosso desafio é derrubar a Esquerda que tem destruído o Estado nos últimos 46 anos, que tem levado a corrupção atrás de corrupção, que o Estado perca o prestígio, o tal prestígio que Ana Gomes diz ter defendido enquanto diplomata. Ficar à frente de Ana Gomes não é uma questão pessoal. É uma questão política, para mim, para o Chega, para a Direita, é importante derrubar esta candidatura. É a minha principal adversária. Ana Gomes representa tudo aquilo em que eu não acredito. Representa tudo o que eu acho que o país não deve ter".

Teria avançado se o Ventura não se tivesse candidatado?

Ana Gomes: "O meu adversário principal é o professor Marcelo Rebelo de Sousa. Candidato-me para ser eleita Presidente da República, porque posso fazer a diferença por este país, posso fazer a diferença para garantir que as instituições democráticas efetivamente funcionam".

"Os portugueses viram o que se passou há dias no Capitólio (EUA), mortes, violência, ódio, incitamento à divisão entre os cidadãos. É exatamente isso que eu não quero que se passe no nosso país. E é exatamente isso que certas forças, representadas designadamente pelo senhor deputado que aqui está, representam. Não quero isso. Combato isso. Combaterei sempre. Penso que posso fazê-lo na Presidência da República, substituindo o atual Presidente. Não deixarei por mãos alheias a utilização dos poderes que são confiados pela Constituição para que faça a diferença, garantindo que as instituições democráticas funcionam, que há transparência, que há combate à corrupção, que há meios para a justiça, para as forças de segurança e para as forças armadas funcionarem, mas com exigência no cumprimento das missões".

Quando viu a invasão do Capitólio, o que lhe veio à cabeça?

André Ventura: "Veio-me à cabeça o que me viria à cabeça em qualquer país democrático em que as instituições são ameaçadas. Seja pelos assaltantes de bancos e destruidores de fábricas, seja pelos apoiantes de Trump. É errado".

Não apoia minimamente?

André Ventura: "Nenhum candidato democrático pode apoiar ações contra as instituições. Acho graça a Ana Gomes dizer que luta pela democracia, mas diz que ilegalizaria o Chega. Acho fica mal dizer isso, porque a Ana Gomes militou no MRPP. E o MRPP tinha um cartaz a dizer "morte aos traidores" [mostra a imagem], partido que Ana Gomes disse que era uma escola de democracia".

Ana Gomes: "É extraordinário ver pessoas que defendem tudo e o seu contrário, que agora diz o que diz a respeito do seu ídolo Donald Trump. Eu, de facto, tenho uma marca na cara que foi de uma vergastada de um PIDE, no tempo em que eu e muita gente arriscou tudo, inclusivamente a vida, a lutar contra a ditadura. E não tenho nenhum problema em ter sido do MRPP, saí de lá aos 21 anos, em janeiro de 1976. Fui só um soldado raso do MRPP, um membro do ComitéCentral do MRPP era líder do PSD quando este senhor lá entrou. Chama-se Durão Barroso. Mas tenho uma honra em ter combatido contra a ditadura. Este senhor recentemente disse que era pela ditadura das pessoas de bem. Pessoas de bem não são por ditadura nenhuma".

André Ventura: "Dizer que foi soldado raso de um partido que foi responsável por destruir negócios, ir atrás de pessoas, destruir fábricas e dizer que está tudo bem porque levou uma vergastada há 50 anos... Não se consegue demarcar do passado dela. Dr. Ana Gomes, não há como fugir do seu passado, aceite o seu passado".

André Ventura: "A minha adversária disse que eu queria a ditadura das pessoas de bem e é verdade. Eu não tenho medo das palavras. É a diferença de todos os candidatos que me antecederam".

O que é que é a ditadura das pessoas de bem?

André Ventura: "É a diferença do que tivemos até agora: metade do país a trabalhar para quem não quer fazer nada. É o contrário disso. É o respeitar as pessoas que estão há anos a pagar impostos. Temos que dizer as coisas como elas são. Há uma parte do país que sente que tem que cumprir e outra parte que sente que não tem de cumprir. Não vou ser o Presidente de todos os portugueses. Não vou ser o Presidente de José Sócrates, dos pedófilos, dos traficantes de droga".

Constituição. Como é que vai mudar o que jurou defender?

André Ventura: "Não gosto desta Constituição. A Constituição tem mecanismos para ser alterada. (...) Terei que a jurar. E se for eleito Presidente, fá-lo-ei, porque tenho esperança de, democraticamente, mudar o regime. Ao contrário do partido em que militou Ana Gomes, acredito na mudança pela ação do voto. Por isso é que não defendo nenhuma ação armada nem nenhum golpe de Estado. Defendo votos, democracia. Não me digam é que não se pode reduzir o número de deputados porque a Constituição não o permite. [Sobre uma sondagem em que uma larga percentagem de pessoas defende a prisão perpétua] São fascistas as pessoas que defendem a prisão perpétua?"

Ana Gomes: "Sou pela defesa da Constituição e da democracia. É uma questão de civilização. É uma questão de não voltarmos à idade média. Se calhar, daqui a pouco, estão a propor que se cortem as mãos aos ladrões. Mas há coisas muito piores que este partido [Chega] defende. Por exemplo, a abolição da escola pública, a abolição do SNS, que sejam privatizados os hospitais, as universidades, as escolas, as vias de comunicação, todas as empresas públicas. Diminuição de impostos para os mais ricos, uma taxa única para ricos e pobres".

"Este senhor que vem aqui dizer que está contra a corrupção, de facto, foi funcionário da Autoridade Tributária, e depois foi trabalhar para empresas, utilizando os conhecimentos da AT, para ajudar ricos a porem dinheiro em offshores. É exatamente contra isso que eu me candidato. Sendo PR, trabalharei para que o Estado tenha recursos que precisa para apoiar os mais desfavorecidos. Querem eliminar os apoios aos mais desfavorecidos, querem eliminar o próprio direito do trabalho. Seria uma reversão civilizacional".

André Ventura: "Esperava isto da Marisa Matias, do João Ferreira, mas não esperava da Ana Gomes. Vou responder. A maioria dos países da Europa tem prisão perpétua. Espanha tem. Não podemos continuar a ter essa bandidagem toda cá fora sem pagar pelo que devem. Mais de metade dos portugueses quer prisão perpétua, só estes candidatos do século passado é que não querem".

"Dra. Ana Gomes, tem um diretor de campanha que é Paulo Pedroso. Acho que é uma vergonha uma candidata apresentar-se a uma eleição com um nome [que representa] uma influência que ele e o PS moveram naqueles anos dramáticos em que se estava a investigar o caso [Casa Pia] para condicionar e impedir que a justiça fosse feita".

Paulo Pedroso foi indiciado, absolvido e até indemnizado pelo Estado

André Ventura: "Não tem a ver com pedofilia. Tenho a minha opinião, não a vou dizer. O Supremo Tribunal de Justiça foi muito claro: houve tentativa de condicionar Justiça pelo PS e Paulo Pedroso".

Ana Gomes: "Este senhor tem truques para tentar arrastar para a lama quem vem aqui debater com ele para tentar ficar parecido com ele. Não é o meu caso. Sou mãe. Sou avó de sete netos. E repudio totalmente qualquer tentativa de me associar a mim e qualquer das pessoas que trabalham comigo e em quem confio, como é o caso de Paulo Pedroso, com quaisquer práticas criminosas. Não vou citar aqui os romances de cordel com passagens pornográficas que este senhor escreveu, nem vou citar aqui o primeiro diploma que apresentou na AR, que previa a descriminalização de abusos sexuais a menores entre os 14 e os 18 anos".

"Trabalhei, e honro-me de ter trabalhado no MRPP, honro-me de ter saído do MRPP, trabalhei 45 anos pela democracia e pela liberdade. No nosso país e noutros países. (...) Confio inteiramente em quem trabalha comigo e não aceito os insultos vis".

Ana Gomes pretende ilegalizar o Chega. Como reagirá?

André Ventura: "Respondo mostrando esta imagem [imagem de Ana Gomes e José Sócrates]. Não fui eu que andei aos abraços com Sócrates. Ana Gomes agora vai pegar noutros exemplos, do Luís Filipe Vieira. Primeiro, a Ana Gomes não vai ser eleita PR. Segundo, se algum dia fosse, iria abrir um precedente muito grave: ligar a um PGR e que abrisse um processo para ilegalizar um partido que está em 3.º nas sondagens, um partido que representa os portugueses normais".

Ana Gomes: "Quem pode ilegalizar um partido é o Tribunal Constitucional. Como Presidente da República, não abdicarei de fazer um juízo político em particular daquelas forças que querem destruir a democracia. O partido deste senhor quer destruir a democracia, tem um projeto presidencialista que é um projeto autoritário de poder. Quer os fascistas, quer os nazis, quer os estalinistas, sempre disseram que defendiam a democracia. A democracia tem que se defender, tem que ser intolerante com os intolerantes. Estes senhores querem destruir a democracia, não podemos ignorar aquilo que dizem que são. Este partido foi legalizado com assinaturas falsas, incluindo pessoas já falecidas".

André Ventura: "O PAN, partido que apoia Ana Gomes, tem um dirigente, Albano Lemos Pires, que pôs esta fotografia dizendo 'matar os polícias'. Defende o fim do Ministério Público".

Ana Gomes: "Estive 15 anos no Parlamento Europeu a trabalhar em segurança e defesa. Os polícias e os militares portugueses sabem que defendo o devido equipamento, condições de remuneração, condições de formação, mas sou exigente quanto a não aceitar infiltração de racistas de uma maneira que retira a credibilidade das próprias forças de segurança".

Presidenciais em Emergência

Ana Gomes: "É muito importante que os portugueses se mobilizem para irem votar nestas eleições. Espero que haja condições e lamento que haja muita gente que está impedida disso por causa de confinamentos e os nossos emigrantes. Quero só relembrar que este senhor ainda hoje se reuniu com a senhora Le Pen [líder da Frente Nacional], uma destacada fascista que quer destruir a Europa. O que é que aconteceria aos nossos emigrantes se fosse recebidos por forças com o discurso racista e xenófobos deste senhor? Temos de travar estas forças que querem semear a desordem. Obviamente a democracia não pode ser suspensa. Espero que haja condições para irmos votar no dia 24".

Compreenderia se eleições fossem adiadas?

Ana Gomes: "Depende das condições e de elementos que eu não tenho e que o Governo eventualmente terá".

André Ventura: "Não compreendo como é que comparticipamos a 100% os medicamentos aos refugiados e requerentes de asilo e os portugueses não. Pessoas que estão há espera há três anos e vêm estes senhores de barco de Marrocos e passam à frente. Isto é que é fascismo invertido".

Ana Gomes: "Inventa problemas que não existem".

André Ventura: "É difícil fazer um adiamento das Presidenciais porque pode implicar uma revisão constitucional, que tem prazos estabelecidos. Da minha parte, totalmente disponível, se for essa a decisão do Parlamento. Quanto mais tempo de campanha tiver, melhor".

Ana Gomes: "Este senhor deputado nem sequer no seu partido manda tanto, teve que impor a lei da rolha aos militantes. É um instrumento de poderes ocultos que estão na sombra, poderes ligados ao imobiliário de luxo, poderes ligados ao BES e ao Banif, a partidos de extrema-direita como o MDLP, o PNR... Quem é que os financia? Este senhor é o boneco dessas forças ocultas".

André Ventura: "Antes um boneco das forças antissistema do que um boneco de José Sócrates, ou um boneco do Irão, do Paulo Pedroso."

SNS e privados em pandemia

André Ventura: "Fizemos mais propostas para reforçar o SNS, em dois anos, do que Ana Gomes alguma vez fez na vida dela. O que não podemos ter é um PR que promulgue a lei de bases da saúde sabendo que tem uma cegueira ideológica enorme".

Pergunta de Ana Gomes a André Ventura

Marcelo revelou que tem um registo em Belém de coelhinho e depois vem para aqui apresentar-se como um gatarrão. Que registo usou com a senhora Marine Le Pen?

André Ventura: "Ficou muito mal a Marcelo colocar-se no debate comigo como Presidente e não como candidato e vir revelar conversas privadas no Palácio de Belém. O meu tom é sempre o mesmo, e a minha assertividade é sempre a mesma. Marcelo ficou sem argumentos no debate, saiu chateado do debate.

Pergunta de André Ventura a Ana Gomes

Vai ou não manter Paulo Pedroso como diretor de campanha?

Ana Gomes: "Este senhor insiste em ser vil. Mais vil do que o que foi até agora. Mas não vou descer ao nível dele. Vou dizer que mantenho a confiança em todas as pessoas que trabalham comigo, incluindo Paulo Pedroso. Vou com confiança às eleições, apresentando-me com clareza, ao contrário deste senhor, que é só falsidades e contradições. É uma pessoa que não sabe o que quer. Diz tudo e o seu contrário. Este senhor não me ofende, nem ofende Paulo Pedroso".

Leia Também: "Vigarista" e "insanidade antidemocrática". O embate Marisa e Ventura

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