Setúbal. Incomodado com "caça às bruxas", Costa aguarda relatórios

O primeiro-ministro reforçou a sua posição face ao tema, realçando que "não precisamos de andar preocupados à procura de espiões atrás de cada árvore".

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Daniela Filipe
11/05/2022 19:06 ‧ 11/05/2022 por Daniela Filipe

Política

Ucrânia/Rússia

Novamente questionado quando ao acolhimento de refugiados ucranianos por associações alegadamente pró-Kremlin na Câmara Municipal de Setúbal, o primeiro-ministro, António Costa, mostrou-se incomodado com o clima de “caça às bruxas” que se faz sentir junto de cidadãos russos que escolheram Portugal para viver.

Marcando presença na atribuição do doutoramento ‘honoris causa’ a “uma grande artista portuguesa”, Graça Morais, Costa reiterou que nada tem “a acrescentar” sobre o acolhimento de refugiados ucranianos na Câmara de Setúbal, recordando já o ter feito por carta.

Ainda assim, respondendo às declarações de Rio que, na terça-feira, considerou que "era obrigação do Governo, e neste caso do primeiro-ministro, travar esta situação, seja ao nível do estado local, seja ao nível do estado central", o responsável começou por afirmar que já teve oportunidade de conversar com o líder do PSD, mas que repetiria o que já repetiu “várias vezes”.

“As atividades dos serviços de informações são por natureza atividades classificadas como secretas e, portanto, quem tem acesso à informação do que fazem ou não fazem os serviços secretos está obrigado a esse dever de segredo. A violação desse segredo constitui mesmo um crime. Portanto, eu, como responsável pelos serviços de informações, tenho que respeitar a legalidade. Não posso cometer crimes, nem devo comentar o que é que os serviços de informações fazem, não fazem, e muito menos se produzem relatórios ou não”, esclareceu.

Costa recordou que “a generalidade dos relatórios são sempre transmitidos ao primeiro-ministro, ao Presidente da República e, em razão da matéria, são ou não transmitidos a outras entidades a quem seja relevante, [...] ficando todos obrigados ao segredo” e apelou ainda a que os políticos deixem as “instituições atuar”, e não se precipitem “em conclusões”.

“Pelos vistos, o Dr. Rui Rio já sabe mais do que a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), que ainda não concluiu o inquérito, e também já sabe mais do que a Inspeção-Geral de Finanças, que também ainda não concluiu o inquérito. Pela minha parte, como não sei mais, aguardo simplesmente [pelos relatórios]”, atirou, salientando que “o Governo tem uma tutela de mera legalidade”, podendo apenas “fiscalizar se um determinado município atuou dentro da lei ou atuou fora da lei”.

Revelando sentir-se “incomodado com um clima de caça às bruxas relativamente a muitos cidadãos russos que escolheram Portugal para viver, e que têm o direito de viver em Portugal em total segurança e liberdade”, realçou que “muitos deles estão cá como refugiados de um regime ditatorial como o que vigora na Rússia, [pelo que] não podemos ver em cada russo um agente do [presidente Vladimir] Putin”. “Não precisamos de andar preocupados à procura de espiões atrás de cada árvore”, complementou. 

O primeiro-ministro alertou que “Portugal tem de fazer uma distinção muito importante”, uma vez que “uma coisa é a guerra” e, “quanto à guerra, não há menor das dúvidas”. 

“Esta guerra é uma guerra ilegal, ilegítima, bárbara, de responsabilidade exclusiva da Rússia, que tem cometido sucessivos crimes de guerra na Ucrânia. O nosso dever é combater pela paz, apoiando a Ucrânia do ponto de vista financeiro, humanitário, militar, político, e condenar de forma inequívoca a Rússia, [assegurando] que no futuro responderá pelos crimes de guerra que estão a ser praticados”, rematou.

O que aconteceu até aqui?

Recorde-se que Igor Khashin, dirigente da Associação de Emigrantes de Leste (Edintsvo), agora liderada pela sua mulher Yulia Khashina - funcionária da Câmara de Setúbal desde dezembro -, participava na receção dos refugiados ucranianos naquela cidade.

Depois de ter noticiado o caso, o semanário Expresso reproduziu declarações de alguns refugiados acolhidos em Setúbal, que confirmaram a presença Khashin no local "com computador pessoal e a perguntar dados das pessoas", acrescentando que chegou a fotocopiar documentos.

Entretanto, o Governo ordenou uma investigação ao município de Setúbal pela Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) e uma sindicância a realizar pela Inspeção-Geral de Finanças, face às denúncias de alegadas irregularidades no acolhimento de refugiados ucranianos.

A Câmara de Setúbal anunciou que tinha sido oficialmente informada do início das diligências para apurar eventuais falhas na receção de refugiados ucranianos, tendo o presidente da autarquia apelado, na sessão pública de câmara, a que se evite falar do assunto publicamente.

Leia Também: PS afasta para já comissão de inquérito sobre refugiados em Setúbal

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