A "prática transversal" e as críticas ao MP. Eis as explicações de Rio

Na primeira entrevista que deu após ser alvo de buscas, o ex-lider do PSD acusou o Ministério Público de intromissão política e insistiu numa reforma na justiça. Em causa estão suspeitas de crimes como peculato e abuso de poderes por alegada utilização indevida de dinheiros públicos na anterior gestão do PSD.

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© PATRICIA DE MELO MOREIRA/AFP via Getty Images

Carmen Guilherme
14/07/2023 20:25 ‧ 14/07/2023 por Carmen Guilherme

Política

Rui Rio

Rui Rio deixou, esta sexta-feira, duras críticas ao Ministério Público (MP) devido às buscas de que foi alvo durante a semana. O antigo líder do PSD defendeu uma reforma na justiça e disse que é necessário os políticos ganharem "coragem" para dizer "basta", garantindo que não cometeu qualquer ilegalidade.

"Na televisão, eu brinquei com isto, como forma de mostrar o ridículo que estava acontecer, mas o ridículo é também grave", começou por dizer Rui Rio, numa entrevista na SIC, após ser interrogado sobre se, durante a sua liderança, o PSD usou ou não verbas da Assembleia da República para pagar a funcionários do partido que não trabalhavam no grupo parlamentar.

"É uma prática transversal a todos os partidos desde sempre"

"Isto que estamos a falar é uma prática transversal a todos os partidos desde sempre, sempre. Nos anos 80 já era assim", frisou, deixando depois uma pergunta que "quer" que a "senhora procuradora-geral" da República "um dia responda".

"Se é uma prática transversal a todos os partidos, há muitos anos, porquê só o PSD?", questionou. "Ponto 2: Por que é que dentro do PSD só entre 2018 e 2021, exatamente o período em que fui eu e só eu o presidente do partido?", acrescentou o social-democrata.

"Eu queria deixar claro isto (...) É assim há 40 e tal anos, porquê só o PSD?", reforçou, levantando, novamente, dúvidas no que diz respeito ao período em investigação - 2018 a 2021, e reiterando que esta é "uma prática transversal há muitos anos".

Desta forma, Rio remeteu para o artigo 5.º da Lei de Financiamento dos Partidos Políticos, que diz "quais são as verbas que os partidos têm à sua disposição para gerir". Rio esclareceu que têm duas verbas: uma porque concorreram a eleições e tiveram mais de 50 mil votos e outra porque têm um grupo parlamentar.

"Não há uma coisa que é o grupo parlamentar e outra coisa diferente que é o partido"

O grupo parlamentar "é um órgão do partido", sublinhou. "Estas verbas, uma e outra, são para utilização do partido. Quem trabalha no grupo parlamentar, ou na sede, ou nos dois sítios ao mesmo tempo, está a trabalhar para o partido. Não há uma coisa que é o grupo parlamentar e outra coisa diferente que é o partido. É tudo a mesma coisa", defendeu.

Confrontado com a "zona cinzenta" de que fala o Presidente da República, Rui Rio considerou que "não há zona cinzenta nenhuma".

"Ambas as verbas são despachadas pelo Presidente da Assembleia da República. Não é uma de uma maneira, outra de outra, [são] para uma mesma entidade que tem um número fiscal. Para que isto fique absolutamente claro. E é obrigação dos partidos políticos gerirem estas verbas com rigor e seriedade, e não como o Ministério Público está a dizer", afirmou.

"É com rigor e com seriedade. O Ministério Público não sabe gerir as verbas e devia ter vergonha", atirou.

O antigo líder do PSD exemplificou depois: "O que o Ministério Público diz é que se eu tenho um assessor para a área do Ambiente no grupo parlamentar, tenho de ter ter outro na sede do partido (...) Tenho de ter dois assessores para o Ambiente. Se um fica 15 dias a olhar para as moscas porque não tem nada para fazer, tenho de pagar porque a lei diz - que não diz nada disso".

Rio lembrou ainda que a sua assessora de comunicação, Florbela Guedes, que também foi alvo de buscas, trabalhava na sede e no Parlamento e ganhava metade do salário de cada lado. Algo que também aconteceu com o histórico Zeca Mendonça, anterior assessor do PSD. 

O MP não sabe o que são "critérios de gestão"

O social-democrata reforçou, depois, as críticas, referindo que o MP não sabe o que são "critérios de gestão", tendo levado 100 agentes a participar nestas buscas. "Para procurar nada, que eu não percebi nada do que foram procurar a minha casa".

Rui Rio admite que possa haver "vingança" nas denúncias, mas que "o problema" em questão é que o MP se "intromete politicamente", o que é "gravíssimo em termos de regime".

"Isto não é país que se apresente em lado nenhum", criticou.

"Se não tiverem coragem de dizer basta haverá um momento em que alguém vai dizer chega"

Interrogado sobre se a lei deve ser alterada, em nome da transparência, Rio foi direto: "Eu para ser sincero não fazia nada. Isto está claro e o que o Ministério Público fez é inadmissível. Portanto, a minha atuação era ao nível da reforma da Justiça, era ao nível do Ministério Público para pôr ordem nisto. Senão, o poder político está sempre a agachar-se".

"Se o poder político -  o Presidente da República, a Assembleia da República, o Governo, os partidos - se não tiverem coragem de dizer basta haverá um momento em que alguém vai dizer 'chega'", atirou.

Para Rio, o MP quer "dizer que os políticos são todos uns vigaristas, uns gatunos, uns aldrabões".

O social-democrata admitiu que há muitos anos que é crítico do MP e disse: "Não precisei que viessem bater à minha porta para me fazer isto para eu estar a ver o que estavam a fazer aos outros e já não gostar, por causa de uma coisa que é sagrada para mim, que é precisamente a Democracia, que eu vejo a ser enterrada todos os dias".

O antigo líder do PSD disse que foi "ridículo" o que aconteceu e garantiu que não foi avisado de que iria ser alvo de buscas.

Rui Rui notou ainda que deu esta entrevista para dizer a "verdade", notando que reagiu como "alguém que não está muito interessado" em voltar à política, ou apresentaria uma "postura mais calma". "Não tenho de ter cuidado nenhum. Estou aqui a dizer a verdade e estou a dar um contributo ao país. Estou a dar um contributo ao poder político", frisou.

Questionado sobre se o primeiro-ministro, António Costa, o contactou, Rio respondeu com ironia: "Se me ligou deve ter atendido a Polícia Judiciária", disse, confessando, posteriormente, que já falou com o atual presidente do PSD, Luís Montenegro.

Recorde-se que, na quarta-feira, a PJ mobilizou cerca de 100 inspetores e peritos informáticos e financeiros para um conjunto de 20 buscas, incluindo na casa de Rio e na sede nacional do PSD. Em causa está a utilização de verbas do Parlamento, destinadas ao pagamento de assessores parlamentares, para pagar a funcionários do partido entre 2018 e 2022.

A PJ, confirmou, em comunicado, que estavam a ser investigadas "suspeitas da eventual prática de crimes de peculato e abuso de poderes".

Um dia depois, na quinta-feira, o PSD dirigiu uma missiva à procuradora-geral da República, Lucília Gago, em protesto pelas buscas de que foi alvo, qualificando-as como "de grande desproporcionalidade".

[Notícia atualizada às 22h02]

Leia Também: Rui Rio. Isabel Moreira questiona atuação da PJ: "Nunca acharei normal"

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