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"Turcos" de Ventura dão bilhete para "linha vermelha" a PAR. Que se diz?

Palavras de André Ventura geraram polémica e posição do presidente da Assembleia da República não foi bem vista pela Esquerda. Entenda o que se passou.

"Turcos" de Ventura dão bilhete para "linha vermelha" a PAR. Que se diz?
Notícias ao Minuto

15:15 - 17/05/24 por Notícias ao Minuto com Lusa

Política Parlamento

O debate setorial com o ministro das Infraestruturas e Habitação, esta sexta-feira, ficou marcado por uma polémica que envolve o líder do Chega, André Ventura, mas que acabou por recair, sobretudo, sobre o presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco. O sucedido levou já a inúmeras críticas por parte de várias figuras políticas. 

Tudo começou com uma intervenção de André Ventura que, ao questionar os dez anos previstos para a construção do novo aeroporto de Lisboa, disse o seguinte: "Podemos ser muito melhores que os turcos, que os chineses, que os albaneses, vamos ter um aeroporto em cinco anos".

"O aeroporto de Istambul foi construído e operacionalizado em cinco anos, os turcos não são propriamente conhecidos por ser o povo mais trabalhador do mundo", tinha começado por dizer Ventura, sob protestos de várias bancadas, com Aguiar-Branco a pedir para o deixarem continuar a sua intervenção porque "o deputado tem liberdade de expressão para se exprimir".

De imediato, o líder parlamentar do BE, Fabian Figueiredo, pediu a palavra para defender que "atribuir características e estereótipos a um povo não deve ter espaço no debate democrático da Assembleia da República" e pediu desculpas ao embaixador da Turquia.

Na resposta, o presidente da Assembleia da República disse discordar desta visão.

"Não concordo, porque o debate democrático é cada um poder exprimir-se exatamente como quer fazê-lo. Na opinião do presidente da Assembleia, os trabalhos estão a ser conduzidos assegurando a livre expressão de todos os deputados, não tem a ver com o que penso pessoalmente, não serei eu o censor de nenhum dos deputados", afirmou.

A líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão, pediu também a palavra para questionar "se uma determinada bancada disser que uma determinada raça ou etnia é mais burra ou preguiçosa também pode".

"No meu entender, pode. A liberdade de expressão está constitucionalmente consagrada. A avaliação do discurso político que seja feita aqui nesta casa será feita pelo povo em eleições", respondeu o presidente da Assembleia da República.

Aguiar-Branco propôs que "se houver alguém que acha que deve ser feita censura à intervenção dos deputados recorre da decisão do presidente da Assembleia".

"E aí o plenário é que fará a censura, não serei eu", disse.

Isabel Mendes Lopes, líder parlamentar do Livre, pediu a palavra para sublinhar que "o racismo é crime" e que o que é dito no Parlamento "tem consequência direta na vida das pessoas".

"Não vou dar continuidade a este tema, a Assembleia tem inúmeros mecanismos regimentais para exprimir a sua opinião. Uma coisa pode ter a certeza, não serei eu nunca a cercear a liberdade de expressão", disse Aguiar-Branco, numa intervenção aplaudida de pé pela bancada do Chega.

O momento rapidamente foi noticiado e as críticas a Aguiar-Branco multiplicaram-se nas redes sociais.

"Linha vermelha", "Inacreditável", "Crime", "Inaceitável". Críticas multiplicam-se

Uma primeira reação surgiu por parte da socialista Isabel Moreira. 

"Aguiar Branco acaba de dizer que afirmar, por exemplo, que uma etnia é mais preguiçosa ou mais burra que outra é liberdade de expressão. Não interrompe quem o disser. Para o PAR, interromper palavras racistas, xenófobas, criminosas, é 'censura'. E assim teve 50 deputados de pé às palmas. Indiferente aos efeitos práticos da sua postura", escreveu a deputada na rede social X. "Como é possível, Aguiar-Branco? Não podemos tratar por tu, o que acho bem, mas podemos dizer tudo?", questionou ainda.

Ainda da bancada socialista, chegou também a crítica por parte de Eurico Brilhante Dias, a lembrar o antigo presidente da Assembleia da República Augusto Santos Silva. "Hoje foi trespassada uma linha vermelha. A violação do n° 3 do artigo 89 do Regimento é evidente. A posição do Senhor Presidente é, neste caso inaceitável. Foi por isto durante dois anos o Augusto Santos Silva teve que intervir", criticou na mesma rede social.

Já o socialista Tiago Barbosa Ribeiro referiu-se ao sucedido como "inacreditável". "Aguiar-Branco não tem noção do lugar que ocupa e pelos vistos desconhece a Constituição, a lei e o regimento da AR", escreveu no X.

Mariana Vieira da Silva, atual deputada e antiga ministra, considerou que o que aconteceu "não nos pode deixar indiferentes". "De que vale o não é não se o discurso se começa a confundir? Ou se se permite tudo? O que se passou esta manhã na Assembleia da República não nos pode deixar indiferentes. Porque há linhas que não se podem ultrapassar", considerou.

Também a coordenadora do Bloco de Esquerda (BE), Mariana Mortágua, recorreu às redes sociais para lamentar este episódio.

"O Chega chama preguiçosos aos turcos. O Presidente da AR acha que é liberdade de expressão. É racismo, é crime e é mentira", escreveu na rede X.

"Pode afirmar-se no Parlamento que 'uma determinada raça ou etnia é mais burra ou preguiçosa'? Aguiar-Branco diz que sim (a Constituição, o Código Penal e a Declaração dos Direitos Humanos dizem que não)", acrescentou.

Também Fabian Figueiredo partilhou um vídeo da sua intervenção e apontou: "O Presidente da Assembleia da República permitiu que os insultos racistas de André Ventura, desta vez visando os trabalhadores turcos, fossem proferidos sem qualquer objeção. Interpretou-os à luz da liberdade de expressão. É inaceitável. Não toleramos discurso de ódio. É crime", escreveu o líder parlamentar do BE.

Já a deputada Joana Mortágua considerou que Aguiar-Branco "perdeu hoje qualquer graça que possa ter tido". "Aguiar Branco perdeu hoje qualquer graça que possa ter tido. Perante a declaração de Ventura de q o povo turco é preguiçoso, interpelado sobre se pode haver discurso racista na Assembleia, o Presidente respondeu que sim. Contra a Constituição. Foi Aplaudido de pé pelo Chega", afirmou a bloquista, numa publicação também divulgada no X.

O Livre também se manifestou contra o sucedido e lembrou que "racismo é crime, não é liberdade de expressão".

"Racismo é crime, não é liberdade de expressão. A Assembleia da República tem a responsabilidade de zelar por todas as pessoas que vivem em Portugal e de condenar afirmações racistas, xenófobas e discriminatórias e o Presidente da Assembleia da República não pode permiti-las", lê-se numa publicação divulgada pelo partido liderado por Rui Tavares, que compartilhou a mesma na sua página no X. 

Tema será levado à conferência de líderes

De notar que, no final do debate, o PS propôs levar à conferência de líderes parlamentares como se deve compatibilizar a liberdade de expressão no Parlamento com "linhas vermelhas" como o "discurso de ódio" ou racista, o que mereceu a concordância de Aguiar-Branco.

"Os deputados gozam, e muito bem, de imunidade pelo que dizem aqui, o que lhes deve dar maior responsabilidade. Deve ser, com o devido respeito, o senhor Presidente a garantir que não se passem todas as linhas de vermelhas", defendeu a líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão, recebendo aplausos de toda a esquerda e do PAN.

Aguiar-Branco concordou em tratar o tema na conferência de líderes parlamentares, mas disse que "na riqueza da democracia e do direito" pode pensar de forma diferente.

"As minhas linhas vermelhas não são nunca entre ter ou não ter liberdade de expressão. O juízo democrático será feito pelo povo português, é o meu entendimento", disse.

O presidente do Chega, André Ventura, acusou o PS de "não perder os velhos hábitos" de quando era presidente da Assembleia Augusto Santos Silva, que considerou não ter sido eleito por "atitudes como essa".

"Considero que não fiz nenhuma declaração racista ou xenófoba (...) Se o Ministério Público de Lisboa entender que o que aqui fiz foi um ato racista, não é preciso nenhuma imunidade, eu vou lá pelo meu próprio pé", afirmou.

O líder parlamentar do PSD, Hugo Soares, disse não se rever nem na posição de Aguiar-Branco nem na das bancadas da esquerda - que apoiaram a posição do PS -, dizendo que "é com estes episódios que o populismo ganha gasolina", mas concordou em debater o tema na próxima conferência de líderes.

À esquerda, os líderes parlamentares do BE, PCP e Livre e a deputada única do PAN acompanharam a posição do PS, com o bloquista Fabian Figueiredo a pedir a convocação da conferência de líderes com "a maior brevidade possível".

A IL foi o único partido que não pediu a palavra e só o líder parlamentar do CDS-PP, Paulo Núncio, disse acompanhar a visão de Aguiar-Branco.

Pode recordar o momento na ligação abaixo.

Leia Também: PS levará "linhas vermelhas" no discurso da AR à conferência de líderes

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