Abstenção na moção de confiança "transformaria PS na muleta do Governo"

Santos Silva alertou que será "preciso, pelo menos, diálogo", uma vez que “temos hoje uma losca de três blocos e não há alianças possíveis de dois a dois".

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Daniela Filipe
14/03/2025 22:41 ‧ há 4 horas por Daniela Filipe

Política

Crise política

O antigo ministro dos Negócios Estrangeiros e ex-presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, considerou, esta sexta-feira, que o Partido Socialista (PS) seria “brutalmente prejudicado se viabilizasse a continuidade do Governo nas condições em que a moção de confiança foi feita”, tornando-se inevitavelmente “na muleta” do Executivo de Luís Montenegro. O socialista notou ainda que o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, “cometeu um erro” na sequência da demissão do antigo primeiro-ministro, António Costa, pelo que, agora, “não podia fazer outra coisa” que não dissolver o Parlamento.

 

Diria que o PS seria brutalmente prejudicado se viabilizasse a continuidade do Governo nas condições em que a moção de confiança foi feita [e que a abstenção] transformaria o PS na muleta do Governo. Uma coisa é o PS ser a favor da estabilidade e não viabilizar moções de censura; outra coisa é o PS declarar ser a bengala do Governo. Isso é uma coisa que não se pode pedir, muito menos ao partido que tem de ser para as pessoas a alternativa possível à situação vigente”, apontou Santos Silva, em entrevista à SIC Notícias.

O socialista equacionou que, caso a Aliança Democrática (AD) saia vitoriosa nas eleições antecipadas de 18 de maio, “deve formar o Governo”, pelo que o PS “deve ter uma atitude responsável”.

“Mesmo que a AD tenha maioria absoluta, o que me parece quase impossível, o PS não deve ser o partido de oposição de bota-abaixo. Quando falamos na reciprocidade, falamos na reciprocidade. Isto é, se o PS ganhar as eleições, como acho que tem todas as condições para suceder, mesmo que não consiga formar maioria à Esquerda, a Direita democrática tem o dever de tratar o Governo minoritário do PS com a mesma compreensão com que o PS tratou o Governo minoritário da Direita democrática”, defendeu.

Questionado quanto à eventualidade de, num Executivo socialista, o país voltar a estar a braços com eleições antecipadas, o antigo ministro dos Negócios Estrangeiros foi taxativo: “Imagino que um Governo do PS não cometa o erro político de se sujeitar a uma moção de confiança num Parlamento no qual não tenha maioria.”

Toda a gente percebe qual era a tática do atual Governo. O Governo pegou no excedente orçamental que herdou do doutor António Costa e gastou-o para sossegar as vozes, os grupos profissionais mais vocais, e desde o início que apostou tudo em eleições antecipadas que pudessem reforçar a sua maioria. O que o Governo não previu foi que o ritmo do ciclo político fosse determinado não pela estratégia política pré-eleitoral do Governo, mas sim pelo comportamento do primeiro-ministro”, sublinhou.

Santos Silva admitiu ainda que, caso haja uma maioria de Esquerda, poderá formar-se uma nova Geringonça. Alertou, contudo, que será “preciso, pelo menos, diálogo”, uma vez que “temos hoje uma losca de três blocos e não há alianças possíveis de dois a dois”, referindo-se ao Partido Social Democrata (PSD), ao PS e ao Chega.

Marcelo? "Acho que se precipitou bastante em 2022"

Já no que diz respeito ao discurso proferido por Marcelo Rebelo de Sousa, na quinta-feira, o socialista confessou ter ficado surpreendido pela “assunção explícita de que na raiz desta crise estava um problema ético, não apenas político, associado ao primeiro-ministro”.

“O que me surpreendeu no discurso do Presidente da República, ontem, que me pareceu um bom discurso, foi a assunção explícita da parte dele de que na raiz desta crise estava um problema ético, não apenas político, associado ao primeiro-ministro. Devo dizer que concordo, mas o facto de o Presidente, no discurso em que anuncia a convocação das eleições, ter estabelecido quase esse nexo causal, surpreendeu-me um pouco”, disse.

Santos Silva foi mais longe, tendo apontado que “o professor Marcelo Rebelo de Sousa não podia fazer outra coisa com a doutrina que estabeleceu há cerca de dois anos”. Isto porque, na sua ótica, “quando recusou que se formasse um novo Governo com a mesma composição parlamentar, na sequência da demissão do doutor António Costa, cometeu um erro”, erro esse que “não foi acompanhado pelo Conselho de Estado”, o que fez com que ficasse “amarrado”.

“Sou daqueles que acha que as eleições são, em democracia, sempre uma forma de resolver crises, mas deve ser uma forma que devemos usar como último recurso, esgotando outros instrumentos que se possa ter. No caso presente, nem sequer era a ação do Governo que estava agora em causa, é mesmo o comportamento do primeiro-ministro. Mais do que substituir o Governo, a substituição do primeiro-ministro poderia resolver esse problema”, sustentou.

Para o responsável, a presidência de Marcelo “não pode ser avaliada no seu conjunto”. Se o primeiro mandato “foi excelente” e “uniu o país”, além de ter devolvido “à função de Presidente da República uma proximidade afetiva com as pessoas e com as pessoas comuns que estava a faltar”, e também “foi muito importante para tranquilizar o país e os nosso parceiros internacionais na sequência da formação do Governo da Geringonça, mostrando que havia um equilíbrio institucional e que os grandes interesses geopolíticos de Portugal não estavam em causa”, depois da maioria absoluta alcançada pelo PS, em 2022, o chefe de Estado sofreu “uma diferença radical no comportamento”, tendo ficado “mais errático”.

Acho que ele se precipitou bastante em 2022, quando se assumiu formal e explicitamente perante o país como a oposição à maioria absoluta, e depois quando se precipitou na sequência da demissão do doutor António Costa, a forçar a dissolução da Assembleia da República”, reforçou.

De qualquer modo, o antigo parlamentar lembrou que “o juízo sobre o mandato não pode fazer-se agora, porque o Presidente da República vai ter um momento muito importante na sequência da realização das próximas eleições”.

“Os resultados eleitorais de maio próximo podem não ser muito diferentes da atual composição parlamentar, - talvez com uma mudança do partido que esteja à frente -, e creio que o Presidente da República vai ter de ter uma intervenção um pouco mais proativa, para evitar que um próximo Governo seja tão frágil como foi este”, disse.

E sintetizou: “O que estava aqui em causa era uma crise criada pelo primeiro-ministro, que o primeiro-ministro não soube gerir, porque se furtou ao contraditório com os jornalistas, aos esclarecimentos cabais no Parlamento, e que procurou resolver da pior maneira possível, impondo uma moção de confiança que sabia que não podia ser aprovada. Portanto, forçando ele próximo a demissão do Governo, a dissolução do Parlamento e as eleições antecipadas.”

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