Artigo de Cavaco Silva sobre Costa foi "apelo ao reformismo"

Antigo secretário de Estado defende que o ex-Presidente da República alerta para a necessidade de se fazer reformas, numa altura em que se discute o Orçamento do Estado. Já Mariana Mortágua diz que Cavaco Silva se "tornou numa figura irrelevante no debate público".

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© Paulo Spranger/Global Imagens

Carmen Guilherme
11/04/2022 23:48 ‧ 11/04/2022 por Carmen Guilherme

Política

Cavaco Silva

Adolfo Mesquita Nunes considerou, esta segunda-feira, que as palavras de Aníbal Cavaco Silva sobre António Costa foram um “apelo ao reformismo”. Já Mariana Mortágua entendeu que o antigo Presidente da República se tornou numa “figura irrelevante” no debate público pela forma “facciosa” como entra no mesmo, acusando-o de ter “pazes mal feitas com o passado”. 

Recorde-se que, num artigo de opinião publicado hoje no jornal Público, Cavaco Silva escreveu que o primeiro-ministro tem "um grau de coragem política muito baixo", com exceção da área do mercado de trabalho, em que "revelou resistência às pressões da extrema-esquerda quanto à legislação laboral”. Além disso, considerou que na atuação de Costa nos seis anos como chefe do Governo “sobressaiu a aversão a políticas de cariz estrutural”.

Este artigo foi tema de debate no programa ‘Linhas Vermelhas’, desta segunda-feira, na SIC Notícias, e dividiu opiniões.

“[Interpreto as palavras de Cavaco Silva] como um apelo ao reformismo”, começou por dizer Adolfo Mesquita Nunes.

Sempre que ele [Cavaco] fala, toda a gente aparece aos berros, escandalizada e ele apenas se limita a dizer algo que eu tenho repetido aqui várias vezes (...) que é: falta ímpeto reformista”, defendeu Mesquita Nunes“Acho sempre curiosa a forma como muita gente reage com indignação às palavras de Cavaco Silva, eu gosto de salientar que foi o único português até hoje que ganhou quatro eleições com maioria absoluta”, recordou. “Não sei onde é que andam esses eleitores porque, sempre que ele fala, toda a gente aparece aos berros, escandalizada e ele apenas se limita a dizer algo que eu tenho repetido aqui várias vezes (...) que é: falta ímpeto reformista”, acrescentou. 

O antigo secretário de Estado alertou depois para os “dados preocupantes”, nomeadamente dados que apontam para o facto de Portugal ter sido “ultrapassado por duas economias de leste em 2021”.

“Nós temos um problema de competitividade, nós temos um problema de crescimento e, para isso, precisamos de fazer reformas. Depois podemos não concordar nas reformas que Cavaco Silva quer fazer, ou nos campos onde ele quer fazer, mas que não tem havido reformismo, não tem havido, é um facto”, defendeu.

O comentador apontou depois críticas à gestão do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), criticando o facto de a “esmagadora maioria” dos fundos serem destinados a “empresas públicas ou para entidades públicas”. 

“As empresas privadas, as famílias ainda não receberam quase nada. Há aqui uma forma de entender o crescimento, uma forma de entender a economia, que Aníbal Cavaco Silva está a procurar contrariar dizendo: é necessário fazer reformas”, afirmou, referindo a importância de o fazer neste momento, altura em que se começa a discutir o Orçamento do Estado.

“Era o que mais faltava que um ex-primeiro-ministro e um ex-Presidente da República não pudesse fazer este convite mais vivo ao ímpeto reformista que tem faltado”, completou, apontando que o Governo vai ter maioria absoluta “e não vai ter desculpa para não fazer as reformas”.

Cavaco Silva tornou-se numa figura irrelevante no debate público pela forma facciosa como entra nesse debate público, diz MortáguaJá Mariana Mortágua deixou claro que tem uma opinião muito diferente de Mesquita Nunes.

“Penso que Cavaco Silva se tornou numa figura irrelevante no debate público pela forma facciosa como entra nesse debate público, sempre e até um pouco enfim...com as pazes mal feitas com o passado, digamos assim, nomeadamente o passado em que não pôde dar posse a um Governo de Pedro Passos Coelho que queria continuar uma política de reformas. Porque quando se fala em reformas só há uma interpretação, são as reformas que a direita quer, como se outras políticas não pudessem também ser reformas”, defendeu.

A bloquista sublinhou depois que não “percebe bem” a acusação apontada a António Costa por Cavaco Silva.

“Não se percebe bem que acusação é esta, que ‘cobardia’ é esta, que ‘coragem’ é esta, Cavaco Silva não explica muito bem o que é. O único caso em que António Costa terá tido mais coragem, terá sido menos cobarde não sei ou terá tido mais força, foi quando resistiu a uma alteração da lei laboral que a esquerda exigia”, notou. “E, portanto, nós percebemos qual é a bitola de Cavaco Silva, não surpreende ninguém, são as políticas que defendemos no passado”, acrescentou.

Mariana Mortágua recordou depois que Portugal “é um dos países que mais privatizou na Europa, que mais PPP fez na Europa” e que não “faltaram reformas no passado a este nível, com a liberalização muito acentuada de vários setores da economia”.

“Hoje, eu penso, e não serei a única, que a falta de competitividade, a desindustrialização, a falta de crescimento económico e a falta de produtividade têm mais a ver com estas reformas que foram feitas e não tanto com o facto de não se terem aprofundado ainda mais as reformas liberais”, considerou.

A comentadora rejeitou depois as comparações entre Portugal e países de leste, que entendeu não serem adequadas “por várias razões”.

“Alguns países de leste têm regimes autoritários, acho que não se possa comparar democracias com regimes autoritários. Segunda razão, nós entramos na União Europeia em 1986 e entrámos no primeiro grupo que se juntou ao Euro, não me parece muito justo comparar economias que têm características diferentes. Portugal não está a ser comparado com o grupo de países que entrou consigo no Euro ou na União Europeia, está a ser comparado com países que entraram depois”, defendeu, referindo que esses países tiveram, tal como Portugal também teve, um “crescimento muito acentuado por força desse processo”.

Mortágua apontou ainda que o aumento do PIB per capita de “muitos países bálticos, por exemplo”, se dá “porque perderam uma boa parte da sua população para a emigração” . 

“Quer isto dizer que não precisamos de reformas? Não, eu acho que o país precisa de reformas muito sérias. A sobredependência do turismo é um problema da nossa economia e que faz com que a recuperação se retarde e dependa muito de um único setor”, sublinhou.

“E acho que os serviços públicos precisam de reformas profundíssimas para responder às pessoas que hoje não estão a responder e podem ser uma fonte de produtividade e podem ser uma fonte de crescimento económico também”, completou. 

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