O grupo de trabalho será liderado pelo conselheiro Pedro Marchão Marques, que deixou este ano de presidir ao Tribunal Central Administrativo do Sul (TCA Sul), encarregado de proteção de dados do tribunal, que irá ainda escolher a composição do grupo e apresentar as conclusões e a proposta de carta de ética para o uso de inteligência artificial (IA) nos tribunais administrativos.
"Reconhecendo que o recurso à IA permite novas soluções de trabalho para um desenvolvimento mais célere e eficiente do trabalho judicial, nomeadamente com a diminuição ou mesmo eliminação de tarefas repetitivas, verificação de documentos, otimização de pesquisa, entre outros, este Conselho Superior considera que o recurso às plataformas de IA, minimizados os seus riscos, são um apoio à melhoria da produtividade dos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal", explicou o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF) num comunicado hoje divulgado.
O CSTAF recorda que já existem instrumentos de regulação jurídica e ética no quadro da legislação europeia, um dos quais o regulamento do Parlamento Europeu aprovado em junho deste ano, "o primeiro instrumento internacional juridicamente vinculativo nesta matéria".
A decisão de adotar uma carta de ética para o uso de IA acontece numa altura em que noutra jurisdição, a judicial, um acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa está debaixo de críticas por alegado uso de IA, tendo na quarta-feira sido conhecido um comunicado conjunto dos advogados do processo a reiterar as dúvidas sobre a matéria, não se considerando esclarecidos com a resposta do tribunal superior às reclamações apresentadas.
O acórdão em causa, no processo que envolve a antiga deputada do PSD Helena Lopes da Costa e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, foi corrigido pela Relação de Lisboa, sem impacto na decisão de pronúncia dos arguidos, tendo a presidente do TRL, a desembargadora Guilhermina Freitas, esclarecido que "foram corrigidos lapsos existentes, ao abrigo do artigo 380.°, do Código de Processo Penal (CPP)".
O artigo 380.º do CPP, relativo à correção de sentença, determina que esta deve acontecer quando não cumpra os requisitos formais para a sua elaboração ou "contiver erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade cuja eliminação não importe modificação essencial".
No comunicado em reação à decisão do TRL, os advogados sustentaram que "a decisão tomada pelos senhores desembargadores acerca das reclamações não esclarece nenhuma das dúvidas e perplexidades acerca do acórdão".
Os advogados já tinham também apresentado queixa junto do Conselho Superior da Magistratura (CSM), que entendeu não se pronunciar, considerando-a intempestiva por se tratar de matéria ainda em análise pelo TRL.
O jornal 'Correio da Manhã' noticiou em 24 de novembro que um acórdão dos desembargadores Alfredo Costa, Hermengarda do Valle-Frias e Margarida Ramos de Almeida no processo que envolveu a antiga deputada do PSD Helena Lopes da Costa e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa terá alegadamente recorrido a ferramentas de inteligência artificial, citando legislação e jurisprudência inexistentes.
Rui Patrício e Catarina Martins Morão, advogados de Helena Lopes da Costa, contestaram junto do coletivo de desembargadores a validade do acórdão, num requerimento a que a Lusa teve acesso, em que pediram que fosse declarado inexistente.
Na altura, Guilhermina Freitas garantiu que lhe foi transmitido pelo juiz desembargador relator, Alfredo Costa, "que a argumentação do recurso à inteligência artificial é completamente descabida".
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