Há vários meses que a RDCongo, país vizinho de Angola, acusa a marca Apple de comprar minerais contrabandeados do leste do país, uma zona muito instável, para o vizinho Ruanda, onde são branqueados e "integrados nas cadeias de abastecimento mundiais".
A queixa visa estes factos, bem como as "práticas de marketing enganosas", alegadamente, utilizadas pela Apple "para assegurar aos consumidores que as cadeias de abastecimento do gigante tecnológico são limpas", segundo um comunicado divulgado hoje pelos advogados Robert Amsterdam (Washington), William Bourdon e Vincent Brengarth (Paris) e Christophe Marchand (Bruxelas).
A queixa, a que a agência de notícias francesa AFP teve acesso, foi apresentada em Paris e visa os crimes de ocultação de várias violações graves, incluindo crimes de guerra, branqueamento de capitais, falsificação e utilização de falsificações, e burla.
Para Bourdon, "a França tem o dever e a honra de ser o primeiro país a levar a tribunal as condições de exploração dos minerais de sangue e o enriquecimento sem fim de que beneficiam cinicamente as maiores empresas".
De acordo com o comunicado de imprensa, a intenção geral do executivo daquele país africano com esta primeira ação judicial é "confrontar os indivíduos e as empresas envolvidas na cadeia de extração, fornecimento e comercialização de recursos naturais e minerais saqueados na RDCongo".
"A escala e a duração destas atividades infligiram destruição e um sofrimento insondável à população civil em algumas partes do país", acrescenta-se no comunicado.
"Estas atividades alimentaram um ciclo de violência e conflito, financiando milícias e grupos terroristas, e contribuíram para o trabalho infantil forçado e a devastação ambiental", realçam os advogados.
A ajudar à sua queixa, os advogados citam o trabalho das Nações Unidas, do Departamento de Estado dos EUA e de ONG internacionais como a Global Witness.
AS mesmas fontes afirmam que escreveram à Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, para iniciar um diálogo sobre o papel que a União Europeia poderia desempenhar, nomeadamente para responsabilizar os atores envolvidos neste tipo de violações.
Em abril, a RDCongo notificou formalmente a Apple sobre esta questão.
A multinacional referiu informações publicadas no seu relatório anual de 2023 sobre minerais de conflito.
A empresa sublinhou não ter "encontrado qualquer base razoável para concluir que qualquer uma das fundições ou refinarias da 3TG [estanho, tungsténio, tântalo, ouro], determinadas como fazendo parte" da sua cadeia de abastecimento em 31 de dezembro de 2023, e garante que "nem financiou ou beneficiou, direta ou indiretamente, grupos armados na RDCongo ou num país vizinho".
O Ruanda também rejeitou as acusações, classificando-as como "uma repetição de alegações infundadas e conjeturas, destinadas a despertar o interesse dos meios de comunicação social por uma das maiores empresas do mundo".
"Esta é apenas a mais recente manobra do Governo da RDCongo, que está constantemente a tentar desviar as atenções para o Ruanda com falsas acusações", disse Yolande Makolo, porta-voz do Governo ruandês, à AFP.
O leste da RDCongo, rico em minerais, é palco de violência desde a década de 1990, e as tensões agravaram-se desde o reaparecimento, no final de 2021, do grupo Movimento 23 de Março (M23), conhecido com o Exército Revolucionário do Congo e apoiado pelo Ruanda, que ocupa grandes extensões de território no Kivu do Norte.
O Governo de Kinshasa acusa o Ruanda de querer deitar a mão aos recursos, nomeadamente mineiros, do leste da RDCongo, uma das razões pelas quais, na sua opinião, Kigali apoia a rebelião do M23.
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