Depois de seis 'curtas' -- a última delas ("Mia Mia Sudan Tamam Tamam") vencedora do Prémio de Cinema Português no Fantasporto de 2013 --, o repórter de imagem portuense concorre novamente a esse prémio com um filme que começou a ser feito em 2014, em paralelo com a atividade profissional.
Luís Moya almoçava com a sua mulher numa esplanada quando uma voz rouca e uma guitarra interromperam a conversa e, fascinado com o vulto do homem com cerca de 50 anos, o realizador perdeu "a vergonha" e juntou-se ao músico de rua no chão para cantar um tema dos Pink Floyd.
"A partir daí estabeleceu-se uma relação, encontrei-o noutros dias e surgiu a ideia do filme, no qual acabou por ser o protagonista. Claro que, na altura, não sabia das histórias dele. Só me falou dos grandes palcos passado três anos e meio de o conhecer", referiu o cineasta independente, de 34 anos.
Esse músico é Alexandre Amorim ('Alex'), membro fundador dos Pippermint Twist, banda que entrou numa coletânea do Rock Rendez Vous e contava com Miguel Cerqueira, baixista fundador dos Trabalhadores do Comércio, que também presta o seu testemunho no documentário.
"Só o 'Alex' e os Pippermint Twist davam para fazer um filme à volta disso e seria forte. Só que estas personagens do Porto -- isto não é só sobre músicos de rua, mas sobre a cidade e as pessoas. É um filme humano. A dificuldade foi conciliar a história dos músicos de rua com a história dos Pippermint Twist", confessou Moya.
Cinco a seis anos de gravações deram ao realizador muito material para uma película feita "90% sozinho e com um pequeno apoio de pós-produção do Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA)", que envolve nomes anónimos, mas caras conhecidas de quem percorria diariamente as ruas da cidade e também de quem delas saiu para singrar nos palcos nacionais, como Nuno Norte.
"O Nuno Norte foi dos primeiros músicos de rua no Porto, na altura chamavam-lhe muita coisa menos isso. Foi inscrito num programa de televisão, ganhou e catapultou para os palcos. A vida dá muitas voltas, tanto estás lá em cima como no fosso. O contrário também acontece, o Nuno tinha a experiência disso, esteve nos dois lados", explicou.
A abordagem aos músicos de rua não foi fácil, Luís Moya gastou muito tempo e admitiu que a sua vida pessoal sofreu com isso, até porque a filha nasceu quando o projeto ia a meio e desabafou sobre algumas das dificuldades que encontrou durante as gravações.
"São pessoas muito fechadas e de pé atrás, já tiveram experiências traumatizantes e pensam que toda a gente os está a tentar explorar. O meu filme não é para explorar ninguém, é para divulgar e dar a minha visão enquanto realizador que é promover o artista de rua e dar a conhecer uma realidade que ninguém conhece. Porque o pessoal passa na rua e chama-os de coitadinhos ou drogados. Quero mostrar que há ali grandes pessoas e artistas que as pessoas não fazem ideia", apontou.
Ainda assim, o portuense ficou com a sensação de que "podia ter feito melhor", apesar do orgulho que sente pela obra que vai apresentar em antestreia mundial no Fantasporto, no sábado, e não escondeu a admiração que tem pelos músicos de rua.
"Admiro a coragem desta gente, podiam estar a trabalhar noutro sítio alguns deles, que têm formações. Estão a dar um concerto na rua, um espetáculo, quem quiser parar e ver pôr uma moeda, ninguém obriga ninguém. Com esse dinheiro pagam as contas, compram calçado, sustentam os filhos. É preciso ter coragem, neste país, viver da música, ou cinema, ou qualquer arte. Eu não tive essa coragem, continuo a trabalhar e a conciliar com a paixão que tenho", finalizou.