Helena Sarmento assina 'Partida', que gravou no Fado Cravo, de Alfredo Marceneiro, e 'Entrega', que a polaca Gabriela Kozyra musicou. Do repertório de Chico Buarque recria 'Tanto Mar', e do de Elizeth Cardoso (1920-1990) 'Se as Estrelas Falassem', a única composição que cantora brasileira escreveu.
Em entrevista à agência Lusa, Helena Sarmento referiu-se a 'Tanto Mar' como o seu "disco mais feminino de sempre", não só por assinar duas letras, como por interpretar palavras escritas por outras mulheres".
O álbum só tem dois fados, 'Partida' e 'Naufrágio' (Cecília Meireles/Alain Oulman), uma criação de Amália Rodrigues (1920-1999).
Helena Sarmento recria vários temas do repertório brasileiro, entre os quais 'Que Sejas Feliz', de Cartola, criação do seu autor e que foi gravado, entre outros, por Stefano Mota, e 'Chão de Estrelas', que foi gravado por Nelson Gonçalves (1919-1998), Sílvio Caldas (1908-1998) e Maria Bethânia, cantora de referência para a artista portuguesa como afirmou à Lusa.
"Foi com o álbum 'Imitação da Vida', de Maria Bethânia [editado na década de 1990], que despertei para a beleza de cantar poesia escrita em português", disse.
Outro tema, também do outro lado do Atlântico, é 'Linda Flor (Ai, Yoyô)' (Henrique Vogeler/Marques Porto), uma criação de Araci Cortes (1904-1985), que foi gravado, entre outros, por Gal Costa (1945-2022), 'A Minha Verdade' (Délcio Carvalho/Ivonne Lara), que Ivone Lara criou e Zeca Pagodinho gravou, e 'Canção de Amor' (Elano de Paula/Dorival Silva), que Virgínia Rodrigues gravou, além de 'Tanto Mar', de Chico Buarque, que dá nome ao novo álbum de Helena Sarmento
Este álbum contou com a participação de 13 músicos, foi gravado entre o Porto e o Rio de Janeiro e teve direção musical de Pedro Aragão.
"Há muito tempo" que 'Tanto Mar', o álbum, estava nos projetos da artista, mas o concerto que apresentou em janeiro de 2022, na ilha de Paquetá, no Rio de Janeiro, foi decisivo para o concretizar.
Essa atuação em Paquetá levou Helena Sarmento "a acreditar muito neste disco", disse à Lusa. "Fiz no concerto o que fiz agora [no álbum], que foi gravar músicas tradicionais do Brasil com alguns fados, e o público reagiu muito bem. E eu percebi que existia uma unidade, tinha uma carga emocional que prendia as pessoas, nomeadamente pelas afinidades neste repertório que gravei, em termos das temáticas e do sentimento".
Este álbum, confidenciou a artista à Lusa, era o seu "sonho mais antigo na música". "Era um sonho tão grande, na minha conceção, que não sabia se o viria a concretizar. [...] O concerto em Paquetá foi a demonstração que era possível".
Para concretizar a edição em CD, a par de uma edição exclusivamente 'online', a cantora fez uma campanha de 'crowfounding', "que foi determinante", e contou com o apoio da Fundação GDA.
Sobre a escolha do repertório, entre os dois lados do Atlântico, Helena Sarmento declarou: "Mais do que a língua que nos une, há um sentimento, como a saudade, e muitos outros, que só a nossa língua reproduz".
O passo seguinte "é a construção de um espetáculo de palco que vai combinar várias linguagens artísticas além da música, como a poesia, dança e multimédia". Mas ainda está a ser pensado, afirmou.
O espetáculo, "um projeto ambicioso", começará a ser apresentado no próximo ano.
Na poesia, aproveitando os 500 anos do nascimento de Luís de Camões (1524-1580), a fadista disse que "a lírica camoniana, que é maravilhosa, e este é um disco muito sentimental, vai poder servir como fio condutor".
O álbum 'Tanto Mar' sucede a três álbuns de fado, e ao 'Liberdade, Liberdade!', muito ligado ao 25 de Abril de 1974, editado no ano passado, em que gravou, entre outros temas, 'Abandono' (David Mourão-Ferreira/Alain Oulman), também referenciado como 'Fado Peniche', 'Por trás daquela janela' e 'As Sete Mulheres do Minho' (ambas de José Afonso) e 'Trova do Vento que passa' (Manuel Alegre/António Portugal).
"Este novo disco é uma consequência natural, aonde o meu percurso na música me levou, as minhas referências na música, e um percurso de liberdade. E eu assumo cada vez mais essa liberdade. Este é de facto o disco que eu queria gravar", asseverou à Lusa a criadora de 'Fado Jurídico-Criminal' (André Teixeira/João Gigante-Ferreira).
"Tentei ser o mais livre possível, nomeadamente na escolha, sem me deixar condicionar pelo que posso ou não posso fazer e assumir a minha liberdade!", sublinhou.
A fadista reconheceu que este disco é "uma reviravolta" na sua carreira: "É um disco de maturidade, no qual fui dona de mim própria".
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