Ex-DGPC deixou caducar processo de classificação da obra de José Afonso

O processo de classificação da obra fonográfica de José Afonso caducou em setembro de 2021, um ano depois de aberto, porque ex-DGPC não prorrogou prazo, segundo decisão da empresa pública Museus e Monumentos de Portugal, revelada à Lusa.

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Lusa
29/01/2025 10:03 ‧ ontem por Lusa

Cultura

José Afonso

Em resposta a um pedido de informação da agência Lusa, a Museus e Monumentos de Portugal (MMP) explicou que fez uma avaliação ao processo de classificação e determinou que este caducou em setembro de 2021, um ano depois da abertura, porque quem o abriu, a então Direção-Geral do Património Cultural (DGPC), não prolongou o prazo que permitiria continuar o trabalho, como estipula a lei.

 

Citando a lei de bases do património cultural, a MMP diz que "o procedimento de classificação deve ser concluído no prazo máximo de um ano, salvo se o instrutor prorrogar o prazo, o que não se verificou neste caso".

O procedimento de classificação aberto em 2020 contou com apoio técnico do Arquivo Nacional do Som, liderado pelo antropólogo Pedro Félix, que, em declarações à Lusa, explicou que "foram desenvolvidos todos os esforços, até mais esforços do que aqueles que seriam necessários" para conseguir terminar o processo.

"Levámos até às últimas possibilidades do ponto de vista técnico. As tentativas foram muitas e havia informação que era necessário recolher e não foi possível", disse.

O anúncio de abertura do processo de classificação, assinado pelo então subdiretor-geral da DGPC, João Carlos Santos, foi publicado em Diário da República a 02 de setembro de 2020, abrangendo 30 fonogramas da autoria de José Afonso, 18 cópias digitais de 'masters' de produção, cassetes gravadas pelo autor e gravações de entrevistas ao músico.

Trata-se de material "cuja proteção e valorização representam valor cultural de significado para a nação", lê-se no anúncio, sendo que o objetivo seria classificar, pela primeira vez, uma obra fonográfica como um "conjunto de bens móveis de interesse nacional".

Em abril de 2021, a Associação José Afonso pedia ao Ministério da Cultura "prioridade à conclusão" do processo, num momento em que a família de José Afonso anunciava a reedição de 11 álbuns do músico, lançados originalmente entre 1968 e 1981 e que estavam indisponíveis no mercado há vários anos.

Mais de um ano depois da abertura do processo, em novembro de 2021, num novo ponto de situação pedido pela Lusa, a Associação José Afonso afirmava que não tinha havido "nenhum passo em frente" no Ministério da Cultura sobre a classificação.

Nesse mesmo mês, a DGPC dizia à Lusa que "o trabalho de verificação das 'masters' e cópias autênticas" da obra fonográfica já tinha sido concluído e que incluiu contacto com os "diferentes proprietários identificados" e "visitas técnicas de verificação dos bens a classificar".

Em dezembro de 2023, em resposta a um novo pedido da Lusa de atualização sobre o processo, a DGPC explicava que "não se coloca a caducidade do processo pois não foi denunciada a mora" ou atraso.

A direção-geral rejeitou também qualquer ideia de impasse no processo de classificação, justificando que se trata "de um processo particularmente complexo, na medida em que envolve vários detentores, o que acarreta a necessidade de mais tempo para a conclusão do mesmo".

No entanto, admitiu que a rapidez do processo estava comprometida pela "não concordância dos diferentes proprietários" das obras fonográficas, o que impossibilitava a peritagem dos bens.

No final de 2023, por decisão governativa de reestruturação do Património Cultural, a DGPC foi extinta, tendo dado lugar a duas entidades: o instituto público Património Cultural e a empresa pública Museus e Monumentos de Portugal, para a qual transitou, em 2024, o dossier do processo de classificação da obra fonográfica de José Afonso.

Feita a avaliação do processo, a MMP decidiu-se pela caducidade do mesmo.

Sobre a eventual abertura de um novo procedimento de classificação, a MMP disse que "será devidamente avaliada, mediante a necessária identificação e autorização dos detentores dos direitos de autor da obra do artista, uma vez que a mesma não se encontra em domínio público".

O antropólogo Pedro Félix, que lidera a comissão instaladora do Arquivo Nacional do Som, é da opinião que a não classificação "não invalida a qualidade e o mérito da obra que é ou não classificada. O que acresce, e é esse objetivo das classificações, é dar uma outra camada de proteção a um determinado bem".

Para o antropólogo, houve "um certo esvaziamento da premência do processo", porque atualmente é possível comprar os discos do José Afonso, entretanto reeditados.

A decisão de se classificar a obra de José Afonso (1929-1987) surgiu depois de, em 2019, o parlamento ter aprovado um projeto de resolução do PCP, que recomendava ao Governo a classificação como de interesse nacional, com vista à sua reedição e divulgação.

Também a Associação José Afonso tinha reunido mais de 11 mil assinaturas numa petição pública que apelava à mesma decisão.

A família de José Afonso, detentora dos direitos da obra musical, também tinha manifestado o apoio à classificação da obra e recordava que estava a "colaborar diretamente com o Ministério da Cultura, desde 2018", para que se desenvolvesse o processo.

A agência Lusa contactou a família de José Afonso e aguarda ainda um comentário sobre a decisão da MMP.

A MMP remeteu para mais tarde outros esclarecimentos pedidos pela Lusa sobre este processo de classificação.

Leia Também: Novo projeto propõe olhar atual sobre canções de José Afonso

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