A transferência de David Carmo entre Sp. Braga e FC Porto divide opiniões no futebol português. Enquanto os adeptos portistas celebram a chegada de um jogador com talento e maior potencial, há quem coloque vários pontos de interrogação a alíneas importantes do contrato do jogador.
Foi anunciada pelos dois clubes a inclusão de uma cláusula no contrato que prevê o pagamento, por parte do FC Porto ao Sp. Braga, do valor de 500 mil euros por cada título de campeão conquistado pelos azuis e brancos enquanto David Carmo esteja no plantel. Ora, tal cláusula tem causado grande estranheza e debate, com várias vozes a apontarem para um possível caso futuro de favorecimento de terceiros e até de corrupção desportiva.
O Desporto ao Minuto entrou em contacto com Gonçalo Almeida, advogado especialista em direito desportivo, que recusou essa tese e admitiu que este caso poderá ser o ponto de partida para uma revisão dos regulamentos.
"De forma alguma podemos pensar em corrupção desportiva. É verdade que, no âmbito do artigo 28º do Regulamento da Liga, que fala da adulteração da verdade desportiva, essa questão seria perfeitamente exequível, mas apenas em teoria. Seria uma boa altura para uma revisão dos regulamentos, uma reanálise para evitar que este tipo de situações seja possível de ser concretizada", começou por dizer.
O advogado afirmou que a inclusão de cláusulas que prevejam o pagamento de prémios por performance coletiva ou individual é prática comum, mas que o caso é diferente, ou deveria sê-lo, entre clubes da mesma competição.
"Estas cláusulas são mais vistas num contexto mais internacional, ou seja, quando as sociedades desportivas em questão não competem nas mesmas Ligas. O problema que se coloca aqui é precisamente esse, é que as sociedades desportivas em questão competem as mesmas competições e isto suscita, naturalmente, a questão do conflito de interesses. O que é que esta questão pode criar? Vai criar suspeitas, mas, pessoalmente, não tenho dúvidas de que as SADs não agiram de má fé. Não haverá qualquer espécie de conluio entre as partes com o propósito de beneficiar ou prejudicar quem quer que seja. Agora, em teoria, e a bem da verdade desportiva, é preciso acautelar estas situações", acrescentou.
Gonçalo Almeida colocou um cenário em cima da mesa para explicar as dúvidas em torno deste negócio entre FC Porto e Sp. Braga.
"Imagine-se que, nas últimas jornadas da I Liga, o Sp. Braga já alcançou ou está arredada dos objetivos desportivos e joga contra um adversário direto do FC Porto na luta pelo campeonato. Iria, seguramente, haver dúvidas quanto à integridade da competição. Vão ser colocadas dúvidas quanto à boa fé das partes e nisso, como se costuma dizer, não basta ser, é preciso parecer. Neste caso, para a Liga Portugal, para bem da integridade da competição, é importante salvaguardar esta questão e este tipo de cláusulas não ser admissível. Colocando-se este cenário, que, em teoria, é perfeitamente possível que se suceda, alguns adeptos que poderão ser mais emocionais que racionais podem colocar questões a este acordo e importa acautelar esta situação", afirmou.
Apesar de ser reconhecida como eticamente errada e suscitadora de uma adulteração da verdade desportiva, esta cláusula não viola os Regulamentos da Liga, como explicou Gonçalo Almeida.
"Quanto ao ponto de vista estritamente jurídico, se perguntarem se existe alguma norma específica que proíba este tipo de cláusulas, a resposta é perentória: não, não existe. Mas existe, quanto à questão da deturpação da verdade desportiva, o artigo 28.º, que tenta acautelar situações destas. Esta é uma situação que pode, efetivamente, contribuir para essa adulteração, mas teríamos de partir do princípio de que as partes estariam de má fé, o que entendo que não é o caso", reiterou.
O Sp. Braga reagiu publicamente à polémica na segunda-feira, rejeitando qualquer acusação e disponibilizando-se para entrar no debate em torno da venda de David Carmo para o FC Porto a troco de 20 milhões de euros, mais 2,5 milhões dependentes de objetivos.
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