"Enquanto a questão do preço a praticar em sede orçamental com efeito em contrato com a Marinha não for atualizado está em causa a sustentabilidade da empresa", declarou hoje o novo presidente do conselho de administração do Arsenal do Alfeite, S.A., José Luís Serra Rodrigues, ouvido na comissão de Defesa Nacional, no parlamento.
O atual presidente, que assumiu funções em janeiro, mas já fazia parte da administração anterior desde junho de 2020 como vogal, adiantou que foi identificado e quantificado "um desequilíbrio estrutural de exploração, com origem no preço aplicado nos orçamentos de venda à Marinha, sem atualização desde 2009, portanto, início da Arsenal do Alfeite como S.A. [Sociedade Anónima]" que é "completamente desajustado face à estrutura de exploração da empresa".
Para o novo presidente, a resolução dos problemas estruturais do Arsenal terá que passar "obrigatoriamente" pela constituição de uma "comissão de auditoria de preços, de forma a ajustar o desequilíbrio estrutural ao nível da exploração, que lhe provoca naturalmente défices de tesouraria significativos".
"No âmbito quer do contrato de concessão, quer do acordo tripartido, solicitámos que esta comissão de auditoria de preços fosse constituída", adiantou, acrescentando que "estará para breve".
De acordo com o responsável, foi entregue à tutela da Defesa e das Finanças um "plano estratégico 2021-2030" para o estaleiro, que se encontra neste momento "a aguardar avaliação".
Entre as prioridades desse plano está "o reforço de competências e o alargamento da capacitação do estaleiro", o recrutamento de trabalhadores para "especialidades manifestamente deficitárias", a modernização e formação.
"Estará para breve a assinatura do protocolo para a criação da academia do Arsenal, entre a IdD [Plataforma das Indústrias de Defesa Nacionais], o Arsenal do Alfeite, o Consórcio das Escolas de Engenharia e a Associação de Indústrias Navais", adiantou o presidente, que sublinhou ao longo da comissão a importância da formação e retenção de mão-de-obra qualificada para a sustentabilidade da empresa.
Questionado pelo deputado socialista Raúl Castro sobre as dificuldades recentes no pagamento de salários, Serra Gomes admitiu que não tem sido fácil manter a empresa "a flutuar", mas apontou que os salários têm sido pagos, ressalvando que o trabalho é feito "mês a mês" devido às dificuldades de tesouraria conhecidas.
Já quanto ao descongelamento de promoções ou novas contratações, o responsável apontou que, enquanto a situação financeira de tesouraria não se resolver, a administração não abre nenhum concurso "porque isso seria uma irresponsabilidade", apelando à ajuda do ministério das Finanças.
"A tutela financeira tem que resolver este assunto porque a administração também terá muitas dificuldades em continuar em funções neste quadro, porque chega a um ponto em que já não consegue mais", alertou.
Depois de ter sido questionado pelo PSD sobre uma possível abertura do capital da empresa ao mercado, o responsável respondeu que "questões estratégicas competem ao acionista e às tutelas", mas, na sua opinião, "o Arsenal é uma empresa de capitais 100% pública e deve continuar a ser uma empresa 100% na mão do Estado, porque desempenha uma atividade que é crucial com a Marinha portuguesa".
No final da audição, o deputado Carlos Eduardo Reis (PSD) anunciou que o partido vai avançar com um pedido para ouvir na comissão de Defesa um representante do ministério das Finanças, para obter mais esclarecimentos sobre a situação da empresa, esperando a colaboração dos restantes partidos.
Há vários anos que o Arsenal do Alfeite tem passado por dificuldades financeiras graves, que já se traduziram em atrasos de salários e até do subsídio de Natal em 2020 aos mais de 400 trabalhadores que constituem esta empresa, responsável pela reparação e manutenção dos navios da Marinha portuguesa.
A 20 de novembro o ministro da Defesa Nacional remeteu para a administração dos estaleiros navais a resolução da falta de verbas para pagar os subsídios de Natal aos mais de 400 trabalhadores, apontando que a empresa tem um problema financeiro estrutural grave "há cerca de 10 anos".
No mesmo dia, os órgãos representativos dos trabalhadores enviaram um ofício a Gomes Cravinho pedindo a "intervenção urgente da tutela para que, em articulação com a administração, seja encontrada uma solução célere e duradoura para o financiamento desta entidade no curto e médio prazo".