OE2022: Adiamento tem "consequências acomodáveis", dizem especialistas

O adiamento da tomada de posse do Governo prolonga o regime de duodécimos até entrada em vigor do Orçamento, previsivelmente no segundo semestre, com o impacto das medidas como as alterações aos escalões do IRS a chegarem mais tarde.

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Lusa
19/02/2022 09:26 ‧ 19/02/2022 por Lusa

Economia

OE2022

Os especialistas consultados pela Lusa descartam que a manutenção do regime de duodécimos por mais tempo do que o previsto prejudique a gestão do Estado.

Rui Nuno Baleiras, coordenador da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), salienta que o adiamento da entrada em vigor do Orçamento do Estado para 2022 (OE2022) tem "consequências acomodáveis", mas os calendários apontam para uma coincidência temporal da proposta no parlamento com a do Programa de Estabilidade e das Grandes Opções do Plano.

Rogério Fernandes Ferreira, antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, assinala em declarações à Lusa que do lado das receitas a manutenção do regime de duodécimos implicará a impossibilidade de cobrar receitas novas e não previstas no Orçamento do ano anterior, "o que pode ser melhor para os contribuintes se forem criados novos impostos ou aumentarem os impostos já existentes na nova lei a aprovar".

Já na ótica das despesas, recorda, o Governo apenas pode realizar as previstas no Orçamento do ano anterior, não podendo ultrapassar um doze avos em cada mês até à aprovação e entrada em vigor da lei do OE2022, que incorporará as despesas anteriores desde 01 de janeiro.

O fiscalista e sócio da RFF & Associados sublinha que, no que toca às contribuições setoriais, o Governo promoveu a aprovação da lei n.º 99/2021, de 31 de dezembro, a qual manteve em vigor, para o ano de 2022, a contribuição sobre o setor bancário, o adicional de solidariedade sobre o setor bancário, a contribuição extraordinária sobre a indústria farmacêutica, a contribuição extraordinária sobre os fornecedores da indústria de dispositivos médicos do Serviço Nacional de Saúde (SNS), a contribuição extraordinária sobre o setor energético e o adicional em sede de Imposto Único de Circulação (IUC).

O esperado atraso na entrada em vigor no Orçamento do Estado para 2022 (OE2022), que se estima cair para o final do primeiro semestre, adia assim medidas prometidas, como as alterações aos escalões do IRS, que precisam de passar pelo parlamento.

No que toca à atualização extraordinárias das pensões, a ministra de Estado e da Presidência assinalou, esta quinta-feira, a promessa do líder do PS, António Costa, de que parte das medidas terá efeitos retroativos a 01 de janeiro deste ano.

Questionado sobre a capacidade de o Governo poder avançar com o aumento extraordinário de pensões antes do novo Orçamento estar em vigor, Rogério Fernandes Ferreira explica que o Governo, em plenas funções, "poderia, em tese, utilizar, por exemplo, a dotação provisional, prevista para acorrer a despesas imprevistas e inadiáveis".

No entanto, considera que "teria aqui que justificar tratar-se de despesas desta natureza e com estas características", o que, diz o antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, não seria "fácil sem interpretações rigorosas e plausíveis destes conceitos".

Mariana Vieira da Silva salientou que o Governo "fará uma utilização do sistema de duodécimos, aproveitando plenamente as suas capacidades".

Rui Nuno Baleiras acredita que o risco de adiamento da execução de despesa pública é "mínimo", porque "o Governo pode proceder a alterações orçamentais que considere necessárias desde que respeite o teto orçamental do programa orçamental" e a base do Orçamento com o qual o executivo está a trabalhar "é historicamente elevado", acreditando também que a execução dos fundos europeus e do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) não está em risco.

No entanto, o coordenador da UTAO recorda que o Programa de Estabilidade deverá ser entregue até ao dia 15 de abril no parlamento, defendendo que "há argumentação estratégica" a favor de primeiro o país discutir este documento e as Grandes Opções do Plano "e só depois a proposta do Orçamento, por forma a que todos estes instrumentos de programação estejam alinhados e coerentes uns com os outros", uma vez que é "dentro destes dois referencias estratégicos e financeiros que fará sentido encaixar a proposta do OE2022, que é apenas o primeiro ano desta nova legislatura".

Rui Nuno Baleiras sublinha ainda que as alterações na orgânica do Governo assinaladas por António Costa obrigam a que os programas orçamentais também sejam revistos, antecipando como "dificilmente compatível" esse cenário com a apresentação da proposta do OE2022 no parlamento "nos primeiros oito dias de vida do próximo Governo".

Rogério Fernandes Ferreira antecipa ainda que, "mantendo-se as receitas a cobrar as mesmas do ano anterior e as despesas a realizar as que se encontravam também previstas no Orçamento do ano anterior, mas, aqui, apenas em duodécimos, o défice de 2022 poderá ser beneficiado, até porque a inflação previsível, a verificar-se, não está contemplada, nem nas retenções, nem nos escalões aplicáveis durante esta primeira metade do ano e as despesas, por sua vez, estão limitadas a duodécimos".

"Contudo, importará que esta situação seja ultrapassada o quanto antes, uma vez que a política financeira e fiscal deve estar integrada na estratégia de um programa global, de governo, anual, de legislatura e de mais longo prazo, existindo apenas neste momento regimes transitórios", vinca.

A Direção-Geral do Orçamento (DGO) publicou no dia 05 de janeiro as instruções relativas ao Orçamento Transitório para 2022, em que a execução da despesa deve obedecer ao regime de duodécimos.

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