"Eu penso que vivemos claramente um momento decisivo e um momento que não permite desacelerar ou não permite sequer ter outra alternativa que não aquela que a própria Comissão Europeia está a definir, [...] de finalmente Portugal e Espanha poderem ter as interconexões de que necessitam e de que a Europa também necessita", diz o presidente da ADENE, Nelson Lage, em entrevista à Lusa em Bruxelas, numa altura em que a agência portuguesa preside à Rede Europeia de Energia (EnR), composta por 24 agências do espaço europeu.
O responsável sublinha à Lusa que a atual conjuntura de crise energética acentuada pela guerra da Ucrânia "serviu para mostrar que é preciso olhar para dentro" da Europa, pelo que "tudo o que tem sido dito pela Comissão Europeia [...] é no sentido de permitir rapidamente" avançar com as interconexões energéticas.
O presidente da ADENE reconhece que "não será tão rapidamente para dar resposta às necessidades para este inverno", embora afirme esperar que seja possível, "no curto e médio prazo, avançar com este que já foi um grande projeto por várias vezes" e que "não haja sequer a possibilidade de ser travado por qualquer país da União Europeia", como França, que o rejeitou no passado e que agora diz estar favorável à iniciativa.
Questionado pela Lusa sobre prazos, o responsável escusa-se a especificar, mas garante que "Portugal e Espanha têm as infraestruturas necessárias" e "vontade política", sendo "agora "preciso que toda a Europa possa estar também devidamente preparada em termos de infraestruturas".
Além disso, "é preciso que França realmente não bloqueie estas interconexões e que seja alinhada com o resto da Europa na necessidade de haver uma partilha de energia", insiste.
Reconhecendo que os próximos passos vão "depender das negociações que se possam vir a realizar entre os vários governos", Nelson Lage adianta que esta é "uma prioridade que tem que avançar e já não há como contrariar".
E conclui: "Eu sei que é um tema já bastante antigo, mas se queremos ter segurança energética, se queremos ter uma Europa realmente mais unida em termos daquilo que é a sua autossuficiência em termos energéticos, temos de considerar o aumento das interconexões".
O pacote energético RepowerEU apresentado pela Comissão Europeia em meados de maio prevê a aposta neste tipo de interligações ibéricas, esperando Portugal que se avance em projetos já antigos de interconexão com Espanha, para assim chegar ao resto da Europa, quer de eletricidade, como de gás (natural e, futuramente, hidrogénio).
O REPowerEU é o plano divulgado por Bruxelas para aumentar a resiliência energética europeia e tornar a Europa independente dos combustíveis fósseis russos antes de 2030, no seguimento da guerra da Ucrânia e dos problemas no abastecimento.
Na comunicação relativa ao REPowerEU, a Comissão Europeia defende que os atuais preços elevados da eletricidade na Península Ibérica "sublinham a necessidade" de construir interconexões, comprometendo-se a "apoiar e encorajar as autoridades espanholas e francesas a acelerar a implementação dos três projetos de interesse comum existentes através do Grupo de Alto Nível Sudoeste Europeu, com o objetivo de aumentar a capacidade de interligação entre a Península Ibérica e a França".
A ADENE é uma agência pública, sob a tutela do secretário de Estado do Ambiente e da Energia e do Ministério do Ambiente e da Ação Climática, para apoiar políticas públicas em Portugal no setor energético.
A EnR é uma rede voluntária com 24 agências de energia nacionais na Europa, responsáveis pelo planeamento, gestão ou revisão dos programas nacionais, que visa ainda apoiar a tomada de decisões políticas ao nível europeu. Desta rede fazia ainda parte a Rússia, que foi expulsa aquando da invasão da Ucrânia em fevereiro passado.
Leia Também: ADENE realça "potencial grande" de África ser alternativa ao gás russo