Na véspera de um Conselho extraordinário de ministros da Energia, em Bruxelas, no qual se espera que os 27 alcancem um acordo político em torno de uma intervenção de emergência face à escalada dos preços na energia, aprovando um plano de poupança de eletricidade e uma contribuição solidária sobre os lucros excecionais das empresas do setor energético, entre outras medidas propostas este mês por Bruxelas, a comissária Kadri Simson admitiu hoje que também é preciso fazer face ao preço do gás, como têm reclamado uma maioria dos Estados-membros, entre os quais Portugal.
"A Europa enfrenta a chantagem energética da Rússia, e a procura global de gás é mais elevada do que a oferta. Precisamos de trabalhar ao longo de toda a cadeia para enfrentar o desafio. Primeiro, temos de agir no ponto em que o gás entra no nosso mercado. Estamos a negociar com os nossos fornecedores fiáveis de gás de gasoduto. Se isto não trouxer resultados, então é possível um preço máximo", declarou a comissária.
Reforçando que a Rússia não só "não é um parceiro de confiança", como, "na verdade, está na origem do problema", a comissária disse então acreditar firmemente que é necessário "um preço máximo para todas as importações de gás russo, a um nível que ainda assim os torne atrativos para exportar para a Europa".
Antecipando a discussão de sexta-feira, a comissária disse que também serão abordados "os elevados preços da eletricidade com um limite máximo para o gás na formação dos preços da eletricidade", com o objetivo de "amortecer o impacto dos preços elevados do gás nos mercados de eletricidade".
"Este limite tem de ser fixado a um nível tal que não aumente o consumo global de gás. O sinal do preço tem de permanecer. Porquê? Porque se for utilizado mais gás, e comprado num mercado global apertado, isto fará subir ainda mais os preços", argumentou.
Aludindo às propostas apresentadas este mês pela Comissão no quadro de uma intervenção de emergência "para proteger os consumidores dos preços excecionalmente elevados", a comissária sublinhou a importância de gerar "receitas para apoiar as famílias e as empresas a partir dos lucros das empresas que produzem eletricidade a baixo custo [designadamente renováveis] e da contribuição solidária das empresas de combustíveis fósseis", cujos lucros excessivos serão taxados.
"Com base nessa intervenção, estamos agora prontos para introduzir a nível da UE um limite ao preço do gás para a produção de eletricidade. Isto, como sabemos, determina o preço real da eletricidade para os consumidores", concluiu.
Um grupo de 15 Estados-membros, entre os quais Portugal, subscreveram uma carta conjunta dirigida na quarta-feira à comissária Simson, a reclamar um teto para o preço do gás importado - que não apenas da Rússia -, matéria que querem ver discutida no Conselho extraordinário de Energia de sexta-feira.
Bélgica, França, Itália, Espanha, Portugal, Polónia, Grécia, Malta, Lituânia, Letónia, Eslovénia, Eslováquia, Croácia, Roménia e Bulgária pedem ao executivo comunitário que apresente uma proposta para limitar o preço do gás natural, "a ser discutida no Conselho extraordinário da Energia de 30 de setembro, seguida de uma proposta legislativa o mais rapidamente possível".
O Conselho de sexta-feira visa sobretudo um acordo político em torno de um regulamento com medidas de emergência para fazer face à escalada dos preços da eletricidade, na sequência de propostas avançadas já este mês pela Comissão liderada por Ursula von der Leyen.
Essas propostas, em torno das quais parece caminhar-se para um acordo na sexta-feira, segundo fontes europeias, incluem uma taxação de 33% dos lucros excessivos das empresas de combustíveis fósseis, a ser convertida numa "contribuição solidária", um teto máximo para os lucros das empresas produtoras de eletricidade com baixos custos (renováveis), e planos de redução de consumo de eletricidade, voluntária (10% para a procura em geral), e obrigatório (5% nas 'horas de pico').
Contudo, o grupo de 15 países defende que sejam tomadas também sem mais demoras medidas para impor um teto ao preço do gás natural, que classificam como "o problema mais grave de todos", argumentando que tal medida, "solicitada por um número crescente de Estados-membros, é aquela que ajudará cada Estado-membro a mitigar a pressão inflacionista, a gerir expectativas e a providenciar um quadro em caso de potenciais perturbações no fornecimento, assim como a limitar os lucros extraordinários no setor".
Os governos dos 15 Estados-membros dizem "reconhecer os esforços feitos pela Comissão e as medidas que esta apresentou para enfrentar a crise", mas argumentam que é necessário enfrentar "o problema mais grave de todos", impondo um preço máximo ao gás, a todas as transações, e não apenas à "importação a partir de jurisdições específicas", descartando assim a imposição de um preço apenas para o gás importado desde a Rússia, a ideia defendida hoje pela comissária da Energia.
Os países defendem que este 'teto' "pode ser concebido de modo a garantir a segurança do aprovisionamento e o livre fluxo de gás na Europa, ao mesmo tempo que se alcança o objetivo comum de reduzir a procura de gás".
De acordo com os Estados-membros signatários, "este limite é a prioridade e pode ser complementado com propostas para reforçar a supervisão financeira do mercado do gás e desenvolver parâmetros de referência alternativos para a fixação de preços do gás na Europa".
"Face ao acima exposto, nós, os ministros da Energia abaixo-assinados, apelamos a que nos apresentem uma proposta nesse sentido, a ser discutida no Conselho extraordinário da Energia de 30 de setembro, seguida de uma proposta legislativa o mais rapidamente possível", lê-se no final da curta missiva.
Fontes europeias indicaram que o executivo comunitário deverá efetivamente apresentar em breve uma proposta com vista a um limite "dinâmico" para o preço do gás, com várias opções, e que deverá abordar a ideia de uma plataforma de aquisição conjunta de gás, solução defendida há muito por um leque alargado de países, entre os quais Portugal.
A crise no setor energético teve início há já um ano, no outono de 2021, mas foi agravada pela invasão da Ucrânia pela Rússia, país do qual muitos Estados-membros da UE estavam -- e alguns ainda estão -- dependentes para aprovisionamento energético, a nível de combustíveis fósseis.
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