"Tivemos um grande número de choques externos que culminaram nos casos de reestruturação da dívida em que estamos a trabalhar agora, mas os restantes países em África que têm Eurobonds não deverão entrar em Incumprimento Financeiro, acreditamos que isso já passou", disse a gestora de ativos Yvette Babb, da empresa William Blair, em Haia.
Depois da Costa do Marfim e do Benim, a atenção esteve focada no Quénia, onde a transação completada em fevereiro pode abrir caminho para Nigéria e Angola voltarem aos mercados, considerou o economista e gestor de ativos Kaan Nazli, da Neuberger Berman, que considera ainda que a África do Sul pode regressar às emissões de dívida pela primeira vez desde abril de 2022.
Nos últimos dois anos, os países da África subsaariana enfrentavam juros acima dos 10% se quisessem emitir dívida pública nos mercados financeiros internacionais, o que, na prática, os excluía de aceder a financiamento devido ao custo dos juros, que refletem o risco atribuído pelos investidores à operação.
A Costa do Marfim foi o primeiro país a arriscar um regresso aos mercados, logo em janeiro, depois de quase dois anos em que nenhum país abaixo do Sahaara quis emitir dívida, apesar das grandes necessidades financeiras da região.
Abidjan arriscou e acabou por emitir 2,6 mil milhões de dólares, cerca de 2,4 mil milhões de euros, a uma taxa de juro média de 8,5%, tendo recebido ofertas no valor de oito mil milhões de dólares (7,3 mil milhões de euros), e no seguimento desta emissão o Benim arriscou também uma ida aos mercados, pagando 8,3% por uma emissão de 750 milhões de dólares (693 milhões de euros), para a qual teve ofertas de cinco mil milhões de dólares, mais de 4,6 mil milhões de euros.
Apesar de ambos os países terem um 'rating' abaixo da recomendação de investimento da Moody's, os investidores mostraram confiança na capacidade de servir a dívida, o que serviu de incentivo para que o Quénia arriscasse também uma ida aos mercados, não só para emitir nova dívida, mas também para refinanciar dívida antiga que vencia este ano, contribuindo para cumprir a previsão da Goldman Sachs, que estima que os países da África subsaariana emitam cerca de 4,5 mil milhões de dólares, quase 4,2 mil milhões de euros, este ano.
"Depois de o continente ter estado parte do ano passado a transacionar como um mercado em sobre-endividamento, os indicadores de mercado mostram que os receios de outras nações, para além do Gana, Zâmbia e Etiópia, entrarem em 'default' [incumprimento], é uma coisa do passado", escreve a Bloomberg.
O sobre-endividamento registado nos últimos anos resultou, na maioria dos casos, de uma confluência de fatores que incluiu a pandemia de covid-19, a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, as dificuldades na importação de cereais e o aumento das taxas de juro dos bancos centrais, para além um aumento da inflação e uma redução no crescimento económico que se traduziu numa incapacidade de honrar os compromissos financeiros externos.
No entanto, e apesar de as dificuldades continuarem, o sentimento do mercado parece ter-se alterado, para o que também contribuiu o apoio que o Fundo Monetário Internacional (FMI) deu à região, onde metade dos países têm um programa e para onde o Fundo já canalizou mais de 50 mil milhões de dólares, mais de 46 mil milhões de euros, entre 2020 e 2022, mais do dobro do que mobilizou em qualquer década desde os anos 90.
"Sim, há países em África que estão a sofrer com uma grande nível de dívida, mas não é um problema universal, não é uma crise sistémica e é importante que isto seja dito", salientou Kristalina Georgieva num encontro com jornalistas, no início de fevereiro.
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