Trump prometeu taxar em 60% as importações oriundas da China. No seu primeiro mandato, o republicano impôs taxas punitivas de 25% sobre cerca três quartos das exportações do país asiático para os EUA.
Arthur Kroeber, cofundador da Gavekal Dragonomics, unidade de investigação focada na economia chinesa, explicou, no entanto, que as taxas não retiraram à China o papel central nas cadeias de abastecimento. Destacou o redirecionamento dos produtos chineses por países terceiros, a desvalorização da moeda chinesa e a subfaturação dos importadores norte-americanos, como formas de contornar medidas protecionistas.
"Há já um conjunto de estudos que sugerem que as taxas alfandegárias em vigor desde 2018 falharam nos seus objetivos fundamentais", explicou Kroeber, durante um encontro, em Pequim, com correspondentes estrangeiros. "As taxas não alteraram significativamente o défice comercial dos EUA com a China, que é agora maior do que nunca", disse.
Segundo dados oficiais, a quota-parte da China nas importações norte-americanas desceu de 22% para 14%, nos últimos anos.
Mas a investigação da Gavekal Dragonomics demonstrou que isto se deve, sobretudo, ao "comércio triangular", no qual os produtos são exportados quase concluídos da China para outros países, onde é acrescentando um componente ou acabamento, visando alterar o local de fabrico.
Vietname, Tailândia e Camboja representam agora 6% do total das importações dos EUA, em comparação 3,5% antes de Trump ter iniciado a guerra comercial. No mesmo período, as exportações da China para esses países aumentaram acentuadamente.
O aumento das importações dos EUA e o aumento das exportações chinesas verificaram-se nas mesmas categorias de bens, em grande parte maquinaria e eletrónica, destacou a unidade de investigação.
A desvalorização da moeda chinesa, o renminbi, serviu também para amortecer o impacto das taxas. Durante o primeiro mandato de Trump, o renminbi enfraqueceu mais de 12%, em relação ao dólar norte-americano.
"Os exportadores chineses revelaram-se ainda incrivelmente bons a gerirem os seus custos", acrescentou Kroeber. "Temos dados realmente surpreendentes que demonstram como continuam a ter custos baixos em comparação com os exportadores de qualquer outro país".
A análise da Gavekal Dragonomics revelou ainda que a subfaturação realizada pelos importadores norte-americanos contribuiu com aproximadamente 3% para o aparente declínio de 8% na participação da China nas importações dos Estados Unidos.
Segundo dados oficiais divulgados esta semana, as exportações da China para o resto do mundo ultrapassaram em 2024 25 mil milhões de renminbi (3.300 mil milhões de euros) - um valor recorde.
O país passou também a competir nos setores de alto valor acrescentado. A China ultrapassou já o Japão como o maior exportador de automóveis do mundo e concentra grande parte da produção mundial de painéis solares, turbinas eólicas e baterias, essenciais para a transição energética a nível global.
Os fabricantes chineses ocupam ainda uma quota cada vez maior nas importações europeias de produtos industriais avançados, uma área na qual a Alemanha é tradicionalmente líder.
Em causa está um sistema difícil de replicar: a China possui a rede ferroviária de alta velocidade mais extensa do mundo, sete dos 10 maiores portos do planeta, abundante mão-de-obra especializada, um controlo vertical sobre as cadeias de fornecimento - desde o acesso facilitado a matérias-primas, ao fabrico de componentes e à montagem final -, e capacidade para produzir em grande escala.
A exclusão da produção chinesa teria, assim, fortes efeitos inflacionistas nos Estados Unidos.
"Com o agravar das medidas protecionistas, os Estados Unidos também começarão a resvalar", explicou Arthur Kroeber.
"Os chineses farão então o seguinte cálculo: 'isto é difícil para nós, mas também é difícil para vocês'. E qual dos dois é melhor a suportar a dor?'", descreveu.
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