O verão de 2020 vai ser atípico, graças à pandemia de Covid-19 que assola o país e o mundo. Este ano, somos obrigados a manter a distância de segurança de dois metros, na praia, à beira-mar e no banho. Estão também proibidas as atividades desportivas e similares na área balnear das praias, que envolvam duas ou mais pessoas. Muitas coisas estão diferentes, mas há um aspeto que permanece igual: o perigo associado à exposição ao sol.
De facto, a exposição solar é a principal causa dos vários tipos de cancro da pele. Esta e outras questões relacionadas com a doença são explicadas pela Dra. Andreia Chaves, Oncologista no Hospital CUF Descobertas dedicada ao Cancro da Pele, em entrevista ao Lifestyle ao Minuto.
O que é o cancro da pele?
Existem vários tipos de cancro da pele, sendo o Carcinoma Basocelular e o Carcinoma Espinhocelular os mais comuns (cerca de 90% de todas as neoplasias cutâneas). Menos frequente, mas mais 'preocupante', é o Melanoma Maligno que, representando 5 a 10% das neoplasias cutâneas, tem a maior mortalidade (75 a 90% das mortes por cancro cutâneo).
Os dois primeiros são tumores cuja cirurgia é o tratamento de eleição e frequentemente resulta na 'cura'. São tumores caracterizados por apresentarem um crescimento local e raramente provocarem doença à distância (metástases). No caso do Melanoma Maligno, este é um tumor caracteristicamente mais agressivo, cujo tratamento é tanto mais 'eficaz' quanto mais precoce. Nem sempre a cirurgia é suficiente e pode associar-se a doença invasiva e/ou extensa, com necessidade de tratamento sistémico (como é exemplo a conhecida imunoterapia).
Quantos casos existem em Portugal?
No caso dos Carcinomas basocelulares e espinhocelulares são diagnosticados muito frequentemente. Porém, os dados estatísticos são frágeis, não havendo um registo fidedigno dos novos casos no nosso país.
Relativamente ao Melanoma Maligno, diagnosticam-se cerca de 1000 novos casos por ano em Portugal, com uma incidência de 8 a 10 casos por cada 100.000 habitantes.
Como se manifesta?
Numa fase inicial não há sintomas associados à doença, surge um 'sinal novo' na pele ou surgem alterações num sinal já existente, por vezes com anos de evolução. Quando há sintomas, na maioria das vezes, relacionam-se com a 'disseminação' da doença e dependem do órgão envolvido. Podem ser sintomas inespecíficos, como cansaço, fadiga, diminuição do apetite, indisposição ou mau estar, até sintomas mais específicos característicos do envolvimento de órgão. Exemplos disso são a dificuldade em respirar, tosse, enjoo, vómito, dor de cabeça, desequilíbrio, alteração da memória ou do comportamento habitual, entre outros.
Há alguma idade em que seja mais frequente o aparecimento do cancro da pele?
Os Carcinomas Espinhocelular e Basocelular são tumores que surgem mais frequentemente em idades avançadas. O Melanoma Maligno pode surgir em qualquer faixa etária, sendo raro na infância.
A exposição ao sol é a principal causa desta doença? Que outros fatores podem estar na origem do aparecimento deste cancro?
A exposição solar é a principal causa, sendo comum aos três tipos de cancro da pele descritos. No caso dos Carcinomas Espinhocelular e Basocelular, o facto de surgirem habitualmente em idades mais avançadas é consequência da exposição crónica/prolongada ao sol.
A principal causa do aparecimento do Melanoma Maligno reside na exposição solar intensa e intermitente (escaldões). No entanto, outros factores pessoais, sendo exemplo a imunossupressão, ou familiares podem contribuir para o aparecimento da doença.
Como nos podemos proteger?
Alguns dos factores que predispõem para o aparecimento do cancro da pele não conseguimos evitar, nomeadamente os antecedentes pessoais e familiares. No entanto, temos um papel de extrema importância na nossa proteção individual e na educação da população, nomeadamente a população mais jovem. Não há dúvidas que devem ser evitados comportamentos de risco, tais como a exposição solar prolongada ou 'intensa'; evitar as horas em que a luz UV pode ser mais danosa (12 - 16 horas); não frequentar solários e evitar a exposição solar intensa na infância.
Como podemos fazer uma autoavaliação de forma a detetar sinais que nos levem a um especialista?
Na dúvida, o mais recomendado é consultar um médico. Existem algumas características nos sinais às quais devemos estar atentos. Ainda que nem sempre essas alterações sejam fáceis de perceber, o ABCDE, amplamente conhecido, deve estar na atenção de todos.
- D: Diâmetro (> 6mm)
- B: Bordos (irregulares, mal definidos)
- A: Assimetria (o sinal não é simétrico, não se consegue dividir em duas partes iguais)
- C: Cor (heterogénea)
- E: Evolução (sinal com alteração do aspecto ao longo do tempo)
Além das características acima referidas, o aparecimento de prurido (comichão), hemorragia ou ulceração de um sinal deve levantar suspeita dessa lesão e implicar a observação médica. As pessoas de pele e olhos claros, louras ou ruivas, com múltiplos nevos atípicos devem ser observadas regularmente em consulta de Dermatologia.
Em relação aos protetores solares, o que devemos ter em conta no momento da compra e na sua aplicação?
A utilização dos protetores solares isolada dos conselhos acima referidos (evitar a exposição intensa, das 12 às 16 horas, entre outros) não é suficiente, uma vez que nenhum protetor solar confere 100% de protecção contra a radiação UV. Deste modo, e não esquecendo a nota anterior, devemos ter em conta que o protector deve ter factor de proteção solar indicado no rótulo no mínimo 30 ('protecção elevada'). Deve ser aplicado 15 a 30 minutos antes da exposição solar, e deve ser repetida a aplicação regularmente, a cada 2 ou 3 horas, ou após nadar ou transpirar.
O maior erro costuma estar na quantidade de protector solar aplicada, que é habitualmente menor do que deveria ser. A dica da 'colher de chá' é uma estratégia de doseamento muito simples e que permite evitar esse erro: face, cabeça e pescoço precisam de uma colher de chá para cada; dorso e tórax, duas colheres de chá.
Parecem muitas recomendações e alertas mas não podemos esquecer que ainda morrem por mês no nosso país mais de uma dezena de doentes por Melanoma Maligno.
Por isso, e apesar de vivermos numa situação de pandemia, as pessoas devem estar atentas e não devem adiar de forma indefinida a ida ao médico para esclarecer dúvidas. As unidades de saúde já retomaram a sua actividade com o devido reforço das medidas de segurança.