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'Efeito Shakira': "Pode potenciar o medo de ser traído e a desconfiança"

Que impacto têm o fim das relações mediáticas? Como se supera a dor de uma traição? Devemos 'varrer para debaixo do tapete'? No meio de tudo isto, como proteger os filhos? A psicóloga Teresa Feijão responde.

'Efeito Shakira': "Pode potenciar o medo de ser traído e a desconfiança"
Notícias ao Minuto

15:18 - 20/01/23 por Ana Rita Rebelo

Lifestyle Entrevista

E não foram felizes para sempre. Num claro ataque ao ex-marido, o futebolista espanhol Gerard Piqué, de quem Shakira se separou em 2022, a nova música da conhecida cantora colombiana instalou a polémica. Um Ferrari trocado por um Twingo e um relógio Rolex por um Casio. Tudo serve de pretexto para denunciar a infidelidade do ex-futebolista e faz correr muita tinta. 

Quem está de fora analisa a pente fino as indiretas, descobre recados, considerações e, no limite, questiona relacionamentos. No entanto, "é aqui que deve entrar a máxima: 'Só quem está no convento é que sabe o que vai lá dentro'. E lembrar que não há duas relações iguais", defende a psicóloga Teresa Feijão, em entrevista ao Lifestyle ao Minuto. A especialista considera que o mediatismo destes casos  "pode potenciar o medo de ser traído e a desconfiança pelo outro". 

Os homens são tendencialmente mais imaturos, não tendo em conta tão facilmente as consequências dos seus atos e o quão poderão estar a desiludir ou magoar a companheira

Por que se trai? 

De acordo com estudos que se têm feito, a traição pode surgir por algum ou vários destes motivos: por insatisfação geral na relação, nomeadamente por falta de amor pelo companheiro/a e/ou uma atração maior por outra pessoa; monotonia na relação; sentir-se negligenciado/a ou com falta de atenção por parte do companheiro/a; a impulsividade num momento, provocada por álcool (ou afins) ou pelo desafio de uma oportunidade sem preocupação imediata com as consequências; autoestima baixa e procura de elevar a mesma com outra pessoa que o proporcione, contrariamente ao companheiro/a; por vingança/castigo por algo que o/a revoltou com o companheiro/a; ou ainda por insatisfação com a intimidade na relação pode levar mais facilmente a despertar o desejo sexual por outra pessoa.

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E quem trai mais? Homens ou mulheres? 

Os homens são mais infiéis do que as mulheres. Vários estudos e evidências têm comprovado isso.

Mas porquê essa diferença?

O homem é mais visual, as suas emoções e desejos estão ligados à visão. Perante uma 'imagem' atrativa, podem até olhar sem terem consciência disso. Para além de motivos históricos e biológicos, os homens são tendencialmente mais imaturos, não tendo em conta tão facilmente as consequências dos seus atos e o quão poderão estar a desiludir ou magoar a companheira.  Essa falta de empatia pode ter origem numa educação emocionalmente pobre ou inexistente, numa infância com maus tratos ou num passado de relações afetivas traumáticas. A tendência fácil para a manipulação e a mentira é um ponto comum aos homens que traem. Mentem com frequência e em vários contextos - no círculo de amizades, em contexto familiar e nas suas relações de trabalho.  O gosto pelo desafio, a curiosidade pela novidade são outro motivo comum a muitos desses homens, mesmo arriscando destruir a atual relação. A insegurança e a baixa autoestima, em alguns homens pode levá-los mais facilmente a procurar atenção constante e o envolvimento emocional e/ou sexual é apenas um meio de se sentir melhor consigo próprio. 

Do outro lado da moeda, temos as mulheres. A tendência para trair não é comprovadamente tão grande, sobretudo muitas vezes devido às responsabilidades familiares. No entanto, não deixam de ter o mesmo gosto pelo desconhecido e pelo risco e também elas estão muitas vezes descontentes com as relações e com baixa autoestima. São, por norma, mais astutas quando o fazem. 

Se a traição foi pontual e a revelação não acrescentar nada na relação, nas situações em que a separação não é opção, há que evitar provocar mágoa e dor desnecessariamente

Há pessoas que traem, mas que depois não aguentam a culpa. Porquê?

Trair ativa a dopamina, a hormona do prazer, no imediato e há tendência para o repetir para manter a sensação. Contudo, com o tempo, devido essencialmente aos valores éticos violados, pode levar a um progressivo aumento dos níveis de angústia, de ansiedade, negativismo, surgindo a culpa. E o sentimento de culpa por uma infidelidade, quando existe e evolui, é altamente corrosiva ao ponto de poder resultar em depressão, afetando a saúde mental, física, profissional e relacional de quem a sente.

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Existe traição sexual e emocional?

Uma traição que surge pela oportunidade, pelo momento, pela atração física/sexual e apenas se baseia nesses fatores está, por norma, associada a casos únicos ou sequenciais (repetidamente e com pessoas diferentes). Alguns desses casos podem evoluir para um envolvimento emocional que leve à paixão e ao amor. Ambas têm consequências marcantes para o companheiro/a e ambas podem levar ao final da relação traída. 

Há casos em que é preferível omitir? 

Se a traição foi pontual e a revelação não acrescentar nada na relação, nas situações em que a separação não é opção, há que evitar provocar mágoa e dor desnecessariamente. Mais correto será investir na relação, numa postura de transparência e honestidade daí para a frente, procurar ativar a empatia e alimentar a comunicação, de modo a que o sucedido não volte a acontecer.

Como contar uma traição?

Não há uma fórmula mágica para contar uma traição, porque cada casal tem características próprias. O ideal é uma conversa sincera, adulta. Perceber se ambos querem continuar com aquela relação.

O perdão é possível após uma traição? Não deixa consequências irreparáveis? 

Nos primeiros tempos, no caso de uma continuidade, a confiança tem que ser reconquistada. O perdão pode até ser mais imediato, mas a confiança é um processo mais longo. E do lado da pessoa que trai tem que haver compreensão para todas as fases desse processo. 

Considera que pode 'reacender a chama'?

Se ainda existe amor, atração física, companheirismo e partilha de objetivos de vida, pode até haver a possibilidade de a relação renascer mais enriquecida e com maior potencial de futuro. A partir daqui, deverá haver um trabalho contínuo de afetividade, comunicação, estimulação da intimidade sexual e companheirismo, de modo a ser possível avançar sem a culpa constante pelo sucedido vs. superar a mágoa, revolta, tristeza da pessoa traída.

Quais os passos que devem ser dados para superar uma traição? 

Por quem traiu é preciso ter a certeza que não volta a fazê-lo, se quiser continuar a sua relação, e deixar que a culpa não corroa o seu dia-a-dia, tanto como individual ou como casal. Por quem é traído, diria que o mais importante é ter a certeza que quer perdoar e ter em atenção de que esse passo pode requerer um longo processo de voltar a confiar em alguém que traiu a sua confiança. E esse processo não é de um dia para o outro. 

Casos como o do ex-casal Shakira-Piqué podem alterar a nossa perceção sobre os nossos próprios relacionamentos?

Estes casos têm a particularidade de serem discutidos na imprensa e na opinião pública e, muitas vezes, com informações que não são confirmadas pelos próprios e que podem, por isso, não ser verdade. Neste caso em específico, muitas coisas são reveladas nas letras da cantora e percebemos que existe alguma mágoa pelos episódios sucedidos. Este tipo de situações públicas pode potenciar o medo de ser traído e a desconfiança pelo outro. No entanto, é aqui que deve entrar a máxima: 'Só quem está no convento é que sabe o que vai lá dentro'. E lembrar que não há duas relações iguais. 

Em casos de separação/divórcio com filhos envolvidos (...) deve-se  procurar saber o que sentem, dar abertura à expressividade emocional e à comunicação

Tendo em conta o mediatismo das pessoas em questão, expor quem traiu é uma forma de empoderamento? 

No caso da Shakira, ela é uma figura pública, cujas traições que sofreu foram igualmente públicas. Estamos perante um caso de mágoa, orgulho ferido, autoestima afetada, que normalmente quem é traído já sente, mas que no caso dela tudo entra na esfera pública. Expor quem a traiu, além de trazer opiniões diferentes sobre o tema, é uma forma de 'vingança', mas também de se mostrar empoderada, justificada pela forma como ela se sentiu. É claro que tudo isso afeta quem está à volta, sejam os filhos ou outros familiares. 

Quais as consequências do divórcio para os filhos? O que é que se pode fazer para que as crianças saiam emocionalmente ilesas destas situações tão intensas?

Em casos de separação/divórcio com filhos envolvidos, deixo algumas dicas importantes:

  • Conversar com os filhos sobre a separação. Deve-se procurar saber o que sentem, dar abertura à expressividade emocional e à comunicação;
  • Não permitir nem incentivar o corte com um dos progenitores;
  • Tentar manter uma relação cordial com o outro progenitor;
  • Tentar manter as rotinas, para ajudar no trabalho da segurança e equilíbrio emocional;
  • Considerar um eventual apoio psicológico, caso necessário. 

E quando é mediático?

Quando o divórcio ou a traição é mediática, não são só os próprios que sofrem com o assunto, mas também quem está ao seu redor. Atualmente, é impossível esconder das crianças informação que é discutida nas redes sociais e na imprensa. Se os próprios não virem, vão ter amigos ou colegas da escola, ou os pais desses amigos, que viram e que vão, mesmo que inconscientemente, comentar, uma vez que é um tema discutido abertamente na esfera pública. 

Quais os sinais de alarme nas crianças?

Tristeza constante, isolamento, dificuldades escolares, défice de atenção, baixa autoestima, insegurança, ansiedade, comportamentos agressivos e/ou autoagressivos, insónia, anorexia e/ou bulimia, são alguns exemplos de alertas para um eventual recurso a um psicólogo para a criança/jovem.

Depois da separação, como é que se pode promover uma parentalidade positiva?

Não permitir nem incentivar o corte com um dos progenitores. Tentar manter uma relação cordial com o outro progenitor e algumas atividades em conjunto, para que o corte não seja traumático nem repentino. Além de que, se os pais mantiverem uma boa relação, isso é saudável para todos. 

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