Sem tabus. O bê-à-bá dos fetiches e quando podem ser problemáticos

Cada um tem o seu. Mas o que distingue um fetiche de um problema médico que precisa de tratamento? E em casal, o que fazer quando um quer e o outro não? A propósito do Dia Internacional do Fetiche, que se celebra esta sexta-feira, 19 de janeiro, estivemos à conversa com o sexólogo Fernando Mesquita.

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Ana Rita Rebelo
19/01/2024 09:05 ‧ 19/01/2024 por Ana Rita Rebelo

Lifestyle

Entrevista

Há quem sinta prazer com a ideia de ser subjugado pelo parceiro, a vê-lo amarrado e até a cheirar sapatos malcheirosos. Para muitos, estas práticas ainda são um tabu, mirabolantes e doença, mas não há praticamente ninguém que não tenha fetiches e os sexólogos incentivam-os.

A verdade é que quebram a rotina sexual e são uma forma de erotizar. Contudo, passam a ser um problema quando a pessoa se torna refém dos fetiches. Ainda assim, "muitas pessoas podem ter fetiches sem que se enquadrem na perturbação parafílica fetichista, pois aceitam esses fetiches como parte saudável da sua sexualidade, sem problemas ou desconforto significativo", explica o sexólogo Fernando Mesquita, em entrevista ao Lifestyle ao Minuto, a propósito do Dia Internacional do Fetiche, que se assinala esta sexta-feira, 19 de janeiro.

Notícias ao Minuto © Fernando Mesquita

Fetiches e fantasias são coisas diferentes?

Sim. As fantasias sexuais são construções mentais, desejos e sonhos de viver situações especiais, independentemente de se tornarem realidade ou não, sem causar desconforto significativo caso não se concretizem. São exemplos de fantasias sexuais o desejar uma noite romântica à luz das velas, ter encontros sexuais com desconhecidos ou fantasiar sobre relações sexuais em locais públicos ou proibidos.

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É mais correto dizer-se fantasia sexual ou erótica?

A diferença entre fantasia erótica ou sexual depende muito de quem a tem, pois o que pode ser erótico para uma pessoa pode ser sexual para outra.

De onde surgem as fantasias? E o que revelam de nós?

As fantasias sexuais surgem da capacidade criativa de cada um, mas isso não implica que sejam concretizadas. Na verdade, grande parte das pessoas já experimentou fantasias sexuais fora do comum ou consideradas atípicas e nem todas sentem vontade e necessidade de realizá-las. No fundo, as fantasias sexuais não devem ser consideradas como representações de comportamentos reais.

Os fetiches mais comuns são as que contêm jogos de dominação e submissão, múltiplos parceiros e sexo em lugares inusitados

Fantasiar é bom?

As fantasias sexuais são uma parte normal e saudável da vida sexual para muitas pessoas. Fantasiar pode ser uma ferramenta poderosa para adicionar variedade, emoção e criatividade à vida sexual. Pode trazer algum 'picante' à vida sexual e ajudar a aumentar o desejo sexual.

E os fetiches?

Os fetiches vão além. São essenciais para a excitação sexual. São aquela peça exclusiva que intensifica o prazer e cuja excitação sexual depende exclusivamente desse estímulo. Um fetiche é, por exemplo, quando a excitação sexual depende do uso de objetos inanimados, como meias, sapatos, roupa de cabedal ou látex, de dinâmicas sexuais, como jogos de dominação ou submissão, ou de uma fixação altamente específica em partes do corpo que não os genitais, como os pés ou os cabelos.

Há diferenças entre fetiche e parafilia?

Muitas pessoas podem ter fetiches sem que se enquadrem na perturbação parafilica fetichista, pois aceitam esses fetiches como parte saudável da sua sexualidade, sem problemas ou desconforto significativo. 

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Há fetiches recorrentes nos homens e mulheres? 

Variam significativamente de pessoa para pessoa, independentemente do género. Ainda assim, os mais comuns são as que contêm jogos de dominação e submissão, múltiplos parceiros e sexo em lugares inusitados.

As pessoas com mais fetiches têm um maior apetite sexual?

Não existe uma relação direta. Ter fetiches é uma parte normal da diversidade humana e, como tal, podemos encontrar pessoas com fetiches que têm muito desejo sexual, assim como podemos encontrar pessoas com fetiches que têm pouco ou nenhum desejo sexual.

A partilha de fantasias sexuais nos casais pode ser bastante valiosa, mas é crucial considerar que nem todos as pessoas se sentem confortáveis em concretizá-las ou de participar nos fetiches dos parceiros 

O que leva alguém a ter um fetiche por pés ou até por fezes?

A origem dos fetiches é multifatorial, portanto não é possível indicar apenas uma causa para a sua presença. Entre as várias teorias que procuram explicar os fetiches, o condicionamento clássico e a aprendizagem social são as mais conhecidas. Nestas perspetivas, o fetiche poderá ter origem através de uma associação ocasional ou por sugestão pela cultura dominante (filmes, publicidade, etcétera), onde o individuo passa a sentir-se excitado por um estímulo que antes lhe era neutro. Se, a partir daí, passar a utilizar esse estímulo - na sua prática sexual ou em fantasias - para se excitar e masturbar, o fetiche vai-se instalando e ganhando força no guião sexual dessa pessoa. Existem, inclusive, diversos estudos que referem que iniciam-se em regra cedo, na puberdade e início da adolescência, e poderão ter uma determinada carga genética. Por exemplo: quase 20% das pessoas com parafilias têm familiares de primeiro grau que também são parafílicos.

Os fetiches e fantasias são enriquecedoras para um casal ou uma 'armadilha'? O que fazer quando o casal não partilha as mesmas preferências? 

A partilha de fantasias sexuais nos casais pode ser bastante valiosa, mas é crucial considerar que nem todos as pessoas se sentem confortáveis em concretizá-las ou de participar nos fetiches dos parceiros. Respeitar os limites individuais é fundamental para a harmonia na relação amorosa. 

Nos dias que correm, quem tem mais vontade? Eles ou elas? 

Em contexto de terapia sexual, os pedidos de ajuda, em relação à inibição do desejo sexual, estão muito equilibrados entre homens e mulheres. Crenças como 'homem que é homem está sempre pronto para sexo' ou 'uma mulher não deve ter iniciativa sexual' não fazem sentido.

Existem segredos para uma vida sexual gratificante numa relação amorosa de longa data? Que tipo de estratégias é que os casais podem adotar?

O meu conselho é que cada indivíduo explore a sua sexualidade e comunique os seus desejos e necessidades aos respetivos parceiros, para garantir uma experiência sexual positiva e satisfatória. 

Quais são as principais causas para o afastamento de um casal?

Como terapeuta sexual e conjugal, não é raro ouvir casais a acusar a duração da relação amorosa de prejudicar o prazer sexual, especialmente quando se instalou a monotonia e o desinteresse por um ou ambos os elementos do casal. De facto, a ausência de novidade na intimidade pode ser responsável pelo aborrecimento sexual ou pela diminuição de desejo sexual, para muitas pessoas. Além disso, com o passar do tempo, a acumulação das responsabilidades do dia-a-dia e do stress pode levar a uma diminuição do desejo sexual.

Há falta de comunicação entre casais?

As dificuldades comunicacionais são um desafio para muitos casais e podem manifestar-se de várias formas, desde a hesitação em expressar sentimentos até à falta de diálogo sobre questões importantes. Muitas casais chegam à terapia a dizer que falam muito, mas a verdade é que falam muito sobre tudo, mas não falam sobre eles, os seus medos, desejos e necessidades.

Há muita gente a recorrer à terapia sexual? 

Muitos casais olham para a terapia Sexual uma oportunidade para ultrapassar ou aprender a lidar com questões relacionadas à intimidade, desejo sexual, disfunções sexuais, comunicação sexual e outros aspetos da vida sexual. 

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