O consumo regular de canábis, muitas vezes diário, está a preocupar os médicos devido ao impacto que esta substância ilícita pode ter na saúde reprodutiva de mulheres e homens. Para além da sua natureza viciante, "muitos destes consumidores estão em idade fértil e podem, mais tarde, ver diminuir as hipóteses de constituir uma família", alerta Samuel Ribeiro, especialista em ginecologia e obstetrícia, e em medicina da reprodução, num comunicado do IVI Lisboa.
O médico sublinha que o consumo de produtos derivados da canábis pode afetar a fertilidade, tanto masculina como feminina. O uso recreativo da substância ilícita tem sido associado a alterações nas hormonas reprodutivas, no ciclo menstrual e nos parâmetros do sémen. "O uso de canábis em homens também tem sido associado à disfunção erétil, espermatogénese anormal e atrofia testicular. Em mulheres, a exposição a produtos derivados da canábis tem sido associada à infertilidade e à implantação e desenvolvimento anormais do embrião", explica Samuel Ribeiro.
Samuel Ribeiro, especialista em ginecologia e obstetrícia, e em medicina da reprodução© IVI Lisboa
De acordo com dados do V Inquérito Nacional ao Consumo de Substâncias Psicoativas na População Geral, promovido pelo Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências, em 2022,a canábis foi, uma vez mais, a substância ilícita com as maiores prevalências de consumo ao longo da vida e de consumo recente e atual, seja na população total (15-74 anos) seja na população jovem e jovem adulta (15-34 anos).
Leia Também: A pensar na procriação medicamente assistida? Eis tudo o que deve saber
"O facto de os produtos derivados da canábis terem uma elevada prevalência nos jovens adultos e também uma maior taxa de continuidade é preocupante, pois pode hipotecar o futuro destes jovens no papel de pais. É preciso lembrar que o consumo tem impacto na saúde de modo geral, onde se inclui a capacidade reprodutiva", frisa o médico.
E estes efeitos são reversíveis?
No caso dos homens, o sémen tem um ciclo de formação de cerca de 70 dias, pelo que, é preciso ter em conta a redução de eventuais hábitos nocivos, nos três meses que antecedem o início da tentativa de gravidez ou tratamento de reprodução assistida. Quanto às mulheres que consomem regularmente esta droga, é um pouco mais complicado, uma vez queos distúrbios hormonais podem levar à anovulação, ou seja, à ausência de libertação de óvulos. Além disso, afeta as trompas de Falópio, dando mesmo origem à possibilidade de uma gravidez ectópica e a um risco acrescido de aborto espontâneo.
"Ao contrário de outras drogas, a canábis é uma substância relativamente acessível, para além da falsa perceção social de que é menos viciante, pelo que o seu consumo é mais frequente em pessoas em idade reprodutiva. Devemos sempre levar uma vida saudável em todos os sentidos. Mas, se a maternidade ou a paternidade estão entre os nossos projetos, o abuso de substâncias deve estar sempre fora da equação", conclui.
Leia Também: Endometriose. "Um dos mitos é o de que é normal ter dor na menstruação"