A África tem sido até agora relativamente poupada pelo novo coronavírus, com 3,5% dos casos e 4% das mortes registadas oficialmente em todo o mundo, de acordo com o Centro Africano de Controlo e Prevenção de Doenças (África CDC).
No entanto, nesta segunda vaga, a mortalidade está a crescer, tendo já ultrapassado a média mundial, e a generalidade dos países do continente está a ter dificuldades em aceder às vacinas.
Durante a cimeira, que decorre hoje e domingo excecionalmente em formato virtual, os chefes de Estado e de Governo dos 55 Estados-membros da organização deverão ainda abordar os vários conflitos no continente, embora as questões de paz e segurança, que habitualmente ocupam grande parte das cimeiras, tenham este ano menos tempo na agenda.
A cimeira começa hoje com um discurso do Presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, sobre os atuais esforços do continente para lidar com a pandemia e com a passagem da presidência rotativa da organização para a República Democrática do Congo.
No final de janeiro, em Davos, na Suíça, o presidente cessante da UA criticou os países ricos que "monopolizam" as vacinas contra o coronavírus.
A África do Sul é o principal foco da pandemia no continente e representa 40% (1,5 milhões) dos casos detetados em África, mas enquanto Joanesburgo recebeu na segunda-feira o seu primeiro carregamento de vacinas da AstraZeneca e espera vacinar pelo menos 67% dos sul-africanos até ao final do ano, as perspetivas para o continente como um todo são muito mais modestas.
A África precisará de 1,5 mil milhões de doses para vacinar 60% dos seus cerca de 1,3 mil milhões de habitantes para conseguir a imunidade de grupo.
Numa entrevista recente, o presidente da Comissão da UA, Moussa Faki Mahamat, denunciou o "nacionalismo das vacinas" e os "países ricos que se arrogam prioridade a si próprios, alguns até comprando mais do que precisam".
À epidemia juntam-se as preocupações de segurança do continente: os conflitos em Tigray, na Etiópia, sede da UA, e no Sahel são apenas dois exemplos das crises que continuam a assolar África.
"Esperamos que a cimeira seja uma oportunidade para os líderes africanos se reorientarem para uma série de conflitos e crises que foram negligenciados devido à prioridade lógica dada à covid-19 no ano passado", defendeu a investigadora do International Crisis Group (ICG), Imogen Hooper.
Face a este duplo desafio de saúde e segurança, as eleições internas da UA prometem ser decisivas.
Moussa Faki Mahamat, antigo primeiro-ministro e ex-ministro dos Negócios Estrangeiros do Chade, é o único candidato à sua própria sucessão à frente da Comissão, o órgão executivo da União Africana.
Contudo, terá de conseguir dois terços dos votos e ultrapassar as acusações, que rejeita, de "uma cultura de assédio sexual, corrupção e intimidação dentro da comissão", apontou o ICG num recente relatório.
Caso não obtenha os apoios necessários, permitirá à UA abrir o lugar a outros candidatos.
Faki Mahamat destacou recentemente os esforços de prevenção de conflitos durante o seu primeiro mandato de quatro anos, afirmando estar "satisfeito por ver que hoje em dia não há guerra entre países africanos".
No entanto, o Conselho de Paz e Segurança da organização, por exemplo, nunca se pronunciou sobre o conflito entre o governo camaronês e os separatistas das zonas de língua inglesa, ou a ascensão de radicais islâmicos no norte de Moçambique.
Na Etiópia, Faki tinha apelado à cessação das hostilidades entre o governo de Adis Abeba e as autoridades dissidentes na região norte de Tigray pouco depois do início dos combates em novembro.
Mas o primeiro-ministro etíope e Prémio Nobel da Paz de 2019, Abiy Ahmed, recusou qualquer mediação da UA numa operação classificada de "aplicação da lei" abrangida pela soberania do país.
"Isto ilustra como é difícil para a UA influenciar o curso de certas crises. Cada vez que um Estado membro insiste que um conflito é interno, a UA tem tido grande dificuldade em se envolver", acrescentou Imogen Hooper.
A União Africana foi criada a 11 de julho de 2000 para substituir a Organização da Unidade Africana (OUA), fundada a 25 de maio de 1963, e reúne atualmente 55 estados-membros, incluindo os lusófonos Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique e São Tomé e Príncipe.