Um ano depois, África quer evitar tornar-se "continente da covid"

Mais de um ano depois do primeiro caso de covid-19, a pandemia está mais mortal em África e o ritmo da chegada das vacinas faz aumentar receios de que o vírus se torne endémico no continente.

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© Minasse Wondimu Hailu/Anadolu Agency via Getty Images

Lusa
08/03/2021 06:10 ‧ 08/03/2021 por Lusa

Mundo

Covid-19

O primeiro caso de covid-19 em África surgiu no Egito, em 14 de fevereiro de 2020, e a Nigéria foi o primeiro país da África subsaariana a registar casos de infeção, em 28 de fevereiro.

Um ano depois, as mortes associadas à covid-19 em África aumentaram 40% entre janeiro e fevereiro e ultrapassaram as 100 mil, numa altura em que o continente se debate com novas estirpes, mais contagiosas, e está numa corrida para conseguir vacinar população suficiente que evite que o vírus se possa tornar endémico da região.

A taxa de letalidade do vírus continua a aumentar no continente - durante a segunda vaga atingiu os 2,6% acima da média global de 2,2% - apesar da tendência decrescente de novos casos desde o início de janeiro.

Trinta e dois países comunicaram um aumento das mortes entre janeiro e fevereiro e a taxa de mortalidade por covid-19 em África, durante este período, subiu para 3,7% em comparação com os 2,4% no período anterior.

Em fevereiro, globalmente, registou-se uma quebra de 15% dos novos casos, segundo dados do Centro para a Prevenção e Controlo de Doenças da União Africana (África CDC), uma tendência que muda nas regiões da África Central, com um aumento de 14% dos novos casos, e a África Oriental, onda as novas infeções cresceram 7%.

"Estes dados podem indicar o início de uma terceira vaga", alerta o diretor do África CDC, John Nkengasong.

Os países africanos somam quase 4 milhões de casos de covid-19, ou seja, 3,4 por cento do total mundial de casos, e mais de 100 mil mortes, que representam 4% dos óbitos provocados pela doença a nível mundial.

África surge, no entanto, como o segundo continente menos afetado pela pandemia, a seguir à Oceânia, com 264,1 casos por 100 mil habitantes e 67,1 mortes por milhão de habitantes, muito abaixo da média mundial de 1309,5 casos/100 mil habitantes e 283,1 mortes/1 milhão de habitantes, segundo dados da Fundação Robert Schuman.

A América do Norte é a região mais afetada (5058,3 casos/100 mil habitantes e 1082,5 mortes/1 milhão de habitantes) seguida da Europa (4021,7 casos/100 mil habitantes e 931,2 mortes/ 1 milhão de habitantes).

Números que não descansam John Nkengasong, que insiste na necessidade de evitar a todo o custo que África se torne numa zona de covid-19 endémica.

O virologista dos Camarões, que se tornou a cara da luta contra a pandemia de covid-19 em África, não esconde a frustração com os "discursos politicamente corretos" sobre solidariedade e acesso equitativo às vacinas e a incapacidade de os traduzir em ação.

Com meses de atraso relativamente à Europa e aos Estados Unidos, esta semana, vários países africanos começaram a receber as primeiras vacinas ao abrigo do Covax, mecanismo impulsionado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e pela Aliança de Vacinas (GAVI).

Gana, Costa do Marfim, Quénia, Angola, Gâmbia, Ruanda, República Democrática do Congo (RDCongo), Senegal, Nigéria, Lesoto e Sudão receberam as primeiras doses nos últimos dias.

Nkengasong reconhece o "simbolismo" da cooperação e solidariedade global do mecanismo Covax, mas sublinha que "sempre foi muito claro" que este mecanismo só daria a África 20% das vacinas necessárias.

"E não há maneira de nos livrarmos da covid-19 com 20% de vacinação, precisamos de pelo menos 60%. A Europa está a tentar vacinar 80%. Os Estados Unidos estão a tentar vacinar toda a gente. Acabarão de vacinar, imporão restrições de viagem e depois a África tornar-se-á 'o continente da covid'", disse.

Por isso, vários países africanos estão a procurar vacinas através de acordos bilaterais com empresas ou de doações, na maioria dos casos com a empresa farmacêutica estatal chinesa Sinopharm.

O Ruanda, que recebeu dois lotes através do programa da OMS e do Gavi (240.000 doses da AstraZeneca e 102.960 da Pfizer), tinha iniciado já em meados de fevereiro a sua campanha de vacinação após ter adquirido por conta própria cerca de mil doses de vacinas da Moderna e Pfizer.

Na mesma linha, o Senegal recebeu 324.000 doses da AstraZeneca através da Covax, além das 200.000 doses da Sinopharm que permitiram lançar a campanha de imunização em 23 de fevereiro.

Angola tornou-se o primeiro país lusófono a receber vacinas através da Covax, com uma primeira entrega de 624.000 doses, que fazem parte do total de 12,8 milhões previstas.

Além destas, o país iniciou o processo de aquisição de 12 milhões de doses da vacina russa Sputnik V.

A União Africana (UA), por seu lado, assegurou 670 milhões de doses de vacinas a serem distribuídas em 2021 e 2022, e tem também uma oferta da Rússia de 300 milhões de doses da Sputnik V, que estarão disponíveis a partir de maio.

Embora a chegada das vacinas permita acelerar a imunização covid-19 em África, até agora apenas 11 dos 55 Estados-membros da União Africana iniciaram campanhas nacionais de vacinação: Marrocos, Egito, Maurícias, Argélia, Seicheles, Guiné Equatorial, Zimbabué, África do Sul, Senegal, Costa do Marfim e Gana.

A diretora regional da OMS para África, Matshidiso Moeti, estima, ainda assim, que "a maioria dos países africanos tenha os seus programas de vacinação implementados até ao final de março".

Leia Também: África regista mais 215 mortos e 7.119 infetados nas últimas 24 horas

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