"A Comissão Europeia não conseguiu assegurar a finalização atempada da avaliação do impacto da sustentabilidade, nomeadamente antes do fim das negociações comerciais UE-Mercosul. Tal constitui má administração", lê-se nas conclusões do inquérito lançado por Emily O'Reilly no verão passado, na sequência de uma queixa apresentada por vários organizações da sociedade civil, e hoje publicado.
Ainda que reconhecendo as dificuldades de completar uma avaliação atualizada do impacto potencial do acordo - em termos económicos, sociais, de direitos humanos e, sobretudo, em matéria ambiental -, tendo em conta "as dinâmicas imprevisíveis das negociações" e o número de países envolvidos (31), O'Reilly sublinha que a ausência de uma avaliação de impacto é grave e pode ser comprometedora para a própria ratificação do acordo, considerada prioritária pela presidência portuguesa do Conselho da UE.
"A não conclusão da avaliação necessária deixa a UE exposta a críticas, designadamente de que não está a levar a sério todas as preocupações levantadas, o que pode afetar a forma como o acordo é visto, numa altura em que precisa de ser ratificado pelo Parlamento Europeu e por todos os Estados-Membros", observa.
De acordo com a Provedora, "a UE projeta os seus valores através dos seus acordos comerciais" com países terceiros ou outros blocos, e "a conclusão de um acordo comercial antes que o seu potencial impacto tenha sido plenamente avaliado ameaça minar esses valores e a capacidade do público para debater os méritos do acordo", bem como aumenta "o risco de enfraquecer a capacidade do Parlamento Europeu e parlamentos nacionais de debaterem de forma abrangente" o mesmo.
"O acordo comercial UE-Mercosul pode ter implicações profundas, positivas e negativas, para ambas as partes. A Comissão Europeia deveria ter estado em posição de demonstrar que tinha tido plenamente em conta o seu potencial impacto no ambiente e noutras questões antes de o acordo ser alcançado", reforçou a Provedora.
Emily O'Reilly indica a terminar que não emite nenhuma recomendação formal, uma vez que as negociações já foram encerradas e o executivo comunitário deu conta da intenção de publicar a avaliação de impacto e as suas observações antes de apresentar o texto final do acordo comercial para ratificação, mas exortou Bruxelas a fazer o necessário para garantir que acordos comerciais futuros só sejam finalizados após concluídos os estudos de impacto.
Identificado como uma prioridade pela presidência portuguesa, o acordo comercial, alcançado em junho de 2019 entre a UE e os países do Mercosul (Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai), após duas décadas de negociações, está atualmente em fase de tradução e revisão jurídica, finda a qual, com um acordo político dos 27, os países de ambos os blocos deverão ratificá-lo.
No entanto, vários Estados-membros, eurodeputados e organizações da sociedade civil têm manifestado fortes reservas relativamente à ratificação do acordo, por terem preocupações relativas à sua compatibilidade com o cumprimento do Acordo de Paris e com o impacto que terá para o aquecimento global, apontando, entre vários problemas, a desflorestação da Amazónia.
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