Excluídos das eleições em Macau entregam recurso em tribunal

Os candidatos das três listas ligadas à pró-democracia em Macau entregaram hoje recurso no Tribunal de Última Instância (TUI), manifestando esperança na "independência judicial", após terem sido proibidos pela comissão eleitoral de participar nas eleições parlamentares.

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Miguel Mâncio
22/07/2021 14:40 ‧ 22/07/2021 por Miguel Mâncio

Mundo

Macau

"Espero sinceramente que Macau ainda tenha independência judicial, essa é a minha sincera esperança... Para a nossa bela cidade, para a nossa sociedade", afirmou Sulu Sou, o mais jovem deputado de Macau, de 30 anos, cabeça de lista da Associação Novo Macau, que desta vez, juntamente com outros quatro candidatos da associação, viu a sua candidatura ser excluída ao parlamento por não ser "fiel" ao território e por não respeitar a Lei Básica [míni Constituição de Macau].

Para chegar à conclusão de que a lista não era fiel a Macau, explicou Sulu Sou, a polícia utilizou imagens das vigílias em que participaram em memória das vítimas do chamado massacre de Tiananmen e acusaram-nos de "querer derrubar o poder do Estado".

Até este ano, participar nas vigílias de Tiananmen era um ato livre no território, deixando pela primeira de o ser após o Tribunal de Última Instância considerar que a liberdade de reunião não pode admitir "abusos e ofensas sem limites" e de o Governo dizer que violava a segurança nacional.

Segundo o deputado, entre outros motivos para a rejeição da candidatura, foi acusado de "conluio com forças estrangeiras" por ter ido a Paris participar numa reunião com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) relativamente à preservação do património cultural de Macau.

"A conclusão deles é que não defendemos e protegemos a Lei Básica", afirmou, referindo-se à míni Constituição de Macau, que, entre outras, prevê a preservação de liberdades e garantias da população até 2049.

"Isto afetou seriamente a liberdade de expressão em Macau. Nem um deputado pode praticar a liberdade de expressão, quanto mais um cidadão normal", afirmou Sulu Sou, emocionado, lançando ainda um desabafo: "Para ser honesto, nem sei se o que estou a dizer neste momento será utilizado como provas para a polícia".

Também à saída do Tribunal, o líder da Próspero Macau Democrático, o ex-deputado Scott Chiang, que tem ainda como segundo cabeça-de-lista o veterano deputado Ng Kuok Cheong (há cerca de 30 anos na AL), disse aos jornalistas que veio entregar o recurso ao TUI por considerar "imoral julgar o sistema sem tentar dar o benefício da dúvida".

Contudo, referiu que nos últimos anos têm "verificado algumas vezes que a opinião dos tribunais está alinhada com a das autoridades".

"Eles misturam qualquer coisa fora da lei penal e tentam castigar dissidentes e fazem-nos pagar por isso. Tão simples como isso", afirmou Scott Chiang, frisando: "Eles estão a tentar tirar-me os direitos civis, assim como o dos nossos votantes".

Scott Chiang não acredita na reversão da decisão e considerou que "isto não é só sobre eleições, é também sobre a liberdade de imprensa e outras liberdades no geral".

Um pouco mais confiante encontrava-se o ex-deputado e pró-democrata Paul Chan Wai Chi, responsável pela Associação do Progresso de Novo Macau: "De acordo com a Lei Básica de Macau, o sistema judicial é independente", afirmou à Lusa.

"Tenho uma forte esperança que a lei não pode ser manipulada e afetada pela política", sublinhou, acrescentando que "a liberdade de expressão é um direito humano, um valor universal", que não pode ser limitada.

No total, as três listas que hoje recorreram ao TUI albergam 15 candidatos.

Horas antes da entrega dos recursos, o chefe do executivo de Macau afirmou respeitar a decisão da comissão eleitoral, explicando que os nacionais da China devem seguir a lei chinesa, na sequência da exclusão de listas associadas à pró-democracia de concorrerem ao parlamento.

"Respeito a decisão da comissão eleitoral e a independência dos tribunais", afirmou Ho Iat Seng aos jornalistas, numa transmissão vídeo em direto na emissora pública de Macau em língua chinesa.

"Os nacionais chineses deve seguir a lei chinesa, os portugueses devem seguir a lei portuguesa", frisou.

Na terça-feira, em Macau, o embaixador de Portugal na China afirmou que o país o acompanha com "muita atenção" a exclusão de 15 candidatos pró-democracia das próximas eleições.

"Sem dúvida é um assunto seguido com muita atenção em Lisboa, pelas autoridades políticas portuguesas", afirmou José Augusto Duarte aos jornalistas.

A AL é composta por 33 deputados, mas apenas 14 são eleitos por sufrágio universal, sendo 12 escolhidos por sufrágio indireto (através de associações) e sete nomeados pelo chefe do executivo.

A transferência da administração de Macau de Portugal para a China ocorreu no final de 1999, dois anos depois de a China ter recuperado a soberania sobre Hong Kong.

Em ambos os casos, Pequim aplicou o princípio "Um País, Dois Sistemas", que permitiu às duas regiões manterem o sistema capitalista e o modo de vida, incluindo direitos e liberdades de que gozavam as respetivas populações.

Leia Também: Macau. Consulta sobre revisão da lei do jogo avança no segundo semestre

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