"Em relação ao programa Pegasus, para ser honesto, não entendo por que motivo esta questão está a ser divulgada como se vivêssemos na União Soviética. Isto é propaganda ao estilo soviético. Os que o divulgam dessa forma estão equivocados - ouvintes, leitores... - porque todos os Estados têm a obrigação de proteger a segurança do Estado e dos cidadãos do Estado", afirmou Péter Szijjártó, que esteve, na terça-feira, em Lisboa, onde manteve conversações com o seu homólogo português, Augusto Santos Silva.
A cena política húngara caracteriza-se, desde há meses, por vários escândalos, incluindo a alegada utilização do programa informático Pegasus contra opositores ou a construção de uma sede em Budapeste da Universidade Fudan, uma prestigiada instituição de Xangai controlada pelo Partido Comunista da China.
Em paralelo, analistas locais têm referido que, com as medidas anunciadas e acusadas de discriminação contra a comunidade LGBTIQ [lésbicas, 'gays', bissexuais, transgénero, intersexuais e 'queer'], o Governo da Hungria pretende mobilizar os seus eleitores e ocultar outras polémicas, como o alegado uso do programa de espionagem Pegasus contra jornalistas e opositores.
Na perspetiva do ministro Péter Szijjártó, os Estado utilizam os seus serviços de informações como medida de proteção e não ocultam a sua existência.
"Não atuam como se não houvesse [esse sistema]. Por exemplo, na Hungria existem três serviços secretos e, em muitos países, também existem um, dois, três ou mais. E os serviços secretos usam diversas tecnologias. Assim, não entendo a questão sobre se é utilizada uma ou outra tecnologia".
A NSO, a empresa israelita que comercializa o programa informático Pegasus, define-o como uma ferramenta útil utilizada contra o terrorismo e a criminalidade. No entanto, revelações divulgadas em 18 de julho pelo consórcio 'Forbidden Stories' e o 'Security Lab' da Amnistia Internacional, em parceria com 17 órgãos de comunicação social internacionais, indicam outra realidade.
O Pegasus permite controlar um 'smartphone' à distância sem a mínima manipulação do utilizador. Para aceder ao telefone selecionado, apenas será necessário aceder a uma ligação ou abrir um documento, o que torna difícil levantar qualquer suspeita de infiltração. Uma vez introduzido, o Pegasus permite um acesso total ao telefone, possibilitando visualizar deste as trocas de mensagens até ativar à distância o microfone e a câmara.
De acordo com a investigação publicada, de Marrocos à Índia, passando pelo México e sendo a Hungria também referida, 11 países utilizam o Pegasus há vários anos para vigiar em permanência ativistas, jornalistas, advogados e outros membros da sociedade civil. No total, 50.000 números de telefone, repartidos por 50 países, foram alvo deste programa de espionagem.
Uma revelação que o chefe da diplomacia magiar não partilhou.
"Todos os serviços secretos escutam e seguem pessoas que pensam serem perigosas para a sua segurança nacional. E usam diferentes tecnologias. Posso dizer que na Hungria, desde que assumimos o poder, nunca escutámos ou seguimos ninguém de forma ilegal", assegurou.
"O antigo Governo socialista fê-lo, mas não nós", acusou ainda. "Os nossos serviços secretos numa fizeram escutas ou seguiram ninguém pelo facto de ser jornalista ou crítico do Governo. [a decisão de] escutar, seguir, gravar [alguém] não assenta na profissão do visado. Nunca. A única coisa que interessa é que os serviços secretos atuem de acordo com os regulamentos que lhes são dirigidos", explicou.
Numa referência à decisão de abrir em Budapeste uma escola da Universidade Fudan, uma medida também muito criticada nos diversos círculos da oposição, o ministro dos Negócios Estrangeiros húngaro contra-argumentou com a qualidade da instituição.
"É uma das melhores universidades chinesas, considerada uma das melhores do mundo, de acordo com a classificação, tem um forte programa de cooperação com universidades norte-americanas e da Europa ocidental. Se não é um problema que universidades norte-americanas trabalhem em conjunto com a Universidade Fudan, perguntamos por que motivo não podem também estabelecer uma escola em Budapeste", referiu.
"Para nós, a internacionalização do nosso sistema de ensino superior é muito importante e se existe uma universidade de classe mundial que pretende estabelecer uma escola em Budapeste, porque não haveremos de colaborar?", acrescentou.
A insistência de Budapeste junto da União Europeia (UE) sobre a importância da adesão da Sérvia ao clube europeu, também um reflexo das boas relações entre Budapeste e Belgrado, mereceu ainda um comentário de Péter Szijjártó.
"A questão está relacionada com a estabilidade dos Balcãs ocidentais. Em todas as regiões do mundo existe um país chave. Se esse país estiver estabilizado, integrado, terá um impacto muito positivo em toda a região. Nos Balcãs ocidentais é a Sérvia, como, por exemplo, na Europa central é a Polónia. Se a Polónia for integrada e estabilizada, fornecerá estabilidade a toda a região da Europa central", considerou.
Ao definir a Sérvia como "a Polónia dos Balcãs ocidentais", o ministro dos Negócios Estrangeiros húngaro insistiu no impacto que essa medida teria em toda a região.
"Temos uma minoria húngara que é tratada de forma muito decente pela Sérvia, há uma importante ligação entre os dois países, um impacto muito positivo nas relações bilaterais, mas pondo de parte estas relações, a estabilidade dessa região poderá registar uma influência muito positiva através da integração da Sérvia na UE", concluiu.
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