Numa carta de agradecimento dirigida aos "irmãos e irmãs de Cabo Verde", Alex Saab escreve que o Tribunal da Relação de Barlavento decidiu que a sua família recebeu a autorização para estar consigo enquanto permanece em "regime de prisão domiciliária restritiva", pelo que, segundo o mesmo, "não pode haver desculpa para o atraso na emissão do referido visto".
"No caso do visto para a minha família, o governo cabo-verdiano afirma que a sua presença no país 'coloca uma pressão indevida sobre o sistema legal' enquanto a polícia fala de 'preocupações de segurança'", acusa.
Alex Saab não conseguiu visualizar "ameaças concretas", através da sua mulher e das duas filhas (de quatro anos e 18 meses), ao sistema judicial de Cabo Verde.
"É impensável que as autoridades concebam haver da parte delas uma cominação de qualquer espécie, mas é possível que possam projetar, com a visita dos meus entes mais queridos, uma ameaça para a sua consciência e a sua paz de espírito, tendo em conta todas as injustiças que estão e têm estado a cometer contra a minha pessoa e a minha dignidade", salienta.
Desconhecendo as razões para a recusa do visto por parte do governo de Cabo Verde, Alex Saab adianta que "o mais indicado em democracia" seria os governantes partilharem os motivos com os cabo-verdianos.
Por seu turno, o empresário lembra que também o Tribunal da Relação de Barlavento, em 31 de agosto, determinou a sua transferência da Ilha do Sal para a cidade da Praia, uma vez que necessita de "urgentemente de cuidados médicos especializados".
"[...] Sete semanas mais tarde, quase dois meses depois, continuo detido no Sal, enquanto a minha saúde se vai deteriorando de forma gradual e irremediável", alerta.
Para Alex Saab, são "duas decisões judiciais claras e objetivas a que as autoridades políticas e policiais de Cabo Verde contrapõem duas recusas incompreensíveis e absolutamente ilegais, em violação flagrante das ordens do tribunal, quanto ao cumprimento das mesmas".
"Infelizmente, o governo de Ulisses Correia tem um historial comprovado de ignorar decisões vinculativas dos tribunais e recomendações pertinentes das Nações Unidas. Recordo que em 15 e 24 de março do corrente ano, o Tribunal de Justiça da CEDEAO, integrado pela antiga Ministra da Justiça de Cabo Verde, a Juíza Relatora Januária Costa, decidiu que a minha detenção era ilegal, e que eu deveria ser libertado imediatamente", lembra.
Alex Saab escreve ainda que, em 08 e 16 de junho, o Comité dos Direitos Humanos das Nações Unidas, decidiu que o processo da sua extradição "deveria ser suspenso enquanto as investigações sobre tortura e recusa de prestação de cuidados de saúde, acusações" que formulou "contra funcionários cabo-verdianos, deviam decorrer".
Em ambas as situações, segundo Alex Saab, as determinações dos órgãos foram ignoradas, numa "atitude reveladora de um grau de arrogância absolutamente insultuoso por parte do governo, o que é difícil de compreender vindo de uma nação que aderiu a essas organizações internacionais precisamente para ultrapassar a sua pequenez e fazer algo maior, conservando a sua dignidade".
"[...] Com a sua atuação, Cabo Verde, sob a orientação dos Estados Unidos, está a criar um precedente perigoso, dando início a uma prática que potências como a China e a Federação Russa estão a observar e que, tarde ou cedo, poderá produzir um efeito "bumerangue" que afetará tanto os Estados Unidos como Cabo Verde", frisa.
Hoje, o Tribunal Constitucional (TC) de Cabo Verde rejeitou mais dois pedidos da defesa de Alex Saab, considerado pelos Estados Unidos testa-de-ferro do Presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, um dos quais pedia a sua libertação imediata.
Alex Saab, 49 anos, foi detido pela Interpol e pelas autoridades cabo-verdianas em 12 de junho de 2020, durante uma escala técnica no Aeroporto Internacional Amílcar Cabral, ilha do Sal, com base num mandado de captura internacional emitido pelos EUA, numa viagem para o Irão em representação da Venezuela, com passaporte diplomático, enquanto 'enviado especial' do Governo venezuelano.
A sua detenção colocou Cabo Verde no centro de uma disputa entre o regime do Presidente Nicolás Maduro, na Venezuela, que alega as suas funções diplomáticas aquando da detenção, e a Presidência norte-americana, bem como irregularidades no mandado de captura internacional e no processo de detenção.
Washington pediu a sua extradição, acusando-o de branquear 350 milhões de dólares (295 milhões de euros) para pagar atos de corrupção do Presidente venezuelano, através do sistema financeiro norte-americano.
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