"As declarações do chefe de Estado vão no sentido de trazer a paz, saudamo-lo", disse o líder da oposição antes do golpe, Eddie Komboogo, acrescentando que o chefe da junta militar, o tenente-coronel Paul-Henri Sandaogo Damiba "quer ir depressa e bem".
O encontro do novo homem forte do Burkina Faso com os líderes políticos locais demorou cerca de meia hora, e surge depois de, na segunda-feira, a delegação conjunta da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) e das Nações Unidas ter sido também recebida por Damiba.
Para além do líder da oposição, também o presidente do Movimento Popular para o Progresso (MPP), o antigo partido no poder que ainda presidia ao parlamento antes do golpe, esteve presente na reunião no palácio presidencial, mas não quis prestar declarações à saída.
"O nosso dever é garantir o seu sucesso e, como políticos, precisamos que ele confie em nós", disse Alain Zoubga, um antigo associado próximo de Blaise Compaoré, presidente do Burkina Faso de 1987 a 2014, que foi derrubado por uma revolta popular.
"Disseram que estão abertos a todos aqueles que podem contribuir, com base na experiência e competência, e não na filiação em partidos políticos; eles querem ser apolíticos por enquanto", disse Achille Tapsoba, do Congresso para a Democracia e o Progresso (CDP), antigo partido de Blaise Compaoré, em declarações aos jornalistas, citadas pela agência francesa de notícias, a France-Presse (AFP).
Na segunda-feira, a chefe da diplomacia do Gana, que lidera uma delegação internacional que integra representantes da CEDEAO e da ONU, afirmou que a junta militar no poder há uma semana no Burkina Faso está "muito aberta" a discussões, o que é "um bom sinal".
"As discussões foram muito francas. Eles pareciam muito abertos às sugestões e propostas que lhes foram feitas. Para nós, isso é um bom sinal", disse à imprensa a ministra Shirley Ayorkor Botchwey, no final do encontro com o líder dos golpistas, tenente-coronel Paul-Henri Sandaogo Damiba.
A delegação, que integra representantes da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) e da ONU, que chegaram sábado ao Burkina Faso, encontrou-se também na segunda-feira com o Presidente deposto no golpe militar, Roch Marc Christian Kaboré.
Os dois encontros ocorreram no mesmo dia que a junta militar anunciou a restauração da Constituição do país.
Kaboré foi forçado a renunciar ao cargo em 24 de janeiro depois de ser detido pelos golpistas, sendo posteriormente colocado em prisão domiciliária numa moradia em Ouagadougou.
A delegação conjunta da CEDEAO e da ONU é liderada por Shirley Ayorkor Botchway e Annadif Mahamat Saleh, representante especial da ONU para a África Ocidental e o Sahel (Unowas, na sigla em inglês).
Relativamente à restauração da Constituição do país, que tinha sido suspensa na sequência do golpe, o anúncio público foi feito com a leitura de um denominado "Ato Fundamental", em que são divulgadas modificações às instituições do país, que alega vigorarem até ao "estabelecimento de órgãos de transição".
Os militares golpistas, que se autodenominam Movimento Patriótico de Salvaguarda e Restauro (MPSR), "garantem a continuidade do Estado até à constituição de órgãos de transição", segundo um "Ato Fundamental" de 37 artigos lidos na televisão nacional pelo tenente-coronel Cyprien Kaboré.
O líder golpista especificou que "o Ato Fundamental anula a suspensão da Constituição", complementando-a durante o período de transição até ao retorno à ordem constitucional, em data não especificada.
"O MPSR é o órgão central de definição e orientação da política de segurança, económica, social, desenvolvimento e restauração da integridade territorial", lê-se no texto, que explica a composição do MPSR.
A junta no poder é composta por um presidente - tenente-coronel Paul-Henri Sandaogo Damiba -, dois vice-presidentes, um coordenador e comissões, mas mais nenhum nome é mencionado.
O presidente do MPSR é o "Presidente do Faso, chefe de Estado, chefe supremo das forças armadas nacionais", sublinha o artigo 28.º do Ato Fundamental.
O Ato Fundamental garante a independência da justiça e a presunção de inocência, bem como as liberdades fundamentais contidas na Constituição, nomeadamente a liberdade de circulação, a liberdade de expressão e a de imprensa.
A União Africana (UA) suspendeu a participação do Burkina Faso na organização até que a ordem constitucional seja restabelecida no país, após o golpe de Estado de 24 de janeiro, anunciou hoje o Conselho de Paz e Segurança da organização.
"O Conselho decide, em conformidade com todos os instrumentos relevantes da UA [...], suspender a participação do Burkina Faso em todas as atividades da UA, até ao restabelecimento efetivo da ordem constitucional no país", anunciou a organização na rede social Twitter.
A medida segue-se a uma decisão da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) de suspender o país da África Ocidental de todas as suas instituições, após uma cimeira virtual extraordinária que decorreu na sexta-feira.
A CEDEAO - um bloco regional de 15 países - também exigiu a libertação do Presidente do país, Roch Marc Christian Kaboré, deposto pelos autores do golpe de Estado e, alegadamente, detido.
Nenhuma das organizações optou até agora por sanções contra o Burkina Faso, no entanto, a CEDEAO poderá considerar essa hipótese na próxima cimeira, desta vez presencial, marcada para 03 de fevereiro em Acra, capital do Gana, país que detém a presidência rotativa da organização.
Os militares tomaram o poder no Burkina Faso em 24 de janeiro, após um tiroteio intenso em vários quartéis militares, em Ouagadougou e outras cidades, incidentes inicialmente descritos como um alegado motim para exigir melhoria das condições nas Forças Armadas.
O golpe de Estado surgiu depois de uma escalada de manifestações, nos últimos meses, em protesto contra a insegurança no país provocada pela violência dos ataques terroristas.
O Burkina Faso sofre com os ataques terroristas desde 2015, imputados a grupos aliados à Al-Qaida e ao Estado Islâmico, que já causaram mais de 1,5 milhões de deslocados internos, de acordo com o Governo do país.
O golpe de Estado no Burkina Faso é o quarto na região da África Ocidental, após os dois no vizinho Mali (em agosto de 2020 e maio de 2021), um país que também sofre do flagelo do terrorismo, e um na Guiné-Conacri (em setembro de 2021).
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