"Pai, acredite em mim". Desinformação do Kremlin divide famílias

Ucraniano cria plataforma para apelar a pessoas com familiares na Rússia que expliquem o que está a acontecer. Propaganda do Kremlin faz com que russos não acreditem nos próprios filhos.

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Notícias ao Minuto
14/03/2022 11:00 ‧ 14/03/2022 por Notícias ao Minuto

Mundo

Guerra na Ucrânia

Misha Katsurin, um dono de um restaurante ucraniano com família na Rússia, não percebia porque é que o pai não lhe havia ligado a perguntar se estava seguro depois de a guerra ter estalado na Ucrânia. 

Quatro dias depois da invasão, Misha estava confuso com a ausência de preocupação e ligou ao pai, Andrei, acabando por ficar chocado ao perceber que este não acreditava em si. A bolha de propaganda criada pelo Kremlin leva a que os russos vivam submersos nas mentiras que lhes são contadas e muitos não acreditam nos próprios filhos. Misha, de Kyiv, conta isso mesmo. 

Numa publicação, feita no Instagram, o ucraniano relata como contou os detalhes do que estava a acontecer na Ucrânia ao pai e, em resposta, Andrei disse-lhe que isso "eram parvoíces", que "não havia guerra" e que "os russos estavam a salvar os ucranianos dos nazis".

O pai trabalha num mosteiro numa pequena cidade perto de Nizhny Novgorod, na Rússia, e não acreditava que os russos estivessem a bombardear zonas civis na Ucrânia. 

"[Disse-me] que os nazis estavam a fazer escudos humanos de civis. Ele [Andrei] também disse que os soldados russos dão comida e roupas quentes aos soldados ucranianos. O meu próprio pai não acredita em mim, sabendo que estou aqui e vejo tudo com os meus próprios olhos, assim como a minha mãe (sua ex-mulher) que está escondida com a minha avó na casa de banho por causa do bombardeamento", escreve o empresário no Instagram. 

"40% da população da Federação Russa tem Instagram e Facebook. E a maioria também não acredita no que publicamos", explica na mesma publicação feita no Instagram. "São mais de 80 milhões de pessoas que nem têm acesso a informações verdadeiras e têm 100% de certeza de que somos nazis, canibais e escória", acrescenta. 

Sublinhe-se que o Instagram, da gigante tecnológica norte-americana Meta, deixou hoje de estar acessível na Rússia, cujo governo acusou a rede social de espalhar apelos à violência contra os russos devido à invasão da Ucrânia. O mesmo já tinha acontecido com o Facebook, da mesma empresa.

A publicação de Misha rapidamente se tornou viral com mais de 234 mil gostos e centenas de partilhas. 

A revelação de como o povo russo estava desinformado sobre o que estava realmente a acontecer levou Misha a criar uma plataforma: "Pai, acredite em mim". A plataforma tem como objetivo levar pessoas que tenham amigos ou familiares na Rússia a ligar-lhes e explicar o que está realmente a acontecer. 

A plataforma apresenta uma espécie de guia, passo a passo, sobre como falar com amigos ou familiares na Rússia que foram expostos à forte propaganda do Kremlin e, por isso, se mantêm leais ao presidente Vladimir Putin.

"Liguem ao vosso pai, liguem à vossa família e amigos na Rússia. Tentem falar com eles calmamente", lê-se na plataforma criada por Misha que acrescenta que uma conversa não é, habitualmente, suficiente e é preciso manter o contacto.

Os russos vivem numa bolha de propaganda criada pelo Kremlin. Muitos acreditam na tese lançada por Putin de que as tropas russas foram à Ucrânia salvar os ucranianos dos nazis no poder. A informação real, do que se passa, dificilmente chega ao povo russo, levando-os a não acreditar na família e amigos fora do país. 

Numa publicação mais recente no Instagram, Misha explica como os russos foram "enganados por 20 anos", que é "difícil para eles e assustador". 

"Vai ser difícil, eles não vão acreditar em nós, haverá ódio. Mas as mentiras não podem resistir à verdade. Quando a maioria dos parentes acreditar uns nos outros, a guerra terminará", conclui o ucraniano.

O empresário partilha ainda a conversa mais recente que teve com o pai, voltando a tentar explicar-lhe o que está (realmente) a acontecer. 

Leia Também: Ucrânia. Prosseguem bombardeamentos e campanha de desinformação russa

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