O estado de sítio imposto pelo Presidente da República Democrática do Congo (RDCongo), Felix Tshisekedi, em maio de 2021, nas províncias Ituri e Kivu do Norte, no nordeste do país, está a permitir aos agentes estatais levarem a cabo abusos dos direitos humanos "sob o disfarce" -- nos termos do diretor do Gabinete Conjunto das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Abdoul Aziz Thioye, evocado no relatório - daquela lei.
O estado de sítio transfere poderes de autoridades civis para militares, prevê o aumento dos poderes policiais, alarga a jurisdição dos tribunais militares para julgar delitos civis e restringe direitos e liberdades fundamentais, aponta o órgão de diplomacia dos Estados Unidos.
"Questões significativas de direitos humanos incluíram relatórios credíveis de execuções ilegais ou arbitrárias, incluindo execuções extrajudiciais; desaparecimentos forçados; tortura e casos de tratamento ou punição cruel, desumana ou degradante; (...) detenção arbitrária; presos ou detidos políticos; problemas graves com a independência do poder judicial; (...) graves abusos em conflito; (...) tortura e abusos ou castigos físicos (...)". A lista dos abusos identificados no relatório continua e é particularmente extensa.
O texto do Departamento de Estado reconhece que o Governo congolês "tomou algumas medidas para identificar, investigar, processar e punir funcionários que cometeram abusos dos direitos humanos ou se envolveram em corrupção, embora houvesse impunidade para muitos desses abusos".
"As autoridades frequentemente não investigaram, não processaram, nem puniram os responsáveis, particularmente a níveis superiores", denuncia-se no relatório.
Na África do Sul, o país testemunhou em julho do ano passado violentos motins e saques sem precedentes, principalmente nas províncias de KwaZulu-Natal e Gauteng, na sequência da detenção do ex-presidente Jacob Zuma por desrespeito ao Tribunal Constitucional.
De acordo com o então ministro da Presidência sul-africana, Khumbudzo Ntshavheni, evocado no relatório, o número de mortos relacionados com a agitação ascendeu a 337, sendo que nenhuma morte foi atribuída às autoridades sul-africanas.
A Comissão dos Direitos Humanos da África do Sul realizou audições públicas em novembro e dezembro últimos para determinar as causas da agitação e identificar eventuais falhas do Governo em antecipar a violência e mitigar o número de mortes e destruição.
Relativamente ao país, o relatório da Administração norte-americana reconhece a existência de "relatos credíveis" de "mortes ilegais ou arbitrárias por parte do Governo; tortura ou tratamento ou punição cruel, desumana ou degradante por parte do Governo; condições duras e ameaçadoras de vida nas prisões; prisão ou detenção arbitrária; corrupção governamental grave; tráfico de pessoas; crimes envolvendo violência ou ameaças de violência contra lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, esquisitos, ou pessoas intersexuais; e a existência das piores formas de trabalho infantil".
"Embora o Governo tenha investigado, processado e punido alguns funcionários que cometeram abusos dos direitos humanos ou foram acusados de corrupção, houve inúmeros relatos de impunidade", realça-se no texto do Departamento de Estado.
Outro dos países da região com uma lista extensa de violações dos direitos humanos levadas a cabo pelas autoridades oficiais é o Zimbabué. "Houve vários relatos de que o governo ou os seus agentes cometeram assassinatos arbitrários ou ilegais", sublinha-se no relatório.
Ainda que a Constituição zimbabueana proíba a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes, "houve relatos de que a polícia, os serviços secretos civis e militares se envolveram impunemente em tais práticas", regista o texto do Departamento de Estado.
"A impunidade da violência politicamente motivada continuou a ser um problema". O Governo de Harare não estabeleceu um "mecanismo independente de queixas para investigar alegações de conduta imprópria das forças de segurança, tal como exigido na Constituição", aponta-se no relatório, recordando-se que "continuam pendentes investigações sobre a violência de anos anteriores, incluindo a violência patrocinada pelo Estado que resultou na morte de 17 civis em 2019 e de sete civis em violência pós-eleitoral em 2018".
"Grupos de direitos humanos relataram que agentes governamentais perpetraram tortura física e psicológica em líderes sindicais e membros de partidos da oposição nos últimos anos, incluindo agressões sexuais, espancamento de vítimas ou intoxicação química oral", exemplifica o Departamento de Estado norte-americano.
No documento refere-se que "organizações não governamentais (ONG) relataram que forças de segurança raptaram, agrediram e torturaram cidadãos detidos, incluindo agressões e tortura de ativistas da sociedade civil, líderes sindicais, membros da oposição, e outros opositores do Governo".
"Ao longo do ano, a polícia utilizou força excessiva na apreensão, detenção e interrogatório de suspeitos de crime, incluindo o uso de tortura enquanto se encontravam sob custódia policial", acrescenta a Administração norte-americana.
Durante o período de aplicação das medidas de confinamento no âmbito do combate da pandemia de covid-19, por exemplo, "houve relatos de polícias que dispararam contra civis". "A polícia e os militares utilizaram a violência para impor medidas de confinamento da covid-19, para dispersar manifestações pacíficas, e para perturbar o comércio informal", aponta-se no relatório.
Leia Também: Conflito entre milícias faz 14 mortos na RDCongo