Numa altura em que o Presidente da República francesa se encontra numa viagem de Estado ao leste da Europa, e em que poderá deslocar-se até Kiev, as posições dos dois principais adversários nas eleições legislativas têm sido convergentes sobre a postura a adotar face ao conflito.
Depois de, em 06 de junho, o Presidente francês ter dito que não se devia "humilhar" a Rússia, Mélenchon concordou com Macron.
"Acho que é preciso termos cuidado com o que dizemos, e que os franceses devem falar a uma só voz. Se o Presidente Macron fala com o Presidente Putin, eu dou-lhe razão: não devemos deixar que esse homem se feche em si mesmo. Ele precisa de sair da Ucrânia", afirmou Mélenchon numa entrevista à rádio France Inter, em 07 de junho.
No geral, desde a invasão da Ucrânia pela Rússia, Mélenchon tem procurado ser conciliador quanto à questão da Ucrânia. No dia 24, data do início da guerra na Ucrânia, o líder de esquerda tinha denunciado a ofensiva russa, afirmando que "não era aceitável".
"A Rússia do senhor Putin está a provocar um recuo imenso na história do nosso velho continente", tinha dito Mélenchon na altura, apelando a que a "França tomasse a iniciativa" para tentar encontrar soluções diplomáticas para o conflito.
Desde então, o líder da coligação de esquerda afirmou que, desde que Macron começou a tentar encontrar soluções no que se refere ao conflito na Ucrânia, tem procurado não fazer comentários, porque toda a "gente está implicada na história".
"O interesse do país força tanto a um [ao Presidente] como a outro, de não dizermos nada. (...) Isto não é um jogo, por amor de Deus, estamos a dois dedos de uma guerra nuclear", tinha respondido Mélenchon quando interrogado na rádio France Inter sobre o secretismo do Eliseu quanto ao envio de armas para a Ucrânia.
Apesar das posições conciliadoras de Mélenchon, as antigas posições pró-russas do líder da coligação de esquerda continuam a ser 'desenterradas' pela coligação presidencial para denunciar uma "submissão à Rússia".
"Eu vejo no projeto de Jean-Luc Mélenchon ou da senhora Le Pen um projeto de desordem e de submissão. Eles explicam-nos que é preciso deixarmos as nossas alianças, sair da Europa, e estabelecer alianças estratégicas com a Rússia. É a submissão à Rússia", afirmou Macron numa entrevista ao jornal Le Parisien, em 03 de junho.
Em causa, estão posições que Mélenchon tinha assumido antes da invasão da Ucrânia, designadamente quando as tropas russas já se encontravam a rodear a fronteira do país.
A 06 de fevereiro, por exemplo, o líder de esquerda tinha apelado à "redução das tensões" junto da fronteira da Ucrânia, mas tinha considerado que as posições do Presidente russo eram "compreensíveis".
"Não sei como é que nós, franceses, reagiríamos se soubéssemos que o senhor Erdogan [Presidente da Turquia] tinha criado uma aliança para rodear a França. Acho que não ficaríamos muito agradados, por isso acho que a palavra-chave deve ser 'reduzir as tensões'", tinha afirmado.
Uma semana antes, Mélenchon tinha dito que a "ameaça não existia" para a Ucrânia, e considerado que "são os Estados Unidos que estão numa posição agressiva e não a Rússia".
"A Rússia tem interesses próprios e não pode aceitar que a NATO chegue à sua porta. É compreensível: já estava tudo no pacto de Varsóvia", afirmou.
Apesar de, pouco depois da invasão da Rússia, a França ter entrado em plena campanha para as eleições presidenciais, Mélenchon tinha sido 'poupado' pelo campo Macron, que via em Marine Le Pen a sua principal adversária.
Na altura, as suas antigas posições pró-russas tinham-lhe valido críticas sobretudo dos partidos que agora compõem a Nova União Popular Ecológica e Social (NUPES), que lidera: tanto a candidata socialista para as presidenciais, Anne Hidalgo, como o candidato dos Verdes, Yannick Jadot, viram nessas posições uma "complacência" para com o Presidente da Federação russa, Vladimir Putin.
Segundo um estudo divulgado na quarta-feira pelo centro de investigação European Council on Foreign Relations, cerca de 62% dos franceses consideram que a Rússia é o principal responsável pela invasão da Ucrânia, uma percentagem que só é menor em Itália, com 59%.
Em comparação, mais de 80% dos inquiridos em Portugal, na Polónia, Suécia, Finlândia e Grã-Bretanha culpam principalmente a Rússia pela guerra na Ucrânia.
Com Mélenchon a ter definido a sua estratégia de comunicação quanto à guerra na Ucrânia, e apesar das acusações de "submissão à Rússia" por parte de Macron, a coligação presidencial tem, agora, sobretudo procurado estabelecer ligações entre o líder da esquerda e os regimes de extrema-esquerda da América Latina.
"O Jean-Luc Mélenchon é um Chavez gaulês. (...) O seu programa levaria o nosso país diretamente para a falência. (...) Todos os países que implementaram um projeto semelhante -- coletivização dos meios de produção, aumento massivo dos impostos e da carga empresarial -- acabaram por ter de pedir um programa de resgate ao FMI alguns anos mais tarde", afirmou o ministro da Economia, Bruno Le Maire, dando o exemplo de países como a Venezuela, Cuba ou a Argentina.
A segunda volta das eleições legislativas disputa-se a 19 de junho.
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