"O reinício da violência após cinco meses de tréguas está já a afetar as vidas e os meios de subsistência das pessoas vulneráveis, incluindo a distribuição de assistência humanitária vital" nas regiões de Afar, Amhara e Tigray, escreveu o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação dos Assuntos Humanitários (OCHA) num comunicado citado pela agência francesa de notícias, a France-Presse (AFP).
"A última caravana [de ajuda humanitária] a entrar em Tigray antes da perturbação foi em 23 de agosto, constituída por 158 camiões que transportavam ajuda humanitária e equipamento para operações", afirma-se ainda no mais recente relatório do OCHA sobre a situação no norte da Etiópia.
As tréguas em vigor desde o final de março entre as forças governamentais etíopes e os independentistas do Tigray tinham permitido que as caravanas de ajuda, então paradas durante três meses, retomassem a estrada para Tigray.
Desde então, 218 camiões, incluindo 196 que transportavam fertilizantes para a plantação em curso na região, não conseguiu chegar a Mekele, a capital de Tigray, disse o escritório da ONU, não adiantando mais pormenores.
Os voos bissemanais entre Adis Abeba e Mekele do Serviço Aéreo Humanitário da ONU estão parados desde 26 de agosto e em Amhara as operações foram suspensas em algumas zonas de difícil acesso, incluindo a zona administrativa de Wag Hemra, que faz fronteira com o Tigray e tem sido palco de intensos combates nos últimos dias.
"A situação humanitária global na Etiópia continua a ser terrível", disse o OCHA, com mais de 20 milhões de pessoas dependentes da assistência humanitária, devido à guerra no norte, múltiplos conflitos localizados noutras partes do país, seca prolongada no sul e leste e inundações sazonais.
A insegurança alimentar está a agravar-se em todo o país, lê-se ainda no relatório, que aponta que as colheitas sazonais abaixo da média e as previsões de precipitação abaixo do normal para a próxima estação, combinadas com a violência e inundações, deverão agravar ainda mais a situação alimentar.
A guerra no Tigray eclodiu em 04 de novembro de 2020, quando o primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed, enviou o exército federal para o estado no norte do país, com a missão de retirar pela força os dirigentes locais da TPLF que vinham a desafiar a autoridade de Adis Abeba há muitos meses.
O pretexto específico da invasão foi um alegado ataque das forças estaduais a uma base militar federal no Tigray, e a operação foi inicialmente caraterizada por Adis Abeba como uma missão de polícia, que tinha como objetivo restabelecer a ordem constitucional e conduzir perante a justiça os responsáveis pela sua perturbação continuada.
O conflito na Etiópia provocou a morte de vários milhares de pessoas e fez mais de dois milhões de deslocados, deixando ainda centenas de milhares de etíopes em condições de quase fome, de acordo com a ONU.
O reacendimento dos combates esta quarta-feira marca o fim de uma trégua acordada no final de março e até agora respeitada.
As acusações entre o Governo federal e a administração tigray vinham a subir de tom nos últimos dias, com cada uma das partes a apontar à outra a intenção de retomar as hostilidades, apesar de nos últimos meses ambas reiterarem o respetivo compromisso relativamente às negociações, que ainda não começaram.
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