Os protestos pela morte de Mahsa Amini, uma jovem curda de 22 anos, já atingiram os trabalhadores de uma importante plataforma petrolífera em Sanandaj, capital da província do Curdistão iraniano, onde a polícia carregou sobre os manifestantes, ao mesmo tempo que a Amnistia internacional (AI) e o conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca criticaram o uso da violência excessiva.
Alguns trabalhadores de importantes complexos de refinarias juntaram-se aos protestos, associando à agitação numa 'indústria-chave' para a teocracia do Irão, sobretudo hoje, na cidade petrolífera de Abadan, no sul do Irão, havendo já indicações de que as manifestações se prolongarão pelo menos até quarta-feira.
O Governo do Irão insiste que Amini não foi maltratada, mas a família diz que o corpo apresentava hematomas e outros sinais de espancamento.
Vídeos subsequentes mostraram as forças de segurança a espancar e empurrar manifestantes, incluindo mulheres que arrancaram, também como forma de protesto, o véu obrigatório, ou 'hijab'.
As manifestações representam um dos maiores desafios para a teocracia do Irão desde os protestos do Movimento Verde em 2009.
"Há tanta raiva e frustração no país que é difícil imaginar que a atual geração de manifestantes no Irão seria intimidada apenas por o sistema recorrer ao seu tradicional punho de ferro e tentar reprimir os protestos", disse Ali Vaez, um analista que cobre o Irão para o International Crisis Group.
Um vídeo colocado nas redes sociais por um grupo curdo chamado organização Hengaw para os Direitos Humanos mostrou ruas escuras, em que se podiam ouvir trocas de tiros e várias fogueiras a arder em Sanandaj, 400 quilómetros a oeste de Teerão.
Outro vídeo divulgado hoje à tarde mostra grandes buracos provocados por balas numa casa de um residente de Sanandaj, cenário que a Hengaw alegou ter vindo de uma metralhadora pesada de calibre 50 -- o tipo frequentemente utilizado e montado em veículos blindados.
O Centro de Direitos Humanos no Irão, com sede em Nova Iorque, divulgou ainda outro vídeo a mostrar o que descreveu como uma "falange de forças de segurança em motorizadas passando por Sanandaj".
"Quebraram as janelas de centenas de carros no bairro de Baharan", disse fonte do centro.
Amini era curda e a sua morte foi sentida particularmente na região curda do Irão, onde as manifestações começaram a 17 de setembro, no dia do funeral.
A Amnistia Internacional criticou as forças de segurança iranianas por "usar armas de fogo e disparar gás lacrimogéneo indiscriminadamente, inclusivamente em residências particulares" e instou o mundo a pressionar o Irão para acabar com a repressão, numa altura em que as autoridades em Teerão continuam a interromper as redes de internet e telefonia móvel "para esconder seus crimes".
O Irão não reconheceu imediatamente a intensificação da repressão em Sanandaj, mas o Ministério dos Negócios Estrangeiros iraniano convocou o embaixador britânico em Teerão, após Londres ter sancionado membros da polícia de moralidade do país e funcionários de segurança pelo uso excessivo da força.
A diplomacia iraniana considerou as sanções "arbitrárias e infundadas" e ameaçou retaliar.
Jake Sullivan, conselheiro de segurança nacional do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, também já criticou Teerão, sublinhando que "o mundo está a observar o que se está a passar no Irão".
"Os manifestantes são cidadãos iranianos, liderados por mulheres e raparigas que exigem dignidade e direitos básicos. Estamos com eles e responsabilizaremos aqueles que usarem a violência como forma de silenciar as vozes", escreveu Sullivan na rede social Twitter.
Segundo as autoridades iranianas, dezenas de pessoas morreram desde 16 de setembro, incluindo 18 membros das forças de segurança. De acordo com a organização não-governamental Iran Human Rights (IHR), com sede em Oslo, o número de mortes nos confrontos que entretanto se estenderam a todo o país, é de 185.
As autoridades iranianas, que negam qualquer envolvimento da polícia na morte de Mahsa Amini, já prenderam centenas de manifestantes, descritos como "desordeiros".
Na semana passada, a organização de Medicina Forense do Irão disse que a morte de Amini não se deveu a qualquer "golpe na cabeça ou nos órgãos vitais do corpo", mas sim pela "falência de múltiplos órgãos" decorrente de um problema com origem numa patologia anterior, depois de a polícia ter rejeitado as acusações de tortura.
Por sua vez, o líder supremo do Irão, ayatollah Ali Khamenei, acusou os Estados Unidos e Israel de estarem por trás dos "motins".
"Digo explicitamente que esses distúrbios e incidentes de segurança foram planeados pelos Estados Unidos e pelo falso e usurpador regime sionista", afirmou Khamenei, aludindo a Israel.
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