Resistir à Rússia na Ucrânia significa celebrar o Natal a 25 de dezembro

Alguns ucranianos ortodoxos decidiram celebrar este ano o Natal em 25 de dezembro, em vez de 07 de janeiro, como era habitual e como fazem os russos, numa decisão que dizem estar ligada à guerra.

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Lusa
25/12/2022 15:37 ‧ 25/12/2022 por Lusa

Mundo

Guerra na Ucrânia

A ideia de comemorar o nascimento de Jesus em dezembro era considerada radical na Ucrânia até há pouco tempo, mas a invasão da Rússia, lançada em 24 de fevereiro deste ano, mudou muitos corações e mentes, segundo a agência norte-americana AP.

Em outubro, a liderança da Igreja Ortodoxa da Ucrânia, que não está alinhada com a igreja russa e um dos dois ramos do cristianismo ortodoxo no país, concordou em permitir que os fiéis celebrassem o Natal em 25 de dezembro.

A escolha tem claros tons políticos e religiosos numa nação com igrejas ortodoxas rivais e onde ligeiras revisões aos rituais podem ter um forte significado numa guerra cultural que decorre paralelamente à guerra militar.

Para algumas pessoas, a mudança de datas representa uma separação da Rússia, da sua cultura, e da religião.

As pessoas de uma aldeia nos arredores de Kyiv votaram recentemente sobre a celebração do Natal.

"O que começou em 24 de fevereiro, a invasão em grande escala, é um despertar e um entendimento de que já não podemos fazer parte do mundo russo", disse à AP Olena Paliy, uma residente de Bobrytsia, de 33 anos.

A Igreja Ortodoxa Russa, que reclama a soberania sobre a ortodoxia na Ucrânia, e algumas outras igrejas ortodoxas orientais continuam a utilizar o antigo calendário juliano.

O Natal cai 13 dias mais tarde nesse calendário, em 07 de janeiro, do que no calendário gregoriano utilizado pela maioria das igrejas e grupos seculares.

A Igreja Católica adotou pela primeira vez o calendário gregoriano moderno, mais astronomicamente preciso, no século XVI, e os protestantes e algumas igrejas ortodoxas têm, desde então, alinhado os seus próprios calendários para efeitos de cálculo do Natal.

O Sínodo da Igreja Ortodoxa da Ucrânia decretou, em outubro, que os reitores da igreja local podiam escolher a data juntamente com as suas comunidades, alegando que a decisão se seguia a anos de discussão, embora também tenha resultado das circunstâncias da guerra.

Em Bobrytsia, alguns membros da fé promoveram a mudança no seio da igreja local, que recentemente passou a fazer parte da Igreja Ortodoxa da Ucrânia, sem quaisquer ligações à Rússia.

Quando foi realizada uma votação na semana passada, 200 das 204 pessoas votaram em 25 de dezembro como o novo dia para celebrar o Natal.

"Este é um grande passo, porque nunca na nossa História tivemos as mesmas datas de celebração do Natal na Ucrânia que todo o mundo cristão", disse Roman Ivanenko, um funcionário público em Bobrytsia e um dos promotores da mudança.

"Todo o tempo estivemos separados", disse Ivanenko, referindo que, com a mudança, estão "a quebrar a ligação" com os russos.

Como em toda a região de Kyiv, a manhã de hoje em Bobrytsia começou com o som das sirenes a alertar para possíveis bombardeamentos, mas isso não impediu que as pessoas se reunissem na igreja para assistir pela primeira vez a uma missa de Natal em 25 de dezembro.

No final, não foram relatados ataques na capital.

"Nenhum inimigo pode tirar o feriado, porque o feriado nasce na alma", disse o reverendo Rostyslav Korchak na sua homilia, durante a qual usou as palavras "guerra", "soldados" e "maldade" mais do que "Jesus Cristo".

Anna Nezenko, 65 anos, frequentou a igreja em Bobrytsia em cada Natal desde que o edifício foi inaugurado em 2000, embora sempre em 07 de janeiro.

Disse à reportagem da AP que não se sentia estranha ao fazê-lo hoje.

"O mais importante é o Deus que nasce no coração", afirmou.

Em 2019, o patriarca ecuménico Bartolomeu, líder espiritual da Igreja Ortodoxa Oriental, concedeu total independência à Igreja Ortodoxa da Ucrânia.

Os ucranianos que favoreceram o reconhecimento de uma igreja nacional em conjunto com a independência política da Ucrânia em relação à antiga União Soviética há muito que procuravam essa aprovação.

A Igreja Ortodoxa Russa e o seu líder, o patriarca Cirilo, protestaram ferozmente contra a iniciativa, dizendo que a Ucrânia não se encontrava sob a jurisdição de Bartolomeu.

O outro ramo importante da ortodoxia no país, a Igreja Ortodoxa Ucraniana, permaneceu leal a Moscovo até ao início da guerra.

Declarou a independência em maio, três meses depois do início da guerra, embora permaneça sob escrutínio governamental.

Esta igreja tem tradicionalmente celebrado o Natal em 07 de janeiro.

Leia Também: Putin diz que Rússia está pronta para negociar e que recusa é da Ucrânia

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