"Só havia água à nossa volta e tivemos de nos abrigar na Cerâmica", unidade industrial local, "sem comida, nem água", naquelas que foram as 24 horas mais angustiantes da sua vida, com as águas a subirem.
As crianças pediam comida, "mas eu só dizia para aguentarem. E aguentámos", sublinha, depois de ter sido salva e observada juntamente com os bebés por uma equipa móvel da Cruz Vermelha de Moçambique, que rastreia quem sai dos barcos.
Mais de 300 pessoas foram resgatadas hoje por embarcações das autoridades, empresas e particulares que as têm retirado de árvores, coberturas de casas ou pedaços de terra que ficaram como ilhas -- numa ação em que outros participam com equipamento de mergulho e outros ainda com motos de água para reconhecimento.
Entre os resgatados há muitas crianças, algumas sem a companhia de adultos, relatam os voluntários que formaram uma espécie de base improvisada no local onde a estrada Maputo -- Boane está cortada, 25 quilómetros a sudoeste da capital moçambicana.
O rio Umbeluzi transbordou com a chuva intensa de três dias (choveu tanto como o que se previa para todo o mês de fevereiro) e com as descargas dos países vizinhos, formando um lençol de água de perder de vista que se estende por cima do que eram casas, campos agrícolas e pavilhões.
Muitas pessoas não acreditavam que as águas subissem tão rápido, como Isselda Nhantumbo, 25 anos, estudante em Boane, a vila agora praticamente sitiada.
Juntamente com as colegas só tiveram tempo de "subir para o edifício da secretaria" do instituto de formação onde se encontravam, porque pensavam "que era uma chuva normal, que ia passar logo".
"Ainda há relato de pessoas isoladas", conta Gaudência Simbine, uma das voluntárias, residente há 12 anos em Belo Horizonte, nas imediações, e que diz que aquela é uma zona de cheias em cada época chuvosa, mas nunca com estas dimensões.
Gaudência e muitos outros contam voltar no domingo porque apesar de acreditarem que os casos mais críticos estão a salvo, sabem que há ainda pessoas a precisar de ajuda, sem alimentos e incomunicáveis em locais onde as águas vão levar vários dias a descer.
As cheias na região de Maputo já fizeram, pelo menos, quatro mortes - número oficial declarado na quarta-feira e que se mantém inalterado - e afetaram cerca de 13.000 pessoas em vários locais, com casas e terrenos perdidos ou outros prejuízos, segundo dados do Instituto Nacional de Gestão de Desastres (INGD).
Há centros de acomodação montados para os quais estão a ser transportadas as pessoas que estão desalojadas ou são resgatadas em operação como a que está em curso em Boane.
Leia Também: Lula quer visitar Angola, Moçambique e África do Sul para reatar relações