Migrações. Meloni e Piantedosi culpam vítimas por naufrágio em Itália

Os Médicos Sem Fronteiras (MSF) classificaram hoje as declarações da primeira-ministra e do ministro do Interior italianos como uma "chapada na cara" dos migrantes, ao insinuarem que estes foram responsáveis pela própria tragédia, por embarcarem numa viagem tão perigosa.

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Lusa
27/02/2023 17:26 ‧ 27/02/2023 por Lusa

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Naufrágio

Giorgia Meloni e Matteo Piantedosi referiam-se aos migrantes cuja embarcação naufragou no domingo no mar Mediterrâneo, ao largo da Calábria, no sul de Itália, quando tentavam alcançar o país, fazendo pelo menos 62 mortos.

A Organização Internacional para as Migrações (OIM) estimou hoje que o número de vítimas mortais do naufrágio seja cerca de uma centena, já que, segundo os depoimentos dos sobreviventes, 180 pessoas viajavam no barco, e os números até agora conhecidos apontam para 82 sobreviventes localizados e 62 corpos recuperados.

"Digo isto com o devido respeito pelas vítimas, com pesar pelo que aconteceu e também com a firme intenção, como pedido pela primeira-ministra Meloni, de não especular sobre estas tragédias. Mas não podemos deixar de afirmar com indignação que as primeiras declarações da primeira-ministra Meloni e do ministro Piantedosi são pouco mais que um jogo de atribuição de culpas, mais uma chapada na cara das vítimas e dos sobreviventes desta tragédia", sustentou Marco Bertotto, diretor dos programas da MSF Itália, numa conferência de imprensa sobre o naufrágio ao largo de Crotone, na Calábria.

"O desespero nunca pode justificar condições de viagem que ponham em perigo a vida dos nossos filhos", disse Piantedosi a propósito do naufrágio.

Já Meloni declarou: "A atuação daqueles que hoje especulam sobre estas mortes, depois de terem exaltado a ilusão de uma imigração sem regras, comenta-se a si mesma".

E acrescentou que o Governo "está empenhado em impedir as partidas [destas embarcações] e, assim, a consumação destas tragédias, e continuará a fazê-lo, primeiro que tudo exigindo a máxima cooperação aos Estados de partida e de origem".

O Governo italiano tem tentado impedir organizações não-governamentais (ONG) como a MSF de salvar vidas no Mediterrâneo, afirmando que elas são um fator que atrai migrantes.

Também definiu como portos de entrada os mais distantes dos pontos de busca e resgate de migrantes no mar e impôs um código de conduta determinando que os barcos de salvamento só podem resgatar os migrantes de uma embarcação de cada vez, com multas pesadas em caso de incumprimento -- o que desencadeou muitas críticas, incluindo da ONU e do Conselho da Europa.

O navio 'Geo Barents', administrado pela MSF, tornou-se a primeira embarcação a ser punida ao abrigo do novo diploma do Governo italiano que regula as atividades dos barcos de salvamento operados por ONG no Mediterrâneo.

O navio foi proibido de navegar durante 20 dias e os seus operadores foram multados em 10.000 euros, por alegadamente não terem fornecido às autoridades italianas toda a informação que por estas lhes tinha sido exigida.

A notificação da multa foi emitida na passada quinta-feira, depois de 48 requerentes de asilo terem desembarcado do navio em Ancona, a 17 de fevereiro, e a MSF está a considerar recorrer da penalização.

Também a organização de defesa dos direitos humanos Amnistia Internacional (AI) reagiu hoje à tragédia e à atuação do Governo italiano, defendendo que as mortes no mar devem desencadear medidas para garantir rotas legais e seguras de chegada dos migrantes à Europa.

"A dor e o horror sentidos por todos nós perante estas trágicas mortes devem ser canalizados para a ação pelos Governos europeus, que devem assegurar que existem rotas seguras e legais para as pessoas chegarem à União Europeia (UE)", declarou a diretora de defesa da AI para a Europa, Eve Geddie.

"Quantas mais vidas terão de ser perdidas até que os legisladores europeus vejam que bloquear rotas seguras e legais e criminalizar as equipas de salvamento não impede as pessoas de fazerem tais viagens -- apenas as torna ainda mais perigosas", questionou.

Segundo a responsável da Amnistia, "em vez de tornar as fronteiras europeias ainda mais hostis, expulsando as pessoas e criminalizando os socorristas das ONG que tentam salvar vidas no mar, os Governos europeus deveriam concentrar-se em garantir passagem segura aos migrantes".

Itália é abrangida pela chamada rota do Mediterrâneo Central, uma das rotas migratórias mais mortais, que sai da Líbia, Argélia e da Tunísia em direção à Europa, nomeadamente aos territórios italiano e maltês.

Leia Também: OIM estima que tenham morrido 100 pessoas no naufrágio em Itália

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