"Tem muita terra indígena que não está demarcada. Vou falar com o Presidente Lula para ele agilizar demarcação de terras indígenas", afirmou o cacique Raoni Metuktire, líder indígena brasileiro da etnia caiapó, que em 01 de janeiro, num ato simbólico, subiu a rampa do Planalto no dia em que Lula da Silva tomou posse como Presidente do Brasil.
"Você precisa defender este território para não deixar o garimpeiro entrar", frisou, ao lado do Presidente brasileiro, durante um discurso, em Brasília, no encerramento da 19.ª edição do Acampamento Terra Livre, montado nos jardins da Esplanada dos Ministérios, avenida central onde estão localizadas todas as sedes do poder público.
O cacique de 93 anos pediu ainda a Luiz Inácio Lula da Silva que se oponha ao chamado Marco Temporal, iniciativa promovida pela direita brasileira que propõe reconhecer como terras indígenas apenas aquelas que eram ocupadas pelos povos originários em 1988, quando a atual Constituição foi promulgada.
"Centenas de anos antes da Constituição, nós já existíamos", disse Raoni. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) já anunciou uma nova mobilização nacional, de 05 a 09 de junho, em Brasília, contra o Marco Temporal -- cuja retoma do julgamento está prevista para 07 de junho.
Akawana, uma mulher de 22 anos, do povo Pataxó, no extremo sul do estado da Bahia, contou à Lusa que a luta pela demarcação das terras não vai parar, prometendo cobrar a promessa ao Presidente brasileiro.
"A nossa luta não é só nossa, é de todos", afirmou, enquanto empunhava um cartaz onde se lia "Auto-demarcação não é invasão, demarcação já!".
Com a mesma tónica, Ewésh Waurá, do povo Yawalapiti, no estado brasileiro do Mato Gross, recordou à Lusa que são os povos originários que cuidam "dos biomas que são de todos".
De regresso ao Brasil, na sua primeira aparição pública após a visita de Estado a Portugal e Espanha, Lula da Silva garantiu demarcar o "maior número possível de terras indígenas" durante os próximos quatro anos.
Ovacionado pelos milhares de indígenas presentes, ao som de "Lula Lá", o Presidente brasileiro pediu aos povos originários para que "não deixem de brigar, não deixem de se organizar".
"Onde me encontrarem, me cobrem. O Governo existe para defender interesses do povo e não de uma pequena elite brasileira", frisou.
Lula da Silva disse ainda que os povos originários devem rebater as críticas de que ocupam demasiado território brasileiro.
"Quando dizem que vocês ocupam 14% do território nacional e dizem que é muita terra, vocês precisam dizer que antes de os portugueses chegarem aqui vocês ocupavam 100% do território nacional", sublinhou o Presidente do Brasil.
Depois do discurso, Gabriel Vilardi, um funcionário do Conselho Indigenista Missionário, organismo de trabalho da igreja católica junto aos povos indígenas, afirmou à Lusa estar contente com as mudanças que já se sentiram com a derrota de Jair Bolsonaro e com a chegada de Lula da Silva ao poder.
Além das anunciadas seis demarcações de terra, Gabriel Vilardi fala da importância de haver um Ministério dos Povos Indígenas, pela primeira vez e comandado por Sônia Guajajara, influente líder indígena brasileira, mas também pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), ser chefiada por Joênia Wapichana, a primeira mulher indígena a ocupar o cargo.
Ainda assim, Gabriel Vilardi teme que exista uma "desmobilização da luta" com estas "pequenas vitórias".
Por essa razão, o missionário pede que os líderes indígenas continuem "vigilantes".
"O futuro indígena é hoje, sem demarcação, não há democracia", afirmou Vilardi, copiando o 'slogan' deste ano do Acampamento Terra Livre, numa alusão aos cerca de 200 territórios reivindicados pelos povos indígenas que aguardam demarcação.
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