Os juízes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) concluíram o julgamento que impede o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro de concorrer a eleições para cargos políticos nos próximos oito anos.
O ex-chefe de Estado brasileiro foi condenado por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação ao realizar uma reunião com embaixadores estrangeiros durante a campanha presidencial a que concorreu, e perdeu, para Luiz Inácio Lula da Silva.
Após a quarta sessão do julgamento que começou em 22 de junho, cinco juízes do TSE votaram pela inelegibilidade de Jair Bolsonaro e dois votaram contra.
Em julgamento estava também Walter Braga Netto, candidato de Bolsonaro a vice-presidente, tendo sido ilibado.
Alexandre de Moraes, presidente do TSE e juiz do Supremo Tribunal Federal que tem em mãos vários casos relativos à tentativa de golpe de Estado em Brasília, foi o último a votar, com um discurso contundente contra Jair Bolsonaro.
Recursos públicos, transmissão ao vivo, "fartos ataques à justiça eleitoral", "replicação de notícias fraudulentas" com a intenção de "influenciar e convencer o eleitor de que estaria sendo vítima de uma grande conspiração do poder judiciário", começou por dizer o presidente do TSE.
"Toda s produção foi feita para que a TV Brasil divulgasse e a máquina existente de desinformação multiplicasse a desinformação para chegar ao eleitorado", denunciou o juiz.
O TSE, frisou, demonstrou hoje "repulsa ao degradante populismo renascido das chamas dos discursos de ódio, antidemocráticos, que propagam infame desinformação produzida, por verdadeiros milicianos digitais", reafirmando a "fé na democracia e no Estado de Direito".
Na reunião com embaixadores, disse Alexandre de Moraes, Jair Bolsonaro "não proferiu opiniões, foram declarações fraudulentas". O juiz foi utilizando a palavra "mentira" várias vezes enquanto analisava as declarações de Bolsonaro durante essa reunião. "Não há aqui nada de liberdade de expressão", sublinhou.
"Liberdade de expressão não é ataque à democracia", vincou.
A juíza Cármen Lucia, chamando quase sempre Jair Bolsonaro de "primeiro investigado", afirmou hoje que o ex-presidente brasileiro procurou "desqualificar a justiça eleitoral" e "urnas eletrónicas", com "alegações feitas sem provas".
Já o juiz Nunes Marques não acompanhou o voto da maioria e votou ao lado do juiz Raul Araújo que, na quinta-feira, afirmou que "numa democracia não há de ter limites ao direito fundamental à dúvida", justificando a votação contra, acrescentando que "cada cidadão é livre para duvidar".
Na quinta-feira, o juiz Floriano de Azevedo Marques considerou que Jair Bolsonaro "usou das suas competências de chefe de Estado" para ganhos políticos, num "claro discurso eleitoral".
O magistrado André Ramos Tavares frisou que Bolsonaro fez "ataques infundados e mentiras", manipulou "a realidade", fazendo ainda "inequívocos ataques" a partidos, candidatos e juízes das mais altas instâncias do país.
"Não é possível fechar os olhos para os efeitos antidemocráticos de discursos violentos e de mentiras que colocam em xeque a credibilidade da justiça eleitoral", salientou, na terça-feira, o primeiro a votar, o juiz e relator da ação Benedito Gonçalves.
Em causa estava uma reunião que o então chefe de Estado brasileiro organizou, em plena campanha eleitoral, com embaixadores estrangeiros no Palácio da Alvorada, casa oficial do Presidente em Brasília, em 18 de julho de 2022.
Nesta reunião, que foi transmitida pela televisão estatal TV Brasil e nas redes sociais, o então Presidente lançou vários ataques infundados sobre a fiabilidade do processo eleitoral e, mais precisamente, das urnas eletrónicas, utilizadas desde 1996 e validadas por vários organismos internacionais, e as mesmas que o elegeram para vários mandatos enquanto deputado federal e para Presidente.
Bolsonaro, perante dezenas de embaixadores de vários países, incluindo o português, disse, sem fundamentar, que o sistema poderia ser alvo de fraude e não seria auditável, insinuou que era uma empresa a contar os votos e não o TSE e afirmou ainda, sem apresentar quaisquer provas, que um 'hacker' tinha tido acesso "a tudo dentro do TSE".
O ex-presidente brasileiro não marcou presença do plenário do TSE.
Também na quinta-feira, o advogado de defesa Tarcísio Vieira de Carvalho Neto declarou, questionado pela agência Lusa, que em caso de derrota iria recorrer junto do TSE ou ao Supremo Tribunal Federal (STF).
O prazo para recorrer são três dias, mas com encerramento em julho dos tribunais superiores a equipa de Bolsonaro terá até ao início de agosto para preparar o recurso.
Em estudo está ainda o envio de uma providência cautelar para que Bolsonaro possa concorrer às eleições municipais de 2024, caso seja o seu desejo, detalhou o advogado.
Hoje, antes de ter sido tomada a decisão no tribunal, Jair Bolsonaro, em entrevista à Rádio Itatiaia confirmou que vai recorrer ao STF.
"O que eu vou fazer? Vou conversar com os meus advogados, e o recurso vai para o Supremo Tribunal Federal", disse Bolsonaro.
O ex-presidente tem mais de uma dúzia de processos que tramitam no TSE, entre ataques verbais ao sistema eleitoral e uso da máquina pública em benefício próprio, que o podem fazer perder os direitos políticos.
Bolsonaro, que ao ser derrotado nas eleições de outubro perdeu direito à imunidade, tem ainda, pelo menos, cinco investigações no Supremo Tribunal Federal que o podem levar à prisão.
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