No relatório, apresentado no Conselho dos Direitos Humanos da ONU, em Genebra, Volker Türk centrou-se na "recusa sistemática do exército" birmanês em fornecer ajuda humanitária vital aos civis.
Os militares no poder "criaram uma série de obstáculos legais, financeiros e burocráticos para garantir que as pessoas necessitadas não recebam ajuda e não tenham acesso a ela. Esta obstrução à ajuda vital é deliberada e direcionada", afirmou Türk, sublinhando que "vastas camadas da população" foram privadas dos direitos e liberdades fundamentais.
O Alto-Comissário da ONU para os Direitos Humanos recordou que um terço da população da Birmânia necessita de assistência urgente, nomeadamente em termos de alojamento, alimentação, água e emprego, denunciando, paralelamente, os "ataques diretos ao pessoal humanitário".
"As organizações locais, que fornecem a grande maioria da ajuda humanitária, são as que correm mais riscos no exercício das suas funções. Desde o golpe de Estado, cerca de 40 trabalhadores humanitários foram mortos e mais de 200 foram detidos. É necessário um acesso humanitário sem entraves a toda a Birmânia, o que nunca foi tão urgente", afirmou Türk.
Segundo a ONU, 15,2 milhões de pessoas necessitam de ajuda alimentar e nutricional de emergência no país.
Türk condenou também a decisão da junta militar no poder em Myanmar de restringir o acesso das organizações humanitárias às vítimas do ciclone Mocha, que atingiu o país em maio, devastando o Estado de Rakhine.
O Estado de Rakhine alberga centenas de milhares de Rohingya -- uma minoria muçulmana perseguida pelas autoridades birmanesas -- muitos dos quais vivem em campos que albergam pessoas deslocadas por décadas de conflitos interétnicos.
"Suspenderam todas as autorizações de viagem para o Estado de Rakhine, permitindo, só mais tarde, o reinício da distribuição de ajuda mas só se ela não estiver relacionada com o ciclone. No entanto, é importante notar que todas as entregas de ajuda humanitária relacionadas com o ciclone Mocha continuam congeladas, exceto se forem canalizados através das forças armadas", explicou Türk.
Myanmar mergulhou num estado de caos, repetidamente condenado pela ONU e pelas organizações de defesa dos direitos humanos, na sequência do golpe de Estado de fevereiro de 2021 perpetrado contra Aung San Suu Kyi, que pôs fim a um período de 10 anos de democracia.
"Fontes credíveis indicam que, até ontem [quarta-feira], 3.747 pessoas morreram às mãos dos militares desde que tomaram o poder e 23.747 foram detidas", disse Türk.
Leia Também: Grupos de rebeldes de Myanmar tomam base da junta militar em Sagaing