Nos centros de Pequim, Shenzhen ou Cantão, artérias de oito ou mais faixas, que atravessam densas malhas de arranha-céus, enchem-se de automóveis com matrícula verde, a marca que distingue os elétricos dos carros de combustão interna, ilustrando o domínio da China em importantes indústrias do futuro. Nos centros comerciais, as principais marcas de luxo internacionais competem pela atenção da maior classe média do mundo.
Recentemente contratado pelo Beijing Guoan, a principal equipa da capital chinesa, o futebolista luso-angolano Fábio Abreu, confessa-se ainda impressionado com o "muito desenvolvido e organizado" que é o seu país de acolhimento.
"Na primeira mensagem que escrevi à minha mulher, após chegar a Pequim, disse-lhe que tudo o que há na Europa se encontra aqui e, por vezes, ainda mais e melhor", explicou à agência Lusa.
Oficialmente um país em desenvolvimento, a China tem a mesma classificação que, por exemplo, a Albânia ou Timor-Leste: é a "única superpotência híbrida", onde coexistem características de países ricos e pobres, apontam analistas.
Isto, numa altura em que os Estados Unidos tentam retirar ao país o estatuto de economia em desenvolvimento, que garante tratamento preferencial.
"Ao avaliar a China, é importante reconhecer a sua situação única: um país que combina características dos países desenvolvidos e em desenvolvimento, com influência global", escreveu a revista Foreign Policy. "É a única superpotência híbrida do mundo".
Simon Lester, diretor associado do Centro Herbert A Stiefel de Estudos de Política Comercial, do Instituto Cato, em Washington, defendeu que "talvez seja necessário encontrar algum tipo de categoria intermédia" para o país.
"Isto exigiria que a China assuma mais compromissos e não beneficie de todas as regras preferenciais, que foram criadas para os países em desenvolvimento. Talvez possa usufruir de apenas alguns benefícios e só em determinados setores", explicou.
De um país pobre e isolado, a China converteu-se, em 40 anos, na segunda maior economia mundial, projetando hoje a sua influência no exterior, através de iniciativas como o gigantesco projeto de infraestruturas 'Faixa e Rota', a internacionalização da sua moeda ou a mediação de conflitos além-fronteiras.
No ano passado, o país, que opera já a maior marinha do mundo, apresentou o seu terceiro porta-aviões. O objetivo é ser a potência dominante na Ásia Pacífico, retirando primazia aos Estados Unidos.
Mas a China continua a exibir traços de um país em desenvolvimento: o país sofre de poluição generalizada; e no Índice de Desenvolvimento Humano -- que se concentra na qualidade da saúde e educação --, surge em 79º lugar, abaixo do Sri Lanka e Irão.
Com cerca de 1.400 milhões de habitantes, a China é o segundo país mais populoso do mundo, ultrapassado apenas pela Índia. Apesar de ter ascendido a segunda maior economia mundial, o PIB (produto interno bruto) 'per capita' da China é, assim, metade do de Portugal. Enquanto 2% da população portuguesa vive abaixo do limiar da pobreza de 6,20 euros por dia, esta categoria abrange 25% dos chineses.
O Comité de Relações Externas do Senado dos Estados Unidos aprovou, no mês passado, um projecto de lei bipartidário que visa retirar à China o estatuto de "país em desenvolvimento". A decisão surge após legislação semelhante ter sido aprovada pela Câmara dos Representantes.
Um porta-voz do Governo chinês reagiu assim: "Os EUA não querem classificar a China como 'país desenvolvido' por apreciação ou reconhecimento pelos sucessos de desenvolvimento da China. O verdadeiro motivo é impedir o desenvolvimento da China".
Em causa estão benefícios em tratados internacionais em vigor, que visam apoiar os países mais pobres.
As nações em desenvolvimento estão, por exemplo, sujeitas a menos restrições na luta contra as alterações climáticas, enquanto as suas exportações para os países ricos beneficiam de taxas aduaneiras baixas.
Ao abrigo do estatuto de país em desenvolvimento, a China continua, também, a obter empréstimos com taxas preferenciais de organizações internacionais, como o Banco Mundial.
"Em suma, a China caminha, fala e age como um país desenvolvido, mas continua a beneficiar de provisões e tratamento diferenciado que visam ajudar os países pobres", descreveu Brett D. Schaefer, pesquisador no grupo de reflexão conservador Margaret Thatcher Center.
"Tudo se resume a isto: a segunda maior economia do mundo está a beneficiar de condições especiais em acordos e organizações internacionais, destinadas a ajudar as nações pobres", acrescentou. "Isto não é equitativo. É, francamente, injusto".
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