Horas após o anúncio da dissolução das instituições do país por um grupo de militares no canal de televisão Gabon 24, instalado na própria presidência, o destino do chefe de Estado de 64 anos é ainda desconhecido.
Ali Bongo tinha acabado de ser anunciado como vencedor das eleições presidenciais gabonesas do passado sábado, dia 26, e dado como reeleito para um terceiro mandato pela comissão nacional de eleições do país com 64,27% dos votos, mas os golpistas afirmaram que os resultados tinham sido "truncados".
Em 14 anos no poder, o Presidente, eleito em 2009 após a morte do seu pai - o inamovível Omar Bongo -- revelou-se nos últimos anos um caçador de "traidores" e "aproveitadores" no topo do Estado, revertendo paulatinamente a perceção instalada entre a população de que os dias da dinastia Bongo tinham chegado ao fim com o derrame cerebral que o vitimou em 2018.
A convalescença e reabilitação intensa de Ali Bongo prolongaram-se na altura durante 10 meses, período em que esteve desaparecido no estrangeiro, e o seu reaparecimento foi visto como um milagre, ainda que a ausência tenha feito vacilar o seu poder.
Desde então, os seus opositores têm questionado regularmente a sua capacidade intelectual e física para liderar o país, havendo mesmo quem afirme que um sósia o está a substituir.
Não obstante, se uma rigidez na perna e no braço direitos o impede de se deslocar facilmente, a sua cabeça continua intacta, segundo os visitantes habituais, diplomatas e outros.
Durante o primeiro mandato, Ali Bongo foi a antítese do seu pai: sem o carisma e a desenvoltura do "patriarca" - que reinou sem contestação durante 41 anos o pequeno Estado petrolífero muito rico da África Central -, teve dificuldade em afirmar a sua autoridade, nomeadamente perante os membros inquietos do todo-poderoso Partido Democrático Gabonês (PDG).
A sua reeleição em 2016, já muito contestada pela oposição e oficialmente ganha por apenas 5.500 votos, foi para Ali Bongo um primeiro abanão, seguido de um segundo - o AVC -, que precipitou a sua transformação.
A sua convalescença foi pontuada por um golpe de Estado falhado, com contornos difusos, em 7 de janeiro de 2019, e por uma tentativa do seu então omnipotente chefe de gabinete, Brice Laccruche Alihanga, de o demitir.
Laccruche está preso há mais de três anos, juntamente com vários ministros e altos funcionários, alvo de uma operação "anti-corrupção" implacável.
Num Gabão tomado pela corrupção endémica desde as décadas em que Omar Bongo foi o seu pilar mais emblemático, Ali Bongo tem-se apresentado nos últimos anos a ministros e conselheiros como o "pai do rigor", sujeitando-os a auditorias e demitindo-os à menor suspeita.
Para a oposição, porém, o fosso entre ricos e pobres é cada vez maior num dos países mais ricos de África em termos do PIB per capita e onde a ausência de políticas capazes de diversificar uma economia demasiado dependente do petróleo empurra uma em cada três pessoas para baixo do limiar da pobreza.
Herdeiro de parte da imensa fortuna do pai, o "Sr. Filho" ou "Bebé Zeus", como era então conhecido, foi durante o primeiro mandato retratado pela oposição como um governante distante do seu povo, retirado em propriedades luxuosas no Gabão e no estrangeiro ou ao volante de numerosos carros de luxo, entregando a política e os assuntos do país à gestão de conselheiros e ministros, que os confundiam com os seus próprios interesses.
Nos últimos anos porém, para além de se assumir como "pai do rigor", Bongo transformou-se também num estratega político, tal como o pai, somando vitórias no seu campo assim como no de uma oposição desunida, a quem retirou pastas ministeriais e títulos de relevo.
Hoje, os seus apoiantes veem-no como uma fénix renascida das cinzas, depois de dolorosas sessões de reeducação. Já os seus críticos, acusam-no de ser movido pelos interesses de um séquito próximo, que não quer largar o poder e os ganhos obtidos em 55 anos de "dinastia Bongo".
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