"Acredito que seja essa quebra de confiança em relação ao perfil dos partidos tradicionais", por "não realizarem aquilo que prometem", disse Jaibo Mucufu, sociólogo e pesquisador na Universidade Lúrio, província de Nampula, norte de Moçambique à Lusa.
Mucufo enfatizou que um significativo segmento da população moçambicana considera que as formações partidárias mais influentes na vida política do país "não cumprem as suas promessas".
Um dos sinais de que há um distanciamento em relação aos partidos políticos está no surgimento da candidatura da Associação dos Amigos de Amurane para Moçambique Melhor (KÓXUKHURO) na cidade de Nampula, um dos oito grupos de cidadãos que concorrem em todo o país às próximas eleições autárquicas, um aumento face aos cinco nas eleições de 2018.
Amurane é o apelido de Mahamudo, autarca da cidade de Nampula, assassinado em 2017, numa altura em que estava em litígio aberto com o seu partido, Movimento Democrático de Moçambique (MDM), apesar de a terceira maior força política do país nunca ter sido indiciada ou envolvida pelo homicídio.
"Mahamudo Amurane era a inspiração da comunidade de Nampula" e o grupo de cidadãos que ostenta o seu nome na concorrência às autárquicas decidiu "apresentar um plano que não é necessariamente de um movimento partidário específico", enfatizou Jaibo Mucufo.
Aquele sociólogo também defendeu que o envolvimento de forças não partidárias nas eleições autárquicas traduz o aumento da consciência cívica em relação ao processo de descentralização e advocacia de interesses particulares.
"Deve ser por isso que, entre as organizações cívicas participantes, está uma que congrega vendedores informais", como são conhecidos nas cidades moçambicanas os comerciantes de rua não licenciados por entidades estatais, frisou.
Notou que os cidadãos que concorrem às eleições sem filiação partidária têm uma ação deficiente, porque apenas surgem em anos eleitorais e não têm contacto permanente com o eleitorado.
Lázaro Mabunda, docente universitário e investigador de Ciência Política, também aponta o desencanto de uma franja da sociedade civil em relação aos partidos políticos como causa da criação de associações que vão participar nas eleições autárquicas.
"Muitas vezes, os partidos políticos são muito criticados por nada estarem a fazer" em prol das populações, disse Mabunda.
Através da sua intervenção nos órgãos autárquicos, os grupos de cidadãos "têm outras formas de fazer política, porque eles não são partidos políticos, são um grupo de cidadãos que se organizam para defender os seus interesses dentro do território municipal", salientou.
Lázaro Mabunda considerou "uma mais-valia" as alternativas que podem ser oferecidas por entidades diferentes de partidos clássicos, porque produzem novas expressões de satisfação das necessidades das comunidades autárquicas.
Apontou o exemplo da participação de um grupo de vendedores informais nas autarquias como consciência do direito de defesa de interesses legítimos.
"Eles estão lá [no processo eleitoral autárquico] querendo chegar aos seus interesses como vendedores informais", frisou Lázaro Mabunda, embora alertando para o fracasso das candidaturas que imitam a campanha eleitoral dos maiores partidos.
"Se concentrarem a sua campanha nas redes sociais, onde está a maioria dos jovens, as associações que concorrem às autárquicas podem ter algum êxito, mas se apostarem em campanhas de rua, comícios e tentativas de ofertas de brindes, estão condenados ao fracasso", sublinhou Lázaro Mabunda.
Mais de 11.500 candidatos de 11 partidos políticos, três coligações de partidos e oito grupos de cidadãos iniciaram na terça-feira a campanha eleitoral para as autárquicas moçambicanas de 11 de outubro, por entre apelos a um processo pacífico.
Mais de 8,7 milhões de eleitores moçambicanos estão inscritos para votar nas sextas eleições autárquicas, segundo dados anteriores da CNE.
Os eleitores moçambicanos vão escolher 65 novos autarcas em 11 de outubro, incluindo em 12 novas autarquias, que se juntam a 53 já existentes.
Leia Também: Vaticano analisa canonização dos "mártires de Chapotera" em Moçambique