"O meu pedido de demissão resulta de uma profunda reflexão e medida ponderação, em perfeita consciência de que, com esta ação contribuo para resolução de parte significante de um problema conjuntural. A minha decisão é imediata e irreversível", sublinha Adelino Cardoso no comunicado de imprensa enviado à Lusa.
O ministro demissionário, refere que os últimos acontecimentos tornados públicos, "sobretudo decorrentes das intervenções nas empresas públicas" tuteladas pelo Ministério das Infraestruturas "retiram o conforto necessário à continuação do trabalho" que pretendia desenvolver.
Adelino Cardoso refere que sempre agiu "com lealdade e de acordo com os objetivos definidos no programa do Governo e aceites" por este e assume as responsabilidades que resultaram das ações que praticou.
"Entendo que cargos públicos, sobretudo políticos, não são de natureza permanente, muito menos profissionalizantes. Entendo também que o exercício de um cargo político só faz sentido se se revestir de consenso e de aceitação tanto perante quem dirigimos como a quem devemos prestar contas", refere Adelino Cardoso, no comunicado hoje divulgado.
Em causa está um "acordo de parceria público-privada", de gestão operacional dos serviços da Empresa Nacional de Administração dos Portos (Enaport) de São Tomé, datado de 20 de dezembro, celebrado entre o Governo, representado pelo ministro agora demissionário, o diretor da Enaport, Hamilton de Sousa, e o representante da empresa África Global Logistics (AGL) Pierre-François Pioriou.
Segundo o contrato, contestado pelos funcionários da Enaport, a AGL, uma sociedade anónima simplificada registada em França, "entra neste acordo apenas como acionista da empresa operadora", que será "incorporada sob as leis de São Tomé e Príncipe, cuja sede social será em São Tomé".
O acordo é assinado "por um período de cinco anos", renovável por igual período ou outro, e prevê que durante a sua vigência "o operador terá o direito exclusivo de prestar os serviços no terminal", que inclui "o cais, o terreiro e o equipamento para efeito de prestação de serviço no porto" deste país insular.
"Para a execução dos serviços, o operador beneficiará da mão-de-obra existente no Porto", que "permanecerá diretamente empregado" pela Enaport e apenas a equipa de gestão de peritos fornecida pela AGL será empregada ou contratada pela empresa francesa.
Pelo "direito de gerir e operar o terminal", a AGL pagará à Enaport "'royalties' mensais de 50% do volume de negócios gerado", sendo os pagamentos feitos em moeda nacional são-tomense, a dobra.
O texto do acordo a que a Lusa teve acesso refere que o Presidente da República, Carlos Vila Nova, o primeiro-ministro, Patrice Trovoada, e a Enaport "reconhecem a necessidade de modernizar e gerir o porto e identificaram o operador, a empresa francesa AGL, como o melhor candidato para realizar o projeto".
Numa nota publicada no Facebook na sexta-feira, a Presidência da República negou o envolvimento de Carlos Vila Nova no acordo, sublinhando tratar-se "de uma matéria da exclusiva competência do Governo, o Presidente da República não teve e não tem qualquer tipo de intervenção no caso".
Na nota, a Presidência da República acrescenta que "solicitou ao Governo o envio de uma cópia do referido contrato ao gabinete do chefe de Estado".
No sábado, o chefe de Estado são-tomense disse que marcou encontro com o primeiro-ministro para quarta-feira "para que se esclareça de facto qual é a intenção, qual foi o objetivo de citar o nome do Presidente da República neste contrato".
Em comunicado do Conselho de Ministros divulgado na sexta-feira, o Governo referiu que, após ouvir o ministro Adelino Cardoso sobre "a proposta do contrato e o clima gerado a volta do mesmo, decidiu continuar a aprofundar o documento de modo a refletir de maneira mais abrangente e clara os interesses e requisitos do Estado são-tomense, antes de prosseguir para avaliação e possível visto do Tribunal de Contas".
Além da polémica na Enaport, na quinta-feira os trabalhadores do aeroporto de São Tomé deram sete dias ao Governo para esclarecer a alegada "iminente privatização da empresa", sob pena de entrarem em greve e rejeitar o processo, segundo documento a que a Lusa teve acesso.
Em declarações à Lusa, no sábado, o presidente do Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe-Partido Social Democrata (MLSTP-PSD), Jorge Bom Jesus, criticou a "forma de gestão opaca" do Governo são-tomense e "falta de transparência na gestão da coisa pública".
O maior partido da oposição são-tomense denunciou a alegada falta de transparência no negócio entre o Governo e uma empresa turca que instalou cinco novos geradores numa central da capital para produzir 10 megawatts de eletricidades.
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