Eventual regresso Republicano à Casa Branca preocupa imigrantes no Iowa

Kpator, um imigrante da Libéria a viver no Iowa, riu estridentemente ao ser questionado pela Lusa sobre um possível regresso de Donald Trump à Casa Branca, mas rapidamente o semblante mudou, admitindo "preocupação" caso esse cenário se concretize.

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© Jabin Botsford/The Washington Post via Getty Images

Lusa
15/01/2024 21:08 ‧ 15/01/2024 por Lusa

Mundo

EUA/Eleições

O denso manto de neve que se abateu sobre o estado norte-americano do Iowa ameaça afetar a deslocação dos eleitores Republicanos às urnas na noite de hoje, quando arrancam as primárias do Partido Republicano para a escolha do candidato que irá disputar a corrida à Casa Branca (Presidência) em novembro deste ano.

As ruas e estradas estão desertas mas, ao contrário da restante população local, Kpator mantém-se ao serviço, como motorista da plataforma Uber, disposto a levar os eleitores às assembleias de voto, e nem as fortes derrapagens que o seu carro sofreu no gelo o fazem parar.

Contou à Lusa que chegou aos Estados Unidos da América (EUA) há cerca de duas décadas, juntamente com os seus pais, fugido da guerra, mas nada o preparou para o tratamento que viria a receber em solo norte-americano.

A primeira paragem foi em Filadélfia, no estado da Pensilvânia, onde sentiu na pele os terrores do racismo.

"Não entendia como é que um país com tanta gente negra podia ser tão racista. Na escola, não havia um dia em que não me chamassem 'macaco africano'", contou, não escondendo a mágoa e o trauma que esses episódios lhe causaram.

"Que diferença faz a cor da pele? Que diferença faz o lugar onde nascemos?", questionou, acrescentando: "Fugimos da guerra, só queríamos uma vida melhor, como qualquer pessoa".

Agora, anos mais tarde e já no rural Iowa, onde a "vida é mais simples e tranquila", e onde se "não te meteres com ninguém, ninguém se mete contigo", Kpator confidenciou à Lusa que, juntamente com a sua família, teme que o sentimento anti-imigração ressurja com um possível regresso do Partido Republicano à Casa Branca, com vários candidatos extremistas a manterem uma forte retórica contra a imigração.

"Donald Trump faz-me rir. É um homem que fala, fala, mas pouco faz. As pessoas gostam dele, acham que é carismático, mas é igual a todos os outros: só se preocupa consigo mesmo. Não quer saber das pessoas", criticou.

"Não entendo o porquê de toda esta conversa contra os imigrantes. Ainda não perceberam que a imigração é que põe este país a mexer e a economia a circular? Muita gente não sabe, mas nós pagamos impostos", frisou.

Num discurso em New Hampshire, no mês passado, Trump causou polémica ao afirmar que os imigrantes que chegam aos Estados Unidos estão a "envenenar o sangue" do país.

A imprensa norte-americana e os Democratas foram rápidos a observar que o termo "envenenamento do sangue" foi usado pelo líder nazi Adolf Hitler no seu manifesto "Mein Kampf", no qual criticava a imigração e a mistura de raças.

Apesar das críticas, uma nova sondagem YouGov, publicada no domingo pela rede CBS, mostra que um número bastante expressivo de eleitores Republicanos (80%) concorda com a retórica do ex-Presidente sobre os imigrantes estarem a "envenenar o sangue" da América.

Caso regresse à Presidência norte-americana, o magnata promete terminar o muro na fronteira entre os EUA e o México, assim como assinar uma ordem executiva para acabar com a cidadania de nascença para "estrangeiros ilegais" no primeiro dia do seu novo mandato, situação que certamente enfrentaria obstáculos legais significativos, uma vez que a cidadania de nascença está consagrada na 14.ª Emenda.

O governador da Florida, Ron DeSantis, tem assumido algumas das posições mais extremistas sobre a imigração entre todos os potenciais candidatos presidenciais, incluindo o apoio ao uso de força letal contra migrantes que atravessam a fronteira e que são suspeitos de tráfico de drogas ilegais.

Já a ex-governadora da Carolina do Sul e filha de imigrantes da Índia, Nikki Haley, vista como a candidata mais moderada entre os seus oponentes do partido, tem também criticado a imigração ilegal e posicionou-se contra a cidadania norte-americana por direito de nascença.

O receio sentido por Kpator exemplifica um fenómeno maior, com várias pessoas em situação semelhante a temerem uma campanha contra os migrantes, assim como o aumento das hostilidades.

Desde o início de dezembro, os três principais candidatos Republicanos e os grupos que os apoiam gastaram quase cinco milhões de dólares (cerca de 4,57 milhões de euros) em anúncios no Iowa, criticando o que classificam de políticas de imigração muito brandas, segundo noticiou o jornal The Washington Post.

Os vídeos em causa apresentam imagens de pessoas aglomeradas na fronteira sul dos Estados Unidos, enquanto os narradores alertam para cenários dantescos, com criminosos sedentos de sangue, traficantes de fentanil (um forte opiáceo) e, conforme indica um vídeo de Trump, "a possibilidade de um ataque do Hamas [grupo islamita palestiniano]", ainda de acordo com o mesmo jornal.

Em relação à eleição da noite de hoje no Iowa, Trump lidera as sondagens com 48% das intenções de voto dos eleitores Republicanos.

Segue-se Nikki Haley que, com 20% das intenções de voto, conseguiu ultrapassar Ron DeSantis, que acumula agora 16% das preferências dos Republicanos, de acordo com um novo estudo divulgado na noite de sábado pelo Des Moines Register/NBC News.

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