"Como na Venezuela não temos democracia, mas uma encenação de democracia, não temos garantias de participação. (...) Em qualquer país do mundo, as organizações políticas são livres de apresentar os seus candidatos, mas, no caso venezuelano, as organizações políticas viram confiscados os seus cartões de votação (símbolos) para poderem participar, ou seja, a sua representação perante o Conselho Nacional Eleitoral", disse.
A Secretária-geral do partido Causa R (Radical, centro-esquerda) e porta-voz da direção de campanha da líder opositora Maria Corina Machado, explicou que "há muitos dirigentes que foram ilegalmente impedidos de exercer cargos públicos".
"Falamos de desqualificações ilegais, porque a Constituição venezuelana e as leis estabelecem claramente as condições para que alguém não possa exercer os seus direitos políticos. Entre elas, ter sido julgado por um tribunal, e que haja uma sentença judicial confirmando que foi cometido um crime que impede exercer um cargo público", disse.
No entanto, "no caso emblemático" da vencedora das primárias da oposição, "Maria Corina Machado nunca foi notificada de qualquer julgamento, não foi acusada e não pôde ser julgada com um processo justo", disse.
Dirigente do Movimento Progressista da Venezuela e antiga vereadora do município Libertador (o maior de Caracas), Andrea Tavares sublinhou que as interdições de candidatura surgem "quando alguém exerce um cargo público e se comprova que cometeu um crime de corrupção, de desvio de fundos, mas não é o caso de Maria Corina, porque não ocupou nenhum cargo no Executivo Nacional, nem no regional ou municipal".
"Estas são violações das garantias democráticas, dos direitos políticos e por isso os venezuelanos revoltaram-se, saíram às ruas a protestar, a exigir os seus direitos, mas foram brutalmente reprimidos e hoje temos uma longa lista de cidadãos assassinados pelos órgãos repressivos do Estado e de presos políticos", disse.
A lusodescendente acrescentou que em 2019 a oposição assumiu a possibilidade de alcançar uma mudança política, com o governo interino de Juan Guaidó, mas não conseguiu alcançar uma solução.
"Hoje as organizações democráticas concordam em, com o apoio da comunidade internacional, propor eleições livres e transparentes, em conseguir uma solução eleitoral e pacífica para esta profunda crise", disse.
Mas, disse, "a rota eleitoral não é apenas participar em eleições que violam a legislação em vigor e sem garantias de direitos políticos (...) é a luta por eleições livres, transparentes, que reponham os direitos políticos violados, com observação internacional" e que os partidos possam participar.
"Estamos organizados para o desafio, caso o regime viole a rota eleitoral, porque 90% dos venezuelanos querem uma mudança (...) porque o povo está disposto a avançar por esta via", frisou.
Sobre Maria Corina Machado, referiu que "seria um enorme motivo de orgulho ter uma mulher na liderança política do país".
"Maria Corina é uma líder consolidada. É uma mulher com uma trajetória impecável na sua luta política, com um enorme sentido de ética na política, mas também com um conhecimento profundo das questões do Estado e que trabalha há muitos anos num projeto político para transformar a Venezuela", disse.
Segundo Andrea Tavares, Maria Corina representa "a esperança de recuperar a Venezuela" e "do reencontro nas famílias separadas pela emigração".
"Sou filha de portugueses, a minha mãe e a minha filha estão em Portugal, e vi quantos luso-venezuelanos tiveram de abandonar a Venezuela, onde tinham as suas empresas, as suas vidas, filhos e netos", disse.
Tavares lamentou que "de oportunidades, de progresso", a Venezuela passou a ser "um país afundado na miséria, na pobreza, na desigualdade".
Segundo a luso-descendente, as primárias da oposição, em 2023, deixaram "grandes lições" à Venezuela, entre elas "que os venezuelanos estão dispostos à retomar a rota eleitoral e que elegeram uma candidata que não estava relacionada com lutas anteriores".
Andrea Tavares referiu que há países onde a democracia é algo normal, "mas para quem vive num regime autoritário totalitário a esperança de recuperar a liberdade da democracia não tem nome nem preço".
*** Felipe Gouveia (texto) e Lennys Gavidia (vídeo), da agência Lusa ***
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