"As regressões dos direitos humanos em 2023 não passaram despercebidas. Pelo contrário. Pessoas em todo o mundo resistiram à regressão, demonstrando uma solidariedade global sem precedentes", sublinhou a responsável da organização internacional de defesa dos direitos humanos.
O relatório anual da organização não-governamental (ONG) sobre o Estado dos Direitos Humanos no Mundo, hoje publicado, sublinha a mobilização "sem precedentes" de governos e pessoas pela defesa dos direitos humanos.
"Quando muitos governos não cumpriram o direito internacional, vimos outros a apelarem às instituições internacionais para implementarem o Estado de Direito. E onde os líderes de todo o mundo não conseguiram defender os direitos humanos, vimos pessoas galvanizadas a marchar, protestar e pedir um futuro mais esperançoso", afirmou Agnès Callamard, mencionando alguns exemplos verificados à escala mundial durante o ano passado.
"O conflito Israel-Hamas provocou centenas de protestos em todo o mundo" com "as pessoas a exigiram um cessar-fogo para acabar com o sofrimento dos palestinianos em Gaza, bem como a libertação de todos os reféns feitos pelo Hamas e outros grupos armados, muito antes de muitos governos o fazerem", referiu a Amnistia Internacional no relatório.
"O secretário-geral da ONU, os chefes das agências da ONU e as organizações humanitárias tomaram medidas sem precedentes para denunciar os crimes de guerra cometidos no sul de Israel e em Gaza e para apelar a Israel para que respeite o direito internacional", enalteceu a secretária-geral da organização, citada no documento.
A mobilização foi observada também em muitos outros locais, como nas ruas dos Estados Unidos, de El Salvador e da Polónia "para exigir o direito ao aborto, à medida que a reação contra a justiça de género se consolidava".
Por outro lado, relatou ainda a Amnistia Internacional, "milhares de pessoas aderiram ao movimento 'Fridays For Future', liderado por jovens, para apelar à eliminação justa e rápida dos combustíveis fósseis" e, em Taiwan, o movimento #MeToo conseguiu levar o Governo a aprovar uma alteração à Lei de Prevenção do Crime de Agressão Sexual.
No Afeganistão, o ativista Matiullah Wesa foi libertado em outubro, após meses de campanhas e de ter passado quase sete meses na prisão por promover o direito das meninas à educação, e na Turquia, quatro defensores dos direitos humanos acusados de terrorismo foram absolvidos depois de muitas manifestações.
"O direito de protestar é fundamental para esclarecer os abusos e as responsabilidades dos líderes. As pessoas deixaram bem claro que querem direitos humanos", sublinhou Agnès Callamard.
"Dada a sombria situação global, são necessárias medidas urgentes para revitalizar e renovar as instituições internacionais destinadas a salvaguardar a humanidade", defendeu a responsável da Amnistia Internacional, apontando a necessidade de reformar o Conselho de Segurança da ONU, para que os membros permanentes não possam exercer o seu poder de veto sem controlo.
No ano passado, "muitas pessoas resistiram e perturbaram as forças que empurravam o mundo para trás", disse a representante, considerando que esses protestos "também moldaram o ano 2023, contra todas as probabilidades".
"Espero que em 2048 -- ou mesmo em 3048 --, quando diplomatas e ativistas olharem para o ano passado [2023], descubram que houve muitas, muitas pessoas boas em todo o mundo que fizeram tudo o que podiam, levantando-se e falando", concluiu Agnès Callamard.
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