Na véspera da Cimeira da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO), de 09 a 11 de julho na capital norte-americana e em que se assinalarão os 75 anos da aliança, Clara Broekaert, analista de investigação do Soufan Center, um centro de análise e diálogo estratégico sobre desafios de segurança global, disse à Lusa que os líderes tentarão criar mecanismos para garantir algum apoio à Ucrânia no "pior cenário em termos de resultados eleitorais" em alguns dos Estados-membros.
"As discussões em torno da Ucrânia centrar-se-ão na forma de sustentar a sua sobrevivência quando líderes isolacionistas ascenderem ao topo em ambos os lados do Atlântico", defendeu.
"Os membros da NATO não são ingénuos e sabem que o futuro do apoio à Ucrânia, com os ganhos eleitorais por parte dos céticos da NATO na Europa e potencialmente nos Estados Unidos em novembro, é confuso", assinalou Broekaert.
Nesse sentido, o apoio da NATO à Ucrânia será "à prova de Donald Trump" - o magnata republicano que tenta regressar à Casa Branca - e incluirá a nova base da NATO na Alemanha dedicada ao apoio à Ucrânia e o estabelecimento de uma posição civil da NATO que ficará permanentemente estacionada em Kiev, explicou a analista.
Além disso, Clara Broekaert considera provável que a NATO assuma um papel mais proeminente na coordenação da ajuda militar e de treino para a Ucrânia, uma tarefa atualmente gerida pelo Grupo de Contacto de Defesa da Ucrânia, liderado pelos Estados Unidos.
"Muito importante é que será provavelmente apresentado um projeto mais concreto para garantir que o financiamento à Ucrânia seja mais sustentável e não refém dos caprichos políticos internos dos membros da NATO. Este mecanismo de financiamento deverá fornecer 40 mil milhões de dólares (37 mil milhões de euros) em assistência anual", afirmou.
No entanto, apesar de a Ucrânia ser assumidamente um dos focos da Cimeira, um convite formal para Kiev aderir à Aliança não será emitido na Cimeira, com o conflito com a Rússia e a falta de consenso entre os membros da NATO a travarem esse avanço, segundo vários analistas ouvidos pela Lusa.
Para Joshua Shifrinson, professor de política internacional da Universidade de Maryland e especialista em segurança internacional contemporânea, "não parece haver interesse real por parte dos EUA -- o aliado que, em última análise, conta nos círculos da NATO -- em incluir formalmente a Ucrânia na Aliança".
Recentemente, o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, indicou que durante a Cimeira em Washington serão tomadas "medidas concretas" para aproximar Kiev da Aliança Atlântica e "garantir que haja uma ponte para a adesão, uma ponte que seja forte e bem iluminada".
Na visão de Shifrinson, essas "medidas concretas" envolverão alguma combinação de assistência militar/defesa adicional e assistência económica a Kiev, destinada a ajudá-la a cumprir os critérios de adesão à NATO a longo prazo, e "talvez promessas sobre como a Aliança poderá apoiar a Ucrânia caso seja atacada no futuro depois de a guerra atual terminar".
À Lusa, o especialista avaliou que, "em muitos aspetos, a Ucrânia já saiu vitoriosa desta guerra -- em comparação com o ponto onde estava em fevereiro de 2022", uma vez que manteve a sua independência, reforçou os laços com os aliados e "frustrou efetivamente a Rússia no campo de batalha".
"Contudo, se uma Ucrânia vitoriosa significa ajudar Kiev a recuperar todo o seu território, então não tenho a certeza do que pode ser feito nesta fase, a não ser que a NATO entre realmente em guerra com a Rússia", observou.
"Infelizmente, não restam muitas armas ou novas formas de assistência que a NATO possa oferecer que possam ajudar a Ucrânia a compensar as suas desvantagens numéricas e o facto de a Rússia poder simplesmente jogar à defesa neste momento", acrescentou Joshua Shifrinson.
Num olhar mais alargado sobre o que esperar desta Cimeira em Washington, os analistas são unânimes em considerar que surge num momento extremamente desafiador para a Aliança, com obstáculos em várias frentes, desde ameaças externas que proliferaram, até dinâmicas eleitorais internas, que poderão ter impacto no potencial de construção de consenso e de projeção de uma frente unida para o mundo exterior.
"Neste momento, o maior desafio da Aliança é a sua expansão. Com 32 membros espalhados pela maior parte da Europa, os aliados têm diferentes perceções de ameaça. Isto torna difícil para a Aliança chegar a um conjunto comum de prioridades estratégicas ou, mesmo quando há acordo sobre um desafio comum - como a Rússia -, investir tempo e dinheiro de forma credível e previsível na resposta a estas questões", disse Shifrinson.
Para Clara Broekaert, os maiores desafios passam pelo regresso da competição entre grandes potências, os níveis crescentes de ameaças híbridas - como ataques cibernéticos e sabotagem de infraestruturas críticas -, a necessidade de uma estratégia e perspetiva comuns sobre as ameaças representadas pela China ou a necessidade de mais parcerias estratégicas em regiões-chave.
Por último, disse a analista de investigação do Soufan Center, o financiamento da Aliança continua extremamente problemático, com muitos dos seus Estados-membros a lutarem para conseguirem cumprir de forma consistente a meta de gastar 2% do seu Produto Interno Bruno (PIB) na Defesa.
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