Para Grant Reeher, diretor do Campbell Public Affairs Institute e professor de Ciência Política na Universidade de Syracuse, em Nova Iorque, o Partido Democrata ainda não conseguiu ultrapassar o problema de comunicação que contribuiu para a sua derrota nas presidenciais de novembro, estando neste momento "cauteloso em repetir agora uma estratégia semelhante", num momento em que Donald Trump tem dominado as primeiras páginas dos jornais e os noticiários televisivos, dentro e fora do país.
"Os democratas ainda não têm uma mensagem positiva para apresentar como alternativa e levará algum tempo a formulá-la. (...) Além disso, não controlam as maiorias no Congresso, o que é particularmente importante na Câmara dos Representantes [câmara baixa]", frisou o académico, referindo-se à maioria detida pelo Partido Republicano no Congresso.
"De um modo mais geral, estamos a ver uma reação retórica dos democratas, mas há pouco que possam fazer legislativamente (...) uma vez que não têm a maioria em qualquer uma das câmaras do Congresso", acrescentou o especialista, em declarações à agência Lusa.
Na prática, os democratas têm-se manifestado contra as ordens executivas de Trump, que violam normas e ultrapassam limites, mas esse movimento não tem sido suficiente para se sobreporem ao ritmo diário impressionante que Donald Trump impôs nestes primeiros 30 dias na Presidência dos Estados Unidos da América (EUA).
Além disso, as ruas têm estado bastante calmas em comparação com os primeiros dias do primeiro mandato presidencial de Trump (2017-2021).
Contudo, de acordo com a imprensa norte-americana, os gabinetes dos democratas no Congresso têm recebido um "volume anormalmente elevado" de chamadas de eleitores que querem expressar as suas opiniões sobre as escolhas de Donald Trump para os seus gabinetes, ordens executivas e medidas para desmantelar vários programas federais.
Alguns legisladores democratas queixaram-se que os seus eleitores não compreendem o poder limitado que o seu partido tem neste momento.
Bruno Cardoso Reis, historiador e professor visitante na Universidade de Georgetown, em Washington DC, acredita que os democratas estão "muito divididos e muito confusos", admitindo, porém, que a multiplicidade de medidas anunciadas por Trump ao longo do último mês tem dificultado a tarefa de apresentarem uma resposta eficaz.
"No fundo, são tantas medidas, são tantas coisas que é tentador dar resposta a tudo e, portanto, isso leva a uma mensagem muito dispersa e, no fundo, estar sempre atrás do prejuízo", observou.
"Portanto, acho que esse é o problema de base. Agora, isso seria possível ultrapassar se os democratas insistissem numa mensagem simples e coerente com coisas como, por exemplo, Donald Trump aparentemente não estar a dar prioridade àquilo que era prioritário para os americanos, que é a economia e a questão do custo de vida, a questão da inflação", indicou Cardoso Reis.
Além disso, o docente considera haver uma grande fragmentação dentro do próprio Partido Democrata, nomeadamente entre a "ala mais à esquerda e a ala mais centrista", problema que se tem intensificado com a ausência de um "líder natural e carismático".
"Aliás, esse tem sido o problema do Partido Democrata: não tem tido líderes mobilizadores nas últimas eleições. (...) Quer ao nível do Congresso, ao nível dos governadores, não há uma figura que esteja claramente a surgir como um líder evidente do Partido Democrático", sublinhou Bruno Cardoso Reis.
O analista, que foi subdiretor do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL, reforça ainda que se não emergirem candidatos carismáticos entre os democratas, nem uma agenda clara e mobilizadora, será difícil para o partido recuperar a tempo das próximas eleições intercalares, agendadas para novembro de 2026.
"Até porque realmente Donald Trump está a transmitir a imagem de alguma eficácia", frisou.
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